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05/11/2012 - 03h30

Desempregados gregos dependem de sistema de saúde paralelo

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LIZ ALDERMAN
DO "NEW YORK TIMES"

Como chefe do maior departamento de oncologia da Grécia, Kostas Syrigos achava que já tinha visto de tudo. Mas nada o havia preparado para conhecer Elena, uma desempregada diagnosticada com câncer de mama um ano antes de procurá-lo.

O tumor atingira o tamanho de uma laranja e havia irrompido pela pele, deixando uma ferida que ela drenava com guardanapos de papel. "Quando a vimos, ficamos sem palavras", disse Syrigos, chefe do setor de oncologia do Hospital Geral Sotiria, no centro de Atenas. "Tudo mundo chorava. Coisas assim são descritas nos livros, mas você nunca as vê, pois, até agora, quem ficava doente neste país sempre podia procurar ajuda."

A vida na Grécia virou de ponta-cabeça desde que a crise da dívida se instalou. Porém, em poucas áreas a mudança foi tão drástica como na saúde. Até recentemente, a Grécia tinha um típico sistema europeu de saúde, com empregadores e indivíduos contribuindo com um fundo que, com assistência governamental, financiava o atendimento universal. Quem perdia o emprego continuava com o benefício.

Isso mudou em julho de 2011, quando a Grécia assinou um acordo com credores internacionais para evitar um colapso financeiro. Agora, conforme prevê o acordo, quem perde o emprego recebe o benefício por no máximo um ano. Depois, precisa se virar.

Cerca de metade dos 1,2 milhão de gregos em situação de desemprego prolongado não tem plano de saúde, e a cifra deve subir mais, com um desemprego de 25% e uma economia moribunda, segundo Savas Robolis, diretor do Instituto Trabalhista da Confederação Geral de Trabalhadores Gregos.

Um novo pacote de austeridade de US$ 17,5 bilhões em cortes orçamentários e aumentos tributários, definido com os credores internacionais, irá piorar as coisas, segundo a maioria dos economistas.

As mudanças estão forçando cada vez mais gente a procurar auxílio fora do sistema tradicional de saúde. Elena foi encaminhada para Syrigos por médicos de um movimento informal que atende os sem-seguro.

"Na Grécia atual, estar desempregado significa a morte", disse Syrigos. "Estamos nos encaminhando para a mesma situação dos Estados Unidos, onde, quando você perde o emprego e não tem plano de saúde, não tem cobertura. "

O sistema de saúde da Grécia está cada vez mais disfuncional e pode piorar se o governo cortar mais US$ 2 bilhões do setor, como já propôs. Com os cofres públicos vazios, alguns pacientes são obrigados a trazer seus próprios suprimentos, como stents (próteses metálicas para a desobstrução de artérias) e seringas.

Hospitais e farmácias só aceitam dinheiro vivo na venda de remédios, o que para pacientes de câncer pode equivaler a dezenas de milhares de dólares, quantia que a maioria não possui.
Syrigos e vários colegas montaram uma rede para ajudar vítimas de câncer e outras doenças que não tenham plano de saúde.

A rede usa sobras de remédios doadas por farmácias, por alguns laboratórios e até por famílias de pacientes que morreram. Na Grécia, médicos que forem flagrados usando remédios do hospital para ajudar uma pessoa sem cobertura médica precisam arcar com os custos.

Na Clínica Social Metropolitana, um hospital improvisado na periferia de Atenas, Giorgos Vichas aponta para sacos plásticos cheios de remédios doados.

"Somos uma rede Robin Hood", disse o cardiologista Vichas, que fundou o movimento em janeiro.

Enquanto ele falava, Elena apareceu, pedindo remédios.

Ela deixou o emprego de professora para cuidar de parentes doentes. Ao saber que tinha câncer, tentou vender algumas terras, mas não achou comprador.

"Se eu não pudesse vir aqui, não faria nada", disse. "Na Grécia de hoje, você precisa fazer um contrato consigo mesmo de que não vai ficar muito doente."

Colaborou Dimitris Bounias

 

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