Resultado reacende debate sobre reforma eleitoral nos EUA
Mark Wilson/Getty Images/AFP | ||
O presidente eleito Donald Trump, após a divulgação dos resultados na quarta (9) |
Mesmo sem ganhar no voto popular, Donald Trump foi eleito presidente de uma das maiores democracias do mundo. O paradoxo se deve ao descompasso entre os votos obtidos e o peso de cada Estado no Colégio Eleitoral. O resultado reacendeu o debate sobre reforma política nos Estados Unidos.
A eleição presidencial nos EUA é indireta. Quando mais de 130 milhões foram às urnas em 8 de novembro, os eleitores votaram nos delegados estaduais para o Colégio Eleitoral. Em 10 de dezembro, esses representantes confirmarão a escolha dos eleitores nos Estados -a vitória de Trump.
Para ser eleito presidente, um candidato precisa de 270 votos no Colégio Eleitoral. Cada Estado tem um número de delegados proporcional ao tamanho dea população. A Califórnia, com 39 milhões de habitantes, tem 55 delegados, contra 3 delegados do Alaska (700 mil pessoas).
Pode parecer justo, mas o problema é a regra "o vencedor leva tudo", pela qual o candidato que ganhar a maioria dos votos em um Estado leva todos os delegados correspondentes. A exceção são Maine e Nebraska, que seguem a proporcionalidade.
O voto dos eleitores conta menos nos Estados que têm um eleitorado ideologicamente definido, como a Califórnia, que tradicionalmente apoia os democratas, ou o Texas, que sempre segue os republicanos. Se um candidato recebe 20 milhões ou 30 milhões de votos na Califórnia, sua representação no colégio não se altera por isso.
Quem define a disputa são os eleitores nos Estados-pêndulo . A decisão acaba na mão de dois ou três estados, ou de condados pequenos, como aconteceu dessa vez.
Muitos americanos acham que o sistema eleitoral deve ser reformado. Os críticos pedem por mudanças radicais, como o fim do Colégio Eleitoral, ou simples, como acabar com "o vencedor leva tudo".
Segundo o historiador Alexander Keyssar, 69, professor da Universidade Harvard, o Colégio Eleitoral foi criado em uma época de confusão e incerteza [a fundação do país], e tinha como objetivo garantir o direito dos
Estados e o federalismo. Hoje, afirma, o sistema compromete a representatividade.
Autor do livro "The Right to Vote: The Contested History of Democracy in the United States" (o direito de voto: a controversa história da democracia nos Estados Unidos), Keyssar diz que a eleição de Trump deverá aquecer o debate público sobre reforma política, embora sem apoio dos republicanos.
Movimentos ativistas como o National Popular Vote também trabalham para mudar o sistema eleitoral, mas as chances são pequenas.
Modificar as regras requer alterar a Constituição, aprovação de maioria qualificada no Congresso e ratificação da decisão nos legislativos estaduais.
Hillary não foi a primeira a viver o paradoxo da derrota com maioria do voto popular. O mesmo ocorreu outras quatro vezes, a última com Al Gore, em 2000 –George W. Bush foi eleito.
Quatro anos depois, Bush quase perdeu a eleição para John Kerry, apesar de ter 3,5 milhões de votos populares a mais do que o democrata. "Caso conseguisse mais 60 mil votos em Ohio, por exemplo, Kerry teria levado a Casa Branca. Bush teria entrado para a história como o presidente eleito em 2000 sem o voto popular, e derrotado em 2004 tendo a preferência da população", disse Keyssar.
ENTENDA COMO FUNCIONA O COLÉGIO ELEITORAL
Editoria de Arte/Folhapress | ||
O que é o Colégio Eleitoral?
Grupo formado pelos delegados, 538 "eleitores" que representam cada um dos os Estados do país na eleição presidencial indireta. Estes delegados formam um corpo deliberativo que escolhe o presidente e o vice-presidente dos EUA a partir do resultado da votação popular de cada Estado. Esse grupo não se reúne fisicamente e vota em seus próprios Estados
Quem pode ser "eleitor" no Colégio Eleitoral?
Há poucas regras constitucionais limitando a participação nos Colégios Eleitorais, mas cada Estados costuma seguir um modelo próprio. Antes de novembro, os núcleos estaduais ou o comitê central #dos partidos indicam seus potenciais representantes, ou "eleitores" no Colégio Eleitoral. Os indicados precisam ter fortes ligações partidárias
Qual é número de "eleitores" no Colégio Eleitoral?
Os eleitores vão às urnas para escolher o presidente, mas o voto na verdade vai para os representantes indicados pelos partidos. Em 48 dos 50 Estados americanos, o candidato que ganhar a maioria do voto popular leva o número de "eleitores" correspondente no Colégio Eleitoral. No Maine e em Nebraska, os "eleitores" são atribuídos proporcionalmente à escolha popular
Qual é número de "eleitores" no Colégio Eleitoral?
O total de 538 "eleitores" equivale à soma de cadeiras no Congresso, sendo 100 no Senado e 438 na Câmara. A distribuição no Congresso e no Colégio Eleitoral é proporcional ao tamanho da população em cada Estado. A Califórnia, cuja população já ultrapassa 39 milhões, tem 55 votos no Colégio Eleitoral; o Alaska, com pouco mais de 738 mil habitantes, tem direito a 3 votos
Os delegados são obrigados a votar no candidato que ganhou no Estado?
Os delegados não são obrigados pela Constituição dos Estados Unidos a seguir o voto popular em seu Estado, mas eles estão atados a normas partidárias ou a leis estaduais. O descumprimento dessa regra é muito incomum, e delegados costumam seguir a decisão do voto popular no Estado, mas a punição em caso contrário costuma ser apenas uma multa
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