Descrição de chapéu The New York Times

Doadores evangélicos e pró-lsrael pressionaram Trump sobre Jerusalém

MARK LANDER
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Dez dias antes de Donald Trump tomar posse como presidente, Sheldon Adelson foi à Trump Tower para uma reunião particular.

Logo depois, Adelson, bilionário proprietário de cassinos e grande doador de verbas de campanha para o Partido Republicano, ligou para um velho amigo, Morton Klein, para lhe dizer que Trump havia afirmado que transferir a embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv para Jerusalém seria uma grande prioridade.

"Ele estava tão empolgado quanto eu", disse Klein, presidente da Organização Sionista da América, que promove visões de linha dura pró-Israel. "É algo que está no seu coração e alma".

Os dois homens tiveram de esperar quase um ano, mas na quarta-feira Trump, com um retrato de George Washington como pano de fundo, anunciou que estava reconhecendo formalmente Jerusalém como capital de Israel, e anunciou um plano para transferir a embaixada norte-americana para a Cidade Santa, alvo de feroz disputa.

"Embora presidentes anteriores tenham prometido que o fariam, em campanha, jamais cumpriram o prometido", declarou Trump. "Hoje, estou cumprindo a promessa".

Para Trump, a situação de Jerusalém sempre foi menos um dilema diplomático que um imperativo político. Se a escolha era entre decepcionar os evangélicos e os partidários de Israel como Adelson, ou alarmar os aliados e os líderes árabes e colocar em risco a iniciativa de paz que ele mesmo promove, o presidente optou por se alinhar aos seus eleitores mais importantes.

Ao fazê-lo, Trump atraiu opróbrio de líderes estrangeiros, para os quais a iniciativa é irresponsável e causará estragos. Ele também agiu contra as recomendações do secretário de Estado, Rex Tillerson, e do secretário da Defesa, James Mattis, que se preocupam com reações adversas aos Estados Unidos, que podem ser sentidas especialmente pelos diplomatas e soldados do país estacionados no exterior.

Trump reconheceu a natureza provocativa de sua decisão. Mas, da mesma forma que agiu em ocasiões anteriores, como ao abandonar o acordo de Paris sobre o clima ou renegar o acordo nuclear com o Irã, o presidente na quarta-feira parecia estar se deliciando ao interpretar um papel que conhece bem: o de desafiar a ortodoxia política em nome das pessoas que o elegeram.

"As pessoas estão despertando para o fato de que o presidente não vê tons de cinza, não vê cores pastéis", disse Christopher Ruddy, executivo de mídia conservador e amigo de Trump. "Ele se orgulha muito por ter cumprido tantas de suas promessas de campanha, e a decisão sobre a embaixada é mais uma dessas vitórias".

LOBBY PRÓ-ISRAEL

A condução que Trump deu à questão da embaixada não foi diferente da forma pela qual ele tratou o acordo nuclear com o Irã, que ele aprovou relutantemente da primeira vez que a questão aflorou mas renegou na segunda oportunidade.

Sob uma lei aprovada em 1995, o presidente tem o dever de transferir a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém a não ser que invoque preocupações de segurança nacional para desobrigá-lo. Essa declaração de dispensa precisa ser renovada a cada seis meses. Da primeira vez que teve de fazê-lo, Trump assinou, relutantemente.

O genro do presidente, Jared Kushner, que lidera a iniciativa de paz do presidente, argumentou então que transferir a embaixada poderia prejudicar esse esforço antes que o novo governo tivesse estabelecido relacionamentos na região.

Adelson e outros simpatizantes de Israel se frustraram profundamente. Ele pressionou Trump quanto à questão em um jantar privado na Casa Branca em outubro, do qual também participaram sua mulher, Miriam, e Kushner.

O empresário também se queixou a Steve Bannon, então estrategista-chefe do presidente, que em junho havia defendido a transferência da embaixada.

Os Adelsons estão há muito entre os principais doadores a grupos que defendem causas israelenses, e estabeleceram um relacionamento estreito com Binyamin Netanyahu, o primeiro-ministro de Israel. Eles usaram a fortuna que fizeram com cassinos para pressionar o Partido Republicano e seus políticos a seguir essa linha.

No começo da campanha de Trump pela indicação presidencial republicana, ele procurou contato com os Adelson, buscando uma reunião e apoio financeiro, ainda que tivesse declarado publicamente que não queria e nem precisava de apoio dos grandes doadores a campanhas políticas.

Em março de 2016, ele procurou estabelecer suas credenciais como amigo de Israel, dizendo ao American Israel Public Affairs Committee, o mais poderoso grupo de lobby em favor de Israel nos EUA que "transferiremos a embaixada para a eterna capital do povo judeu, Jerusalém".

Os Adelson se deixaram convencer e doaram US$ 20 milhões a um comitê de ação política que apoiava a campanha de Trump, e mais US$ 1,5 milhão ao comitê que organizou a convenção republicana.

EVANGÉLICOS

Desde que Trump assumiu, Adelson vem se comunicando com ele regularmente, pelo telefone e em visitas à Casa Branca, e vinha usando seu acesso para pressionar pela transferência da embaixada, Mas ele não era o único defensor influente da medida.

Representantes de grupos cristãos evangélicos pressionaram de forma semelhante quanto à questão durante a campanha de Trump, e deixaram claro que transferir a embaixada era uma grande prioridade.

"Nas reuniões de que participei, foi comunicado claramente que os evangélicos e os cristãos que acreditam na Bíblia veem um relacionamento especial com Israel", disse Tony Perkins, presidente do Conselho de Pesquisada Família.

Quando o prazo de seis meses para renovação da dispensa voltou a se aproximar, este mês, Trump estava determinado a abrir seu leque de opções. Em 27 de novembro, ele participou da reunião de um comitê de membros importantes do Conselho de Segurança Nacional, na qual a questão da embaixada estava sendo debatida. A mensagem dele, de acordo com participantes, era a de que desejava soluções mais criativas.

Os assessores de Trump lhe ofereceram duas alternativas: renovar a declaração de que a embaixada não podia ser transferida, ou renová-la mas reconhecer Jerusalém como capital de Israel, e colocar em ação um plano para a transferência da embaixada.

Trump ponderou a decisão durante diversos dias, disseram membros de seu governo, e ligou para líderes estrangeiros e legisladores norte-americanos. Na quarta-feira, ele anunciou que adotaria a abordagem mais agressiva, voltando a assinar a declaração de dispensa mas deixando claro que a transferência aconteceria.

A decisão dele teve o apoio de Kushner e de Jason Greenblatt, o enviado especial da Casa Branca ao Oriente Médio, que concluíram que uma mudança no status quo mais ajudaria que atrapalharia seus esforços pela paz.

Embora afirmem reconhecer que a decisão causaria protestos imediatos —e poderia afastar os palestinos das negociações por algum tempo—, os dois acreditam que o processo seja firme o suficiente para resistir ao choque.

No discurso, Trump não tratou dos efeitos que sua decisão pode ter na região. Em lugar disso, a retratou como um abandono ousado das décadas de políticas fracassadas quanto a Jerusalém, que segundo ele "não nos aproximaram de um acordo de paz duradouro entre Israel e os palestinos".

"Seria insensato presumir que repetir a mesma velha fórmula produziria um resultado diferente ou melhor, agora", disse Trump.

Embora não tenha mencionado o fato, ele assinou exatamente a mesma dispensa que seus predecessores na presidência —Bill Clinton, George W. Bush e Barack Obama— para manter a embaixada em Tel Aviv por enquanto. Funcionários da Casa Branca disseram que isso era inevitável porque serão precisos anos para transferir o pessoal da embaixada a um novo edifício em Jerusalém.

Em suas declarações na Casa Branca, Trump apontou que a lei de 1995 foi aprovada por maioria esmagadora no Congresso e foi reafirmada por unanimidade pelo Senado seis meses atrás. Isso pode explicar porque a reação à decisão foi comparativamente discreta no Legislativo.

Para Trump, os benefícios políticos claramente superam os custos. O Comitê Judaico Republicano adquiriu um anúncio de página inteira publicado quinta-feira no "New York Times", que mostra Trump orando no Muro das Lamentações.

"Presidente Trump", o anúncio diz, "o senhor prometeu e o senhor cumpriu".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Crédito: Editoria de Arte/Folhapress CIDADE DIVIDIDAIsraelenses e palestinos querem cidade como capital
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