Grupo pauta agenda racial de candidatos democratas à Casa Branca
Com contestações ao machismo e ao próprio movimento negro, o grupo Black Lives Matter passou de hashtag a uma organização com 26 diretórios estaduais e um internacional (Canadá) em menos de quatro anos.
Com isso, pôde pautar a agenda racial da disputa eleitoral pela sucessão do primeiro presidente negro dos EUA.
O nome, que em tradução literal significa "vidas negras importam", surgiu para nortear postagens em redes sociais e rapidamente se tornou um slogan de protestos multiplicados pelo país.
Arquivo Pessoal | ||
Janaé Bonsu, 24, ativista do Black Youth Project, durante ato do grupo na cidade de Chicago |
Foi apropriado de forma que as fundadoras consideraram por vezes inadequada, além de gerar uma disputa semântica interpartidária.
Derivações como "todas as vidas importam" e "vidas azuis importam", em alusão a policiais, foram lançadas como provocação ao teor afirmativo do movimento, "uma resposta ao racismo virulento que permeia a nossa sociedade", definem as criadoras.
Alicia Garza, Opal Tometi e Patrisse Cullors criaram a hashtag para tratar de comentários contra a decisão de não indiciar o segurança branco que matou o adolescente negro Trayvon Martin, 17, na Flórida, em 2012.
Uma marcha em protesto contra a morte de Michael Brown, 18, em agosto de 2014, em Ferguson (Missouri), por um policial branco, aglutinaria mais forças.
O grupo diz ir "além [da crítica a] mortes extrajudiciais de pessoas negras" ou do discurso autoafirmativo como "ame a negritude". Sua carta de princípios inclui o reconhecimento da diversidade de gêneros, o acolhimento de imigrantes sem documentos e críticas ao encarceramento em massa.
"Muita gente achou que o movimento era passageiro e dependeria do protótipo do líder negro, masculino, carismático, de fé e heterossexual", afirmou Jason Tompkins, 35, um dos coordenadores em Chicago. "Mostramos que temos poder."
Em agosto, eles irromperam em comício da pré-candidata democrata Hillary Clinton pedindo que a ex-secretária de Estado deixasse de aceitar doações de grupos ligados a prisões privadas. Meses depois, ela cedeu.
Quando o BLM interrompeu evento do pré-candidato democrata Bernie Sanders, em poucas horas ele tornou pública uma agenda de campanha pela justiça racial.
"O BLM não apoia candidato. A tática que continuaremos a usar é cobrar determinados postulantes quanto às nossas demandas", disse Tompkins. "Determinados", diz ele, porque não compensa pressionar republicanos "que não nos levam a sério".
O pré-candidato da oposição que lidera pesquisas, Donald Trump, chegou a dizer que um ativista "talvez devesse ter sido espancado" quando interrompeu seu discurso em Birmingham (Alabama), cidade onde Martin Luther King (1929-68), preso, escreveu manifesto pela não violência, em 1963.
Lembrando que negros representaram a maior fatia dos eleitores de 18 a 24 anos na primeira eleição de Barack Obama, o jornalista Donovan Ramsey diz que o jogo não está ganho para os democratas.
"Queremos o fim do sofrimento imposto e sancionado pelo Estado. Qualquer outra coisa será rejeitada."
O professor da Cuny (Universidade da Cidade de Nova York) Tshombe Miles diz que a descentralização e o uso de tecnologia expandiram a visibilidade do BLM.
Para Miles, no Brasil, onde ele vive parte do ano, o desafio do movimento negro é maior no que tange, por exemplo, à escolaridade média dessa população e à sua exclusão do mercado de trabalho.
"O mainstream foca a discussão sobre celebridades com a atriz Taís Araújo e a jornalista Maju Coutinho. Elas sofreram racismo real, mas e as questões estruturais?"
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