Tamanho dos países atrapalha democracia africana
Pegue a área somada de Bélgica, Itália, Suíça, Alemanha, Reino Unido, Áustria, Grécia e Dinamarca. Dá um total de 1.233.070 quilômetros quadrados.
Todos esses países juntos caberiam em apenas um país africano de tamanho médio africano, como é Angola, com sua área de 1.246.700 quilômetros quadrados.
É um gráfico com esses números que Ian Spears, especialista em África da Universidade Guelph (Ontário, Canadá), exibe a seus alunos para explicar que o grande tamanho dos países africanos é um dos possíveis motivos pelos quais a África é um continente de relativamente poucas democracias.
Aliás, a Freedom House, instituição norte-americana especializada na promoção da democracia, criticou duramente o presidente Barack Obama por ter citado as eleições legislativas na Etiópia como exemplo de democracia.
France Presse | ||
Orla marítima de Luanda, capital de Angola |
"Chamar o governo da Etiópia de democraticamente eleito reduz os padrões para a democracia e mina o trabalho corajoso de tantos etíopes que lutam para estabelecer uma sociedade justa e democrática", reclamou Mark Lagon, presidente da Freedom House.
A Etiópia entra no ranking 2015 da Freedom House como "não livre", categoria em que caem 21 países da África subsaariana.
Dezoito são "parcialmente livres", e apenas 10 são "livres", sempre segundo o ranking.
Se, no entanto, se quiser um olhar mais positivo, constate-se que a maioria dos habitantes da África (60% exatamente) vive em países parcialmente livres (48%) ou livres (os outros 12%).
É claro que o tamanho não é o único obstáculo para o florescimento da democracia. Se fosse, nem Estados Unidos nem o Brasil seriam democráticos.
Na África, jogam dois fatores complicadores.
Primeiro, a imensa diversidade. Dependendo do que se considere como grupo étnico, os países africanos podem ter de várias dezenas a várias centenas de grupos étnicos.
A Nigéria, por exemplo, tem cerca de 250 diferentes grupos linguísticos, lembra Ian Spears.
Completa o especialista: "Países como Brasil e Canadá são também grandes, mas tendem a ser dominados por uma única tradição política e a ter instituições mais fortes. Na maioria dos países africanos, pode haver grupos dominantes, mas não há uma única tradição política com a qual todos concordem".
Um terceiro fator complicador é apontado por Steve McDonald, diretor do Programa África do Wilson Center: "Os governos coloniais dificultaram as coisas na época da independência na medida em que quase sempre passaram o domínio para seus homens preferidos ou para grupos tribais que achavam que podiam controlar".
Mais de um antropólogo aponta para um elemento cultural: nos tempos pré-coloniais, o voto para decidir o que fazer era um instituto desconhecido pelas tribos.
Preferiam a assembleia dos anciãos, que se reunia até chegar a um consenso.
"Essa visão romântica de anciãos reunidos sob uma árvore tornou-se um problema real quando as aldeias ganharam escala e se tornaram do tamanho dos Estados contemporâneos modernos", diz Ian Spears.
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