Turbulência impede republicanos de aproveitar maioria no Congresso

JENNIFER STEINHAUER
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Os congressistas republicanos, que desejavam unificar o controle do governo para garantir sua agenda conservadora agressiva, encontraram-se, ao contrário, em uma curva elíptica legislativa, escorregando para o nada.

Depois de movimentar-se para reverter a Lei de Acesso à Saúde poucos dias depois de o presidente Donald Trump tomar posse, no mês passado, os legisladores republicanos e Trump ainda não produziram nada da abrangente legislação que prometeram.

Os esforços para inventar um substituto para a lei de saúde foram frustrados por desacordos entre os republicanos sobre como deveriam proceder. O mesmo vale para uma proposta de reforma do código fiscal.

A grande lei de infraestrutura que tanto os democratas quanto Trump estavam ávidos para criar mal foi mencionada, além de uma audiência muito genérica para discutir necessidades bem documentadas para aperfeiçoar a infraestrutura.

Nem uma simples lei de gastos de emergência que o governo Trump prometeu semanas atrás —que deveria incluir uma proposta para seu muro na fronteira mexicana se materializou, deixando os orçamentistas ociosos e checando o Twitter.

A esta altura da Presidência de Barack Obama, quando os democratas controlavam Washington, o Congresso tinha aprovado uma lei de estímulos totalizando quase US$ 1 trilhão para enfrentar a crise financeira, aprovado uma medida que impedia a discriminação de pagamentos, expandido um programa de seguro-saúde para crianças e iniciado o trabalho de base para importantes leis de saúde e regulamentação financeira.

O presidente George W. Bush chegou ao cargo com um projeto do Congresso para sua famosa lei de educação, Nenhuma Criança Esquecida.

Mas no 115º Congresso o Senado fez pouco mais que lutar para confirmar os indicados por Trump, e os republicanos acabaram ajudando a forçar seu escolhido para secretário do Trabalho, Andrew Puzder, a desistir da nomeação na quarta-feira diante da oposição unida dos democratas.

A Câmara passou a maior parte do tempo esmiuçando uma série de medidas de desregulamentação, como derrubar uma regra destinada a proteger águas da superfície de operações de mineração. Trump, por sua vez, usou principalmente decretos executivos para promover políticas.

A inatividade deriva de uma falta de orientação política clara —e, com a mesma frequência, mensagens contraditórias— do governo Trump, que não parece ter passado a campanha e o período de transição formando uma lista de desejos legislativos.

Os democratas também lideraram esforços para retardar a confirmação dos indicados para o gabinete de Trump que poderiam estar comandando o ataque.

"Quando você passa muito tempo falando sobre política e debatendo política na campanha presidencial, é muito mais fácil ser específico sobre a legislação quando chega ao cargo", disse Austan Goolsbee, que serviu como presidente do Conselho de Assessores Econômicos durante o governo Obama.

"O presidente Trump passou a campanha sem colocar nada em detalhe, por isso não é realmente uma surpresa que eles não consigam sequer concordar sobre as prioridades, quanto mais os detalhes legislativos reais."

Os deputados republicanos dizem que devagar e sempre era o plano. "Estamos 100% seguindo o plano de 200 dias que apresentamos ao presidente Trump e aos membros em nosso retiro", escreveu em um e-mail Brendan Buck, o porta-voz do presidente da Câmara, Paul Ryan.

"Orçamento primeiro (feito), depois regulamentos (feito), depois lei do Obamacare (em processo e no tempo previsto), depois impostos (após Obamacare)."

Mas até os democratas, que vinham se preparando para lutas e compromissos sobre a saúde, uma reforma fiscal, infraestrutura e outras questões políticas, estão entediados e frustrados.

"É doloroso para alguém como eu, que estava entusiasmado com as reformas da infraestrutura e fiscal", disse o deputado democrata Jim Himes, de Connecticut. "Parece que o governo e a maioria não estão em lugar nenhum."

AUTOCENSURA

Os congressistas republicanos parecem temerosos de apresentar seus próprios projetos de lei e que Trump ou um de seus assessores, que têm estado amplamente distraídos por escândalos pessoais e de inteligência, solapem seus esforços.

Isto ficou muito claro quando Trump pediu que os republicanos apresentassem um plano substituto para uma lei de saúde que eles esperavam simplesmente rejeitar, deixando os congressistas agitados.

O governo também passou mensagens conflitantes sobre um plano de impostos adotado pelos deputados republicanos que aplicaria a alíquota de imposto corporativo a todas as importações, enquanto isentaria as exportações.

"Pelo nosso lado, está muito claro quem conduz a política", disse um assessor republicano sob a condição do anonimato para que não se tornasse assunto de Trump no Twitter. "Mas pegue qualquer tema e tente pensar nisso pelo lado deles."

A principal influência é o assessor de políticas de Trump, Stephen Miller, que se apresenta como a voz da Casa Branca? Ou o genro do presidente, Jared Kushner? Ou o vice-presidente Mike Pence? Ninguém parece saber.

Reformas profundas dos sistemas de saúde e impostos do país —uma antiga fantasia dos congressistas republicanos— são difíceis nas melhores circunstâncias.

Quando os democratas dirigem o Congresso, "é mais fácil avançarem, porque procuram maneiras de expandir e fazer o governo crescer", disse o senador republicano Jeff Flake, do Arizona. "Os republicanos tentam restringir o governo."

Os republicanos dizem que as coisas iriam muito bem se os democratas autorizassem o gabinete de Trump.

Sob as regras atuais do Senado, os democratas não podem bloquear nenhum dos indicados, mas fizeram o possível para usar instrumentos processuais para prolongar o processo, em parte porque muitas das escolhas do presidente são polêmicas, e em parte por causa de sua antipatia por Trump. Sua única vitória até agora foi derrubar Puzder.

"Eles empreenderam a mais inédita obstrução de nomeados para o gabinete da história", disse no plenário do Senado na quarta-feira (15) o líder da maioria, senador Mitch McConnell, do Kentucky. O Senado também está se preparando para a batalha sobre o indicado por Trump para a Suprema Corte, juiz Neil Gorsuch, que tem se reunido com senadores.

"Até agora, os democratas estão atrapalhando os processos", disse o senador republicano Patrick Toomey, da Pensilvânia. "Vamos perseverar. Vamos abrir caminho e passar."

Mas se todos os indicados fossem confirmados magicamente amanhã, "para onde iriam eles?", perguntou o senador democrata Richard Durbin, de Illinois. "Não existe liderança lá."

De fato, uma campanha amplamente livre de políticas deixou o governo Trump despreparado desde o início, e perguntas sobre as comunicações de sua campanha com a Rússia e outras distrações impediram discussões legislativas sérias.

Alguns republicanos estão frustrados porque nem os projetos de políticas sociais que há muito foram importantes na Câmara, mas morreram no Senado ou foram vetados por Obama, estão avançando.

"Estou muito mais preocupado com o que não estamos fazendo na Câmara em relação a esses temas de valor intrínseco", disse o deputado republicano Jim Jordan, de Ohio.

Houve alguns passos hesitantes em direção à cooperação, como uma análise do envolvimento russo na eleição presidencial. "Até hoje, os republicanos foram parceiros muito construtivos sobre coisas como a invasão de computadores pelos russos", disse Himes.

Mas essa colaboração tem limites. Um projeto que obrigaria o governo Trump a consultar o Congresso antes de dar qualquer passo para levantar as sanções à Rússia foi posto de lado.

"Precisamos ter um governo funcional primeiro", disse o senador republicano John McCain, do Arizona, um patrocinador do projeto.

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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