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Estilo da "dama de ferro" refletia embate de classes
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RAFAEL CARRIELO
DE SÃO PAULO
PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES
As sucessivas eleições e o estilo duro, quase autoritário, de Margaret Thatcher foram o resultado das conquistas e conflitos -econômicos e sociais- do modelo de país que ela ajudou a enterrar.
Uma dessas conquistas foi o poder dos sindicatos e a elevação do padrão de vida dos trabalhadores britânicos. Entre 1978 e 1979, na tentativa de conter a inflação, o então governo trabalhista determinou limites ao aumento de salários de funcionários públicos.
Ferroviários, motoristas de ambulância, lixeiros e coveiros, entre outros, fizeram paralisações em protesto.
Um dos grupos mais insatisfeitos com a "chantagem" e a "desordem" -como viam a situação- impostas ao país pelos sindicatos era uma nova classe média cuja ascensão social se deu justamente como resultado das conquistas do Estado de bem-estar social britânico, vigente desde a década de 40.
Há um exemplo "clichê", diz Tony Judt, autor de "Pós-Guerra" (Objetiva), do representante dessa nova classe, que em 1979 pendeu para Thatcher. "Um corretor imobiliário, cujo pai havia sido operário numa fábrica de carros, e que agora usa gravata, tem sua própria casa, embora na verdade não tenha lá muito dinheiro."
"Essa classe de pessoas que ascenderam socialmente, que não eram sindicalizadas, e pertenciam majoritariamente ao setor de serviços, compunha a "foto" sociológica do eleitor de Thatcher", ele diz.
O também historiador Kenneth Maxwell diz que havia claramente uma oposição entre os dois grupos.
"Era uma situação de crise, e ela recebeu o mandato para enfrentá-la. Capturou essa fantasia de uma classe média que se acreditava o que havia de melhor no Reino Unido do pós-guerra, e entregou o que prometia -uma política fiscal restritiva, limpar e acabar com o poder dos sindicatos."
É possível entender, assim, que seu estilo de confronto -com sindicatos, com a oposição- fizesse tanto sucesso político com os eleitores.
MINEIROS E MALVINAS
Assim foi forjada a ideia da "dama de ferro", que em 1984 e 1985 enfrentou uma dura greve de mineiros, que durou um ano, sem fazer concessões. Ao final, a derrota desse grupo, somada a reformas trabalhistas, representou uma pá de cal no movimento operário no país.
A consolidação de sua liderança, dizem os historiadores, viera antes, em 1982, durante a Guerra das Malvinas. A vitória britânica sobre a Argentina, que reclamava como suas as ilhas que eram território do Reino Unido desde o século 19, reforçou não só sua imagem como a do próprio país.
Para Tony Judt, Thatcher usou a guerra como "um símbolo duplo": "Da sua força e decisão, e da recuperação do Reino Unido de sua decadência -econômica e imperial- e fraqueza nos anos 70."
Maxwell vê num "comprometimento pessoal" da primeira-ministra a possibilidade de vitória contra a Argentina. "Quando você pensa que as frotas tiveram que atravessar o Atlântico.... Um outro líder, eu creio, teria cedido. Foi aí que o seu caráter durão funcionou", ele diz. "Depois disso, ela se tornou mais e mais autoritária."
O uso que Thatcher fez do apoio e poder acumulados criou uma espécie de paradoxo entre sua atuação política e seus ideais liberais nos campos social e econômico.
A grande defensora da redução dos poderes do Estado centralizou o poder, limitando e até cassando poderes locais. Sete grandes administrações regionais, todas encabeçadas por trabalhistas, foram extintas em 1986, entre eles o Greater London Council.
Em 2000, já sob governo trabalhista, a figura de um "prefeito" para Londres foi recriada. O eleito de certa forma reassumia o poder, embora formalmente os cargos fossem distintos, já que o trabalhista Ken Livingstone administrava a cidade quando sua função foi extinta, em 1986.
No dia da posse, começou assim o seu discurso para os londrinos: "Como eu estava falando antes de ser tão rudemente interrompido 14 anos atrás...".
Texto gerado originalmente na Folha*, em 03/05/2009
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