Trump cogita demitir responsável por investigá-lo, dizem amigos

MICHAEL D. SHEAR
MAGGIE HABERMAN
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Um velho amigo do presidente Donald Trump disse na segunda-feira (12) que Trump está pensando em demitir Robert S. Mueller 3º, o conselheiro jurídico especial que investiga possíveis ligações entre a campanha do presidente e autoridades russas.

A afirmação surpreendente surge enquanto alguns aliados conservadores de Trump, que inicialmente elogiaram a escolha de Mueller como conselheiro jurídico, começam a tentar atacar sua credibilidade.

Christopher Ruddy, executivo-chefe da Newsmax Media, esteve na Casa Branca na segunda-feira e disse no programa "NewsHour" da rede pública PBS que Trump está "considerando, talvez, 'encerrar' o conselheiro especial". "Acho que ele está avaliando essa opção", disse Ruddy.

Seus comentários parecem ter pego a Casa Branca de surpresa.

"Ruddy nunca falou com o presidente sobre esse assunto", disse o secretário de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, em um comunicado horas depois. "Com relação a esse assunto, só o presidente ou seus advogados estão autorizados a se manifestar."

Aliados do presidente projetam dúvidas sobre a ideia de que Trump daria um passo tão drástico, e funcionários da Casa Branca disseram que Ruddy não se reuniu diretamente com o presidente enquanto esteve lá.

Demitir Mueller seria uma medida politicamente explosiva que levantaria novas indagações sobre Trump, cuja demissão repentina de James Comey da direção do FBI provocou acusações de obstrução da Justiça e levou à nomeação de Mueller.

Trump é conhecido, em momentos de frustração e estresse, como alguém que faz ameaças a membros de seu círculo mais próximo. No passado, algumas dessas expressões de ira foram divulgadas por amigos e associados, gerando especulação sobre medidas que nunca ocorreram –como uma reformulação da equipe mais antiga, que ainda não aconteceu.

Tais momentos às vezes refletem a profunda divisão entre os assessores da Casa Branca de Trump sobre o melhor rumo para o presidente tomar diante de adversidades políticas ou jurídicas.

Sob as regras do Departamento de Justiça, Trump aparentemente teria de ordenar ao vice-secretário de Justiça, Rod Rosenstein, para rescindir os regulamentos do departamento que protegem o conselheiro jurídico de ser demitido sem bons motivos, para então demitir Mueller.

Se Rosenstein se recusar, Trump poderia demiti-lo também —uma série de eventos que lembrariam o "Massacre de Sábado à Noite" durante o escândalo de Watergate, quando o presidente Richard Nixon tentou demitir um promotor especial, Archibald Cox.

Autoridades da Casa Branca enviaram perguntas ao advogado pessoal de Trump, Marc Kasowitz, como fizeram recentemente sobre todas as questões relativas à investigação da Rússia. Um porta-voz de Kasowitz não quis comentar.

SOB ATAQUE

O ex-presidente da Câmara dos Deputados Newt Gingrich, um antigo apoiador de Trump, disse na segunda-feira (12) que está na hora de "repensar" a capacidade de Mueller de ser justo.

"Os republicanos estão iludidos se pensarem que o conselheiro jurídico será justo", tuitou Gingrich depois de elogiar a integridade de Mueller nas últimas semanas.

Aparentemente referindo-se a relatórios da Comissão Eleitoral Federal, ele acrescentou: "Vejam quem ele está contratando. Verifiquem relatórios da CEF. Hora de repensar".

A ideia de que a investigação é ilegítima e tem motivação política vem ganhando força na direita política há meses. Jornalistas, âncoras de rádio e personalidades conservadoras da TV a cabo re—forçados pelo próprio presidente, que chamou isso de caça às bruxas— tentaram repetidamente desacreditar o inquérito, seus investigadores, as reportagens sobre o caso na mídia da corrente dominante e os legisladores no Capitólio que exigem mais respostas.

Inicialmente, Comey foi o tema de grande parte de suas críticas. Hoje eles passaram para Mueller, que estão atacando como comprometido e conflituoso demais para liderar um inquérito independente.

Na entrevista na PBS, Ruddy disse que Trump havia considerado substituir Comey por Mueller, que serviu como diretor do FBI durante os governos George W. Bush e Barack Obama.

Uma autoridade graduada da Casa Branca confirmou que o presidente entrevistou Mueller para o cargo no FBI no Salão Oval na véspera de Rosenstein indicá-lo para ser o conselheiro jurídico na investigação da Rússia.

Ruddy disse que o presidente estava avaliando se demitiria Mueller por causa de preocupações sobre conflito de interesses. Ele disse que essas preocupações incluem a entrevista para o cargo no FBI e conexões entre a firma de advocacia de Mueller e autoridades da Casa Branca.

"Existem alguns conflitos reais. Ele vem de uma firma de advocacia que representa membros da família Trump", disse Ruddy. "Sei com certeza que ele estava sendo considerado e que o presidente falou com ele dias antes de ele ser nomeado conselheiro jurídico. Acho que há um conflito aí."

Ruddy também disse acreditar que seria "um erro muito significativo" Trump demitir Mueller, mas enfatizou que estava preocupado com o que ele chama de conflitos.

As críticas a Mueller se intensificaram nos últimos dias, espalhando-se de procuradores de Trump como Gingrich a personalidades poderosas da mídia como Rush Limbaugh. Em seu programa de rádio na semana passada, Limbaugh endossou a sugestão de que Trump demitiria Mueller.

Mark Levin, outro destacado apresentador de rádio, também pediu a demissão de Mueller. "Mueller tem de sair", disse no fim de semana.

Grande parte das críticas se concentraram em se Mueller é próximo demais de Comey. Os dois tornaram-se amigos depois de trabalharem juntos durante o governo Bush.

REAÇÃO DOS DEMOCRATAS

Os democratas acusaram os republicanos na segunda-feira de iniciar uma campanha para difamar Mueller enquanto ele se dedica a uma ampla investigação, que poderá averiguar se Trump obstruiu a Justiça ao pressionar Comey a encerrar partes do inquérito e depois demiti-lo.

O deputado Adam Schiff, da Califórnia, o principal democrata da Comissão de Inteligência da Câmara, escarneceu da ideia de que o presidente possa demitir Mueller.

"Se o presidente demitisse Bob Mueller, o Congresso imediatamente restabeleceria o conselheiro independente e indicaria Bob Mueller", disse Schiff em um tuíte. "Não nos façam perder tempo."

O estatuto do conselheiro independente, aprovado depois de Watergate, permitiu a nomeação de um promotor que examinaria desvios de conduta do Executivo e responderia a um grupo de juízes –e que não poderia ser demitido pelo presidente, como Nixon tentou fazer.

Tanto os republicanos quanto os democratas passaram a rejeitar o estatuto, que eles viram como algo que levou os promotores a se confundir nas investigações do Irã-Contras e de Whitewater durante os governos de Ronald Reagan (1981-89) e Bill Clinton (1993-2001). O Congresso não o renovou quando expirou em 1999.

Seria necessária uma maioria de dois terços das duas câmaras do Congresso para superar o provável veto de Trump a uma legislação semelhante. Está longe de claro que a proposta de Schiff obtenha tal apoio.

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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