Decadência de Atlantic City é apontada como reflexo de fracassos de Trump
Donald Trump se sentia um gênio naquele 2 de abril de 1990. Diante da plateia, esfregou uma lâmpada gigante dourada, e uma voz disse: "Sim, mestre". Com Michael Jackson ("somos amigos"), perambulou na abertura do Trump Taj Mahal, o maior cassino do mundo então, em Atlantic City (Nova Jersey), a Las Vegas da Costa Leste dos EUA.
"Ninguém achava que seria construído. Adoro desmentir as pessoas", disse à época. Mas a "oitava maravilha do mundo", como o chamou, pediria falência no ano seguinte, com US$ 3 bilhões (R$ 9,8 bilhões) em dívidas.
Gabriel Cabral/Folhapress | ||
Funcionários do cassino Trump Taj Mahal, em Atlantic City, vendido por Donald Trump |
Trump usou quase US$ 1 bilhão de sua fortuna como garantia, a ponto de declarar a Marla Maples, então sua mulher: "Vê aquele homem? Ele vale US$ 900 milhões a mais do que eu". Era um pedinte com quem cruzaram.
Já no primeiro dia da campanha, o presidenciável republicano se vendeu como empresário bem sucedido e disse que só ele era capaz de recalibrar a economia dos EUA: "Serei o maior presidente para [promover] empregos que Deus já criou".
INÉPCIA EMPRESARIAL
Atlantic City, contudo, é apontada por críticos como símbolo de sua inépcia empresarial. De 1991 a 2009, seus negócios locais entraram com quatro pedidos de falência (empresas insolventes podem declarar bancarrota sem fechar, ganhando tempo para quitar as dívidas).
Funcionários perderam o sustento, e Trump se desfez do império local –três cassinos mais hotéis– deixando o fardo financeiro para quem investiu.
O empresário já disse que "tirou um dinheiro incrível de lá" e saiu "no momento certo" da cidade, abalada por uma crise que afetou toda a indústria da jogatina, então de nada se arrepende.
Gabriel Cabral/Folhapress | ||
Turistas jogam no Taj Mahal; negócio deve ser fechado até outubro por novo dono |
"Ele não sabe tocar um negócio. Sua habilidade é montar, investir pouquíssimo e conseguir tirar lucro antes de sair", disse à Folha David Cay Johnston, autor de "The Making of Donald Trump" (a criação de Donald Trump).
Sob nova direção, o Trump Taj Mahal ainda leva o nome do fundador e é o último dos cassinos da era Trump de pé.
Por pouco. Carl Icahn, atual dono, promete fechá-lo e por na rua 3.000 funcionários. Culpa uma greve que dura dois meses e parou um terço da equipe –de bartenders a camareiras que pedem benefícios como plano médico.
Para o carregador de malas Al Wallinger, 58, as boas lembranças com o Taj Mahal, assim como a simpatia por Trump, ficaram no passado. Ele trabalha lá desde 1990 e lembra de Bruce Willis, "que jogava pra caramba", e Nicolas Cage, que filmou ali.
A cozinheira Nasrin Jahan, 50, não nega: a vida no cassino era melhor do que em sua Bangladesh natal. "Fiz dinheiro aqui", diz, exibindo a bolsa da grife Michael Kors, perto da estátua de elefante com pintura descascada.
Mas o estilo de vida caiu. Em sua opinião, Trump daria ao país o mesmo destino do cassino, hoje à beira de mais uma falência. "Ele fala que a classe média está perdendo empregos, mas colaborou para isso. Trump é uma marca ruim. Olhe para Atlantic City", afirma Diana Hussein, porta-voz do sindicato local.
A gerência anunciou que fecharia o cassino após o Dia do Trabalho, nesta segunda (5), mas o aviso prévio de 60 dias só expira em outubro.
Alterando turnos, os grevistas gritam 24 horas nas saídas do Taj Mahal, sob o olhar indiferente dos visitantes –numa quinta à noite, o cassino é dominado por idosos solitários, que fumam à vontade e bebem de tequila sunrise a gim tônica de graça.
Recentemente, o "New York Times" revelou que os negócios de Trump acumulam US$ 650 milhões em dívidas. O ex-presidenciável republicano Mitt Romney listou em março outros fracassos de seu desafeto: "O que aconteceu com a Trump Airlines? A Universidade Trump? A Revista Trump, a Vodca Trump, o Filé Trump Gênio dos negócios ele não é".
A Folha procurou as Organizações Trump, a campanha republicana e o dono do Taj Mahal. Ninguém respondeu.
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