Saída de estrategista-chefe não acaba com caos na Casa Branca

JUSTIN SINK
DA BLOOMBERG

A demissão de Stephen Bannon livra a Casa Branca de alguém que alimentava o caos, era obcecado pela própria imagem e semeava o conflito entre altos assessores do presidente.

O problema é que muitas das características mais prejudiciais de Bannon eram apenas uma ampliação do homem que continua sentado no Salão Oval.

Com 30 semanas de governo, o presidente Donald Trump deixou claro que não tem intenção ou capacidade para abandonar uma abordagem de governo que joga seus assessores uns contra os outros, antagoniza abertamente aliados externos e deixa pouco espaço para o difícil trabalho da governança.

Em qualquer outra Casa Branca, a saída de Bannon do cargo de principal estrategista, na sexta-feira (18), serviria como um reinício para o governo depois de uma semana desastrosa dominada pela insistência combativa do presidente de que "os dois lados" foram culpados pela violência na manifestação nacionalista branca em Charlottesville, na Virgínia.

É o gesto mais ousado na tentativa do chefe de Gabinete, John Kelly, de impor ordem numa Casa Branca dividida em campos beligerantes. E parece dar força aos membros do governo que se opunham aos instintos linha-dura e anticomerciais de Bannon, seu isolacionismo militar e sua hostilidade à burocracia federal.

Trump comentou a saída de Bannon pela primeira vez em um tuíte no sábado (19) de manhã: "Quero agradecer a Steve Bannon por seu serviço. Ele veio para a campanha durante minha disputa com a inescrupulosa Hillary Clinton – foi ótimo! Obrigado S."

Bannon, 63, agora levará sua batalha para o lado de fora –onde o presidente e seus assessores não controlarão sua mensagem. Ele tem amplo acesso a financiamento por meio de seu relacionamento estreito com o bilionário conservador Bob Mercer e outros grandes doadores republicanos.

Kurt Bardella, um especialista em comunicações republicano que trabalhou para Bannon no site Breitbart, mas depois o denunciou, previu que o estrategista "se sentirá liberado" com sua partida.

"Agora ele poderá operar aberta e livremente para infligir o maior dano possível aos 'globalistas' que restam no governo Trump", disse Bardella.

Em uma entrevista à Bloomberg pouco depois de sua saída, Bannon prometeu fazer exatamente isso.

"Se há alguma confusão aí, deixem-me esclarecer: estou deixando a Casa Branca e vou à guerra por Trump contra seus adversários –no Capitólio, na mídia e na América corporativa", disse Bannon, que voltou ao cargo que ocupava antes da campanha de Trump, o de presidente-executivo do site conservador Breitbart News.

A mesma crise que acelerou a demissão de Bannon salienta por que a reorganização provavelmente não será mais que simbólica: o homem no topo.

Em seu próprio detrimento, o presidente resistiu a condenar de maneira inequívoca a violência dos supremacistas brancos em Charlottesville há uma semana, posição aplaudida por Bannon.

O episódio foi uma verdadeira representação de Trump. O presidente deixou claro que se inclina naturalmente a apoiar posições politicamente incorretas e é frequentemente contrário a pedir desculpas por seus erros.

Sua vitória eleitoral, apesar de uma série de controvérsias que teriam derrubado quase qualquer outro político, deixou Trump, 71, com a impressão de que ele provavelmente não pagará um custo político por instigar a indignação.

Ele não conseguiu, entretanto, repetir seu surpreendente sucesso eleitoral em Washington, onde o Legislativo e os interesses do establishment que ele gosta de alienar controlam importantes alavancas de poder. Há pouca coisa na saída de Bannon que ajudará a aprovar a anulação do Obamacare, a reforma fiscal ou o plano de infraestrutura de US$ 1 trilhão.

A saída do estrategista não vai consertar relacionamentos abalados por ataques cáusticos, um reflexo exibido novamente nesta semana quando Trump lançou tiradas públicas contra executivos-chefes de empresas e senadores republicanos que ousaram criticá-lo.

A saída de Bannon tampouco convencerá os legisladores a apoiar a agenda de um presidente com índices historicamente baixos nas pesquisas.

Na verdade, a demissão corta um canal com sua base populista.

É também improvável que a saída de Bannon satisfaça os críticos que ainda querem que Trump mostre arrependimento por seus comentários. A líder da minoria na Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, disse em um comunicado na sexta-feira (18) que embora a demissão seja "uma notícia bem-vinda" ela "não disfarça a posição do presidente Trump sobre os supremacistas brancos e as ideias preconceituosas que eles defendem".

Até a saída de Bannon foi motivada em parte pela frustração do presidente de que seu assessor fosse frequentemente pintado como um estrategista mal-intencionado em notícias na imprensa e no programa de TV Saturday Night Live, revelando o intenso fascínio de Trump por seu próprio retrato na mídia.

Outros membros do governo advertiram que a medida poderia reduzir a capacidade do presidente de traduzir suas ideias em políticas.

Bannon era o mais eficaz defensor no governo do cumprimento da agenda de campanha de Trump, segundo uma autoridade da Casa Branca oposta à medida, que pediu o anonimato para comentar a dinâmica interna.

A autoridade previu que a remoção de Bannon isolaria Stpehen Miller, o assessor sênior do presidente mais conhecido por seus esforços para conter a imigração, e deixaria o presidente vulnerável aos chamados "globalistas", que promovem políticas capazes de alienar elementos da base conservadora do presidente.

"Os eleitores de Trump podem ficar aborrecidos porque os EUA não se tornaram grandes de novo", disse Sam Nunberg, um ex-assessor de Trump. "Veremos."

Colaboraram JOSHUA GREEN e MARGARET TALEV

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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