Descrição de chapéu The New York Times

Montadoras usaram macacos em teste de poluição com Fusca adulterado

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Crédito: David Hecker - 3.mar.2012/Associated Press Um elevador traz um Fusca em um prédio da empresa Volkswagen, em Worlfsburg, na Alemanha. *** FILE - In this March 3, 2012 photo, a lift brings a Volkswagen Beetle from a tower at the Autostadt in Wolfsburg, Germany. A steadily improving economy and strong December sales lifted the American auto industry to its best performance in five years in 2012, especially for Volkswagen and Japanese-brand vehicles, and experts say the next year should be even better. (AP Photo/dapd, David Hecker, File)
Um elevador traz um Fusca em um prédio da Volkswagen, em Worlfsburg, na Alemanha

DO "NEW YORK TIMES"

Em 2014, à medida que surgiam mais e mais provas quanto ao efeito nocivo dos gases de escapamento dos motores diesel sobre a saúde humana, cientistas em um laboratório de Albuquerque, Novo México, conduziram uma experiência incomum. Dez macacos ficaram confinados em câmaras à prova de ar, assistindo desenhos animados como diversão enquanto inalavam gases de escapamento de um Fusca.

Montadoras de automóveis alemãs haviam bancado a experiência, em um esforço para provar que os veículos diesel com a tecnologia mais recente eram muito menos poluentes que os enfumaçados modelos do passado.

Mas os cientistas norte-americanos que estavam conduzindo o teste não estavam cientes de um fato crucial: o Fusca fornecido pela Volkswagen havia sido alterado a fim de produzir níveis de poluição muito menos severos, em condições de laboratório, do que seria o caso na estrada.

Os resultados estavam sendo deliberadamente manipulados.

A pesquisa com macacos em Albuquerque, que não havia sido noticiada até agora, é uma nova dimensão no escândalo global de emissão de poluentes que já forçou a Volkswagen a se admitir culpada de fraude e conspiração, em um processo federal nos Estados Unidos, e a pagar mais de US$ 26 bilhões em multas.

A montadora admitiu ter instalado em seus veículos um software que permitia que eles trapaceassem em testes de emissões de poluentes. Mas processos judiciais e registros governamentais demonstram que a Volkswagen e outras montadoras de automóveis europeias também estavam envolvidas em um esforço longo e bem financiado para produzir pesquisas acadêmicas que, esperavam, influenciassem o debate político e preservassem os benefícios tributários conferidos ao combustível diesel.

CONTROVÉRSIAS

Os detalhes da experiência de Albuquerque foram revelados em um processo aberto contra a Volkswagen nos Estados Unidos. A organização que solicitou o estudo, o Grupo Europeu de Pesquisa sobre Meio Ambiente e Saúde no Setor de Transportes, recebia todas as suas verbas da Volkswagen, Daimler e BMW. A organização fechou as portas no ano passado devido a controvérsias quanto ao seu trabalho.

A organização, conhecida pelas suas iniciais em alemão, EUGT, não realizava pesquisas diretamente. Em lugar disso, contratava cientistas para conduzir estudos que pudessem ser usados em defesa do diesel. A organização bancou pesquisas que contestaram uma decisão da Organização Mundial da Saúde (OMS) de classificar os gases emitidos por motores diesel como carcinógenos, em 2012. Também financiou estudos que questionavam se proibir a circulação de veículos equipados com motores diesel mais antigos em cidades reduziria a poluição.

Volkswagen, Daimler e BMW afirmaram que a organização fazia trabalho científico legítimo. "Todo o trabalho de pesquisa encomendado pelo EUGT era acompanhado e revisado por um comitê consultivo de pesquisa formado por cientistas de universidades e institutos de pesquisa respeitados", afirmou a Daimler em comunicado.

Daimler e BMW declararam não saber que o Volkswagen usado nos testes em Albuquerque havia sido modificado para gerar dados falsos. A Volkswagen declarou em comunicado que os pesquisadores jamais haviam publicado um resultado completo do estudo.

Mas não por não terem tentado.

Documentos apresentados durante o processo judicial demonstram que, em agosto de 2016, Michael Spallek, diretor EUGT, enviou um e-mail ao Lovelace Respiratory Research Institute, encarregado da pesquisa em Albuquerque, declarando que "o ponto de vista do EUGT é que é hora de concluir o relatório ou discutir os problemas do estudo de maneira científica o mais rápido possível", escreveu Spallek.

Isso foi quase um ano depois de a Volkswagen ter admitido que havia equipado milhões de veículos diesel vendidos nos Estados Unidos e Europa com "dispositivos manipuladores", que adotavam um regime mais rigoroso de controle de emissões quando o software detectava que estava sendo testado em laboratório.

Spallek se recusou a comentar, afirmando que seu contrato o proibia de discutir o trabalho do grupo de pesquisa.

CINOMOLGOS

Os testes de Albuquerque foram conduzidos em 2014, usando 10 macacos-cinomolgos, uma variedade extensamente usada em experiências médicas, de acordo com os documentos judiciais.

A Volkswagen tinha papel de liderança no estudo. Engenheiros da empresa supervisionaram a instalação de uma esteira-rolante que permitiria que os veículos rodassem enquanto o equipamento extraía gases de escapamento.

Jake McDonald, cientista que comandou as experiências no laboratório Lovelace, disse que não estava informado de que o Fusca estava equipado com software que reconhecia que o carro estava sendo testado em uma esteira rolante. O software reforçava os controles de emissões para que o nível de dióxido de nitrogênio emitido fosse uma pequena fração das emissões que aconteciam em condições reais de uso.

Em seu depoimento, McDonald declarou que não havia acompanhado de perto o caso da Volkswagen, e que só recentemente descobriu que o Fusca usado nos testes foi manipulado para produzir emissões artificialmente baixas.

"Ficamos com o mico", disse McDonald.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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