Descrição de chapéu transição de governo

Transição estuda formas de reverter obrigação de contratar térmicas jabutis

Grupo avalia criação de nova lei e alterações infralegais para reverter contratação, diz integrante do governo de transição

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Letícia Fucuchima
São Paulo | Reuters

O governo de transição é contrário à obrigação de contratação de 8 gigawatts (GW) de usinas termelétricas embutida na lei nº 14.182 e estuda três caminhos para reverter isso, como alterações infralegais ou uma nova lei, disse à Reuters Maurício Tolmasquim, que integra o grupo que trata de questões de Minas e Energia.

Para evitar que custos bilionários de gasodutos para essas térmicas sejam incorporados à tarifa de energia pelo Congresso, o grupo também vai propor o adiamento de votação de projetos, como o PL 414, que trata da modernização do setor elétrico, acrescentou.

Segundo Tolmasquim, a primeira questão a avaliar é se, pelo texto da lei, o governo tem efetivamente a obrigação de contratar os 8 GW de capacidade instalada estabelecidos, ou se seria suficiente apenas realizar os certames com essa finalidade, independentemente do resultado deles.

Vista Usina térmica a gás Jaguatirica II, localizada na área rural de Boa Vista, capital de Roraima; abastecimento é feito por caminhões, a partir do campo de Azulão (AM) - Lalo de Almeida/Folhapress

Essa é uma interpretação jurídica que já estava sendo analisada pela atual gestão do Ministério de Minas e Energia, após o primeiro leilão de térmicas da lei nº 14.182 ter dado vazio no Piauí e Maranhão. Por essa tese, o governo não precisaria realizar novos certames até conseguir contratar térmicas nesses estados.

Ele afirmou que já existem alguns pareceres e opiniões jurídicas que embasam essa hipótese, que seria "o melhor caminho" para reverter o jabuti das térmicas que, inflexíveis, teriam de operar o tempo todo, queimando gás mesmo quando o país conta com outras fontes mais baratas.

Caso não se mostre viável, outras possibilidades seriam alterar o decreto que regulamentou a lei nº 14.182 ou editar uma nova lei.

"O governo, tomando posse, vai poder analisar isso mais calmamente, ver qual é a medida mais segura do ponto de vista legal", acrescentou.

Em relação aos projetos já contratados, Tolmasquim destacou que os contratos serão respeitados. "Elas [as térmicas] estão garantidas, porque queremos respeitar os contratos realizados, por mais absurdo que sejam".

Nesta segunda-feira, a ex-ministra Marina Silva, que integra o grupo de transição para o meio ambiente, comentou sobre o tema em seu Twitter, dizendo que a reversão de contratação das térmicas está sendo avaliada pelo governo.

Citando custos bilionários de operação dessas térmicas e construção de gasodutos para esses projetos, ela disse que seriam R$ 117,2 bilhões em gastos governamentais "evitáveis" na próxima gestão do presidente Lula.

CUSTO DE GASODUTOS

O próximo governo também quer evitar que o Congresso aprove agora medidas que incorporem à tarifa de energia elétrica custos bilionários para construção de gasodutos que atenderiam as termelétricas no interior do país, disse Tolmasquim.

"Achamos que seria muito ruim se essa proposta fosse incorporada a qualquer um dos projetos de lei. Existem estimativas de que o custo seria superior a R$ 80 bilhões."

Diferentes formas de financiar a expansão da rede de gasodutos pelo país já foram levantadas pelo Congresso, principalmente sob a alcunha de "Brasduto". Essa emenda chegou a ser incluída, por exemplo, na Lei do Gás, mas foi rejeitada pelo legislativo.

Para impedir novas iniciativas dos parlamentares favoráveis à medida, o grupo está propondo adiar a votação do PL 414, projeto de lei que trata da modernização do setor elétrico e que pode receber emendas com o "jabuti" do custo dos gasodutos.

"No caso do 414, por questão de prudência, estamos propondo deixar a aprovação ao próximo governo", afirmou Tolmasquim, acrescentando que o projeto envolve questões muito relevantes do setor elétrico e não há caráter de urgência para ser apreciado ainda neste ano.

Tolmasquim, que é ex-presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), afirmou que a construção das térmicas conforme proposto na lei —em regiões distantes das reservas de gás e dos centros de carga—, bem como os gasodutos para "interiorizar" o gás, não têm lógica econômica e atendem a interesses particulares de empresários do setor.

Ele defendeu que o setor precisa expandir seu parque termelétrico com usinas flexíveis, isto é, que funcionem conforme a demanda do setor elétrico --em períodos de hidrologia ruim e menor produção solar e eólica-- e que tenham geração adaptável, com partida rápida, por exemplo.

"Vai ter momentos que você tem muita geração eólica, solar ou hidrelétrica e você tenha que queimar o gás desnecessariamente. Isso tem impacto tanto para o consumidor, que vai pagar o combustível desnecessariamente, como ambiental, porque elas emitem muito (gás carbônico)".

PCHS

Tolmasquim avaliou ainda que a obrigação de contratação de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), também embutida na lei nº 14.182, fere a lógica econômica, constituindo uma reserva de mercado para a fonte e prejudicando a competição.

"O foco primordial é a questão das termelétricas, mas se a solução (para reverter a obrigação de contratação) for uma lei, eventualmente pode-se incorporar a questão da PCH", disse.

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