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Em Roma não sabem batizar, me disse o futuro papa João Paulo 1º
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CARLOS HEITOR CONY
COLUNISTA DA FOLHA
O conclave que se seguiu à morte de Paulo 6º, em 1978, foi o mais politizado dos últimos séculos. Os cardeais estavam divididos entre adeptos do Concílio Vaticano 2º, curialistas, progressistas e até terceiro-mundistas.
No quarto escrutínio do primeiro dia, sem encontrar um nome que contentasse a todos, os cardeais optaram por despolitizar a eleição.
Buscaram um homem notável por sua simplicidade.
Em 1974, eu estava em Veneza e conversei com o cardeal Albino Luciani. Sede de patriarcado, a cidade deu vários papas à igreja.
Na época, Paulo 6º havia lançado a encíclica "Humanae Vitae", e os bispos reclamaram tanto que o ex-cardeal Montini ficou classificado como "papa hamletiano".
Albino Luciani respondeu a uma pergunta minha. Disse: "Gosto de batizar crianças, e em Roma não sabem mais fazer isso".
Luciani considerou a sua eleição um "assurdo", mas aceitou a investidura e tomou o nome de João Paulo 1º.
Em seus primeiros pronunciamentos, citava Pinóquio, Tom Sawyer, parecia um tio da província e estava sempre rindo. Era o Papa Sorriso, que durou 33 dias, pouquíssimo para um pontificado, mas suficiente para um recado.
ABERTURA PARA O LESTE
O conclave de 1978 começou com uma sombra. Havia a versão de que João Paulo 1º fora envenenado; a Cúria Romana não teria se habituado com o novo papa --o que seria mútuo--, o aldeão, o provinciano Luciani era "muito pueril" para aceitar a complicada estrutura do Vaticano.
Dois meses depois, houve novo conclave marcado pela ambição do cardeal de Gênova, Giuseppe Siri, que exigia o papado desde a sucessão de Pio 12 e teria 28 votos no primeiro escrutínio.
O cardeal Giovanni Benelli, homem forte no tempo de Paulo 6º, que seria o favorito para sucedê-lo, havia deixado a Secretaria de Estado e fora deslocado para Florença, a fim de adquirir um mínimo de prática pastoral.
Benelli fora bem-sucedido como articulador de Luciani e jogou todas as suas fichas no cardeal de Milão, Giovanni Colombo, que foi eleito, mas não aceitou o cargo.
O esquema armado por Benelli desmoronou e surgiu o cardeal de Viena, Franz Koenig, articulador da abertura para o leste que se tornaria a "ostpolitik". Seria a hipótese de um papa não italiano, e aquela noite foi chamada de "noite do estrangeiro".
Um brasileiro, Aloísio Lorscheider, teve 11 votos, o argentino Eduardo Pironio teve cinco e um polonês, arcebispo de Cracóvia, teve três.
Karol Wojtyla não se perturbou, continuou lendo uma revista. No escrutínio que se seguiu, sua votação subiu para 14. Ele fechou a revista e olhou assombrado para os cardeais. No escrutínio seguinte, seria eleito com mais de dois terços dos votos.
Temos agora novo conclave. Como sempre, em meio de grave crise na igreja. Qualquer que seja o eleito, pegará um abacaxi que Bento 16º não soube ou não quis descascar. Mas "la nave va".
CARLOS HEITOR CONY cobriu os conclaves que elegeram João Paulo 1º e João Paulo 2º, em 1978
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