Líderes mundiais dividem-se entre críticas e moderação sobre Brexit
Líderes mundiais dividiram-se nesta sexta-feira (24) em manifestações sobre a decisão histórica do Reino Unido de deixar a União Europeia.
Entre governantes do bloco, que hoje congrega 28 países, a chanceler alemã Angela Merkel e o presidente francês François Hollande demonstraram as reações mais veementes, contrárias à separação.
Merkel definiu como "lamentável" e um "divisor de águas" para a integração das nações europeias o resultado do plebiscito britânico. "Precisamos reconhecer a decisão da maioria dos britânicos com grande pesar hoje", afirmou durante entrevista coletiva.
Em uma declaração televisionada, o presidente francês François Hollande disse que o Brexit —fusão das palavras "saída" e "britânica" em inglês— é "um duro teste" para a UE e que deverá tomar iniciativas para colocar o bloco econômico de volta nos trilhos.
"Para seguir em frente, a Europa não pode mais agir como antes", avaliou, defendendo mudanças nas ações do bloco.
Em coletiva de imprensa, a primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, afirmou que fará o que for necessário para manter o país dentro do bloco e que há grande probabilidade de lançamento de um segundo referendo sobre a independência do Reino Unido. "É uma afirmação do óbvio que a opção de um segundo plebiscito deve estar na mesa", disse a repórteres.
O premiê interino da Espanha, Mariano Rajoy (PP, conservador), pediu tranquilidade em pronunciamento. "Este resultado deve fazer com que todos os Estados-membros da UE reflitamos e nos esforcemos para reconquistar o sentimento fundador europeu e recuperar a atração exercida por ele sobre nossos cidadãos."
O presidente russo Vladimir Putin denunciou a atitude que considerou "superficial" por parte do governo britânico. "A organização desse referendo e seus resultados são uma atitude presumida e superficial das autoridades britânicas em relação a assuntos cruciais para o país e o conjunto da Europa", declarou, segundo agência oficial Tass.
Mais moderado, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, disse em comunicado respeitar o resultado do referendo e que a relação dos EUA com o Reino Unido continua importante. "O Reino Unido e a União Europeia continuarão sendo parceiros indispensáveis dos Estados Unidos mesmo enquanto começam a negociar sua relação atual."
Obama havia se declarado contrário à saída do Reino Unido do bloco econômico. Em abril, durante visita a Londres, ele pediu aos britânicos que votassem pela permanência do Reino Unido na UE e disse que o país iria "para o final da fila" das negociações comerciais com os EUA se deixasse o grupo.
Na mesma linha, a China divulgou comunicado em que declarou respeitar a separação. "Vemos nossas relações com o Reino Unido e a União Europeia de um ponto de vista estratégico e a longo prazo", afirmou a porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores Hua Chunying. Uma "Europa estável e próspera serve aos interesses de todos", acrescentou.
A opção por deixar a União Europeia venceu por 51,9% a 48,1% no Reino Unido, abalando mercados financeiros e provocando uma onda de choque e incredulidade global. A consulta popular registrou índice histórico de comparecimento -72,2% do eleitorado- e recorde de 46,5 milhões de eleitores registrados.
Por volta das 4h (hora de Brasília), o premiê conservador, David Cameron, principal fiador do voto pró-UE, anunciou que irá renunciar ao cargo.
EFEITO DOMINÓ
Em torno da decisão do Reino Unido, há a especulação sobre um efeito dominó em outros países do bloco, que podem imitar a consulta popular para obter vantagem em negociações, e o impulso a movimentos separatistas como o escocês e o catalão.
Nigel Farage, líder do partido de extema-direita britânico Ukip e um dos maiores entusiastas da saída do Reino Unido do bloco, disse esperar que o exemplo britânico seja o início de um processo maior de desintegração da UE.
"A União Europeia está enfraquecida, a União Europeia está morrendo", disse Farage em um discurso em Londres.
Logo após o anúncio do resultado britânico, políticos de partidos de extrema-direita na Holanda, França e Itália pediram pela realização de consultas pela saída da UE em seus respectivos países.
Geoff Caddick/AFP | ||
Nigel Farage, líder do partido de extema-direita britânico, comemora resultado de plebiscito |
Marine Le Pen, líder do partido francês Frente Nacional, afirmou que os cidadãos de seu país deveriam ter o direito de opinar a respeito da permanência no bloco.
Na Holanda, o líder anti-imigração Geert Wilders disse por meio de um comunicado que os holandeses "querem estar no comando de seu país, de seu dinheiro, de suas fronteiras e de suas políticas de imigração".
Mateo Salvini, líder do partido italiano Liga Norte tuitou: "Viva a coragem dos cidadãos livres! Coração, cérebro e orgulho derrotaram as mentiras, ameaças e chantagens. Obrigado, agora é nossa vez".
Na Dinamarca, o Partido Popular, que quer renegociações com UE, saudou a decisão "corajosa" dos britânicos, mas afirmou que todos "devem manter a cabeça no lugar".
Em visita à Escócia, o virtual candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump, também demonstrou apoio ao resultado, dizendo que os britânicos "retomaram seu país" e comparando o plebiscito à sua própria campanha para limitar a entrada de imigrantes ilegais nos EUA.
O presidente do Conselho Europeu (que reúne os chefes de Estado dos países membros para definir a agenda política da UE), Donald Tusk, disse que não é hora de "reações histéricas" e que os outros membros do bloco estão "determinados a manter a unidade".
Em uma declaração em nome das outras 27 nações integrantes do bloco, ele pediu a Londres que inicie "o quanto antes" o processo de ruptura, "sem pensar em quanto doloroso possa ser".
Presidente do Parlamento europeu, Martin Schulz anunciou que se reunirá com a chanceler alemã para evitar um efeito dominó. "A reação em cadeia, que os eurocéticos celebram agora um pouco em todas as partes, não vai acontecer", disse.
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