Brasil descarta ideia de ação militar na Venezuela; veja reações a artigo

IGOR GIELOW
DE SÃO PAULO

O Brasil hoje descarta a ideia de uma intervenção militar, ainda mais estrangeira, como solução para a crise institucional na Venezuela.

Comentando extraoficialmente o artigo no qual o ex-ministro Ricardo Hausmann sugere a ação, autoridades brasileiras disseram considerar a proposta sem sentido.

Crédito: Juan Barreto - 26.ago.2017/AFP Militantes chavistas aprendem a empunhar fuzis em exercício militar na Venezuela em agosto
Militantes chavistas aprendem a empunhar fuzis em exercício militar na Venezuela em agosto

Não houve, como de resto não haveria no caso de um artigo, manifestações oficiais.

A política do governo brasileiro é a de apenas participar de missões de paz autorizadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Na América Latina, a invasão multinacional de um país conflagrado só encontra algum eco, ainda que seja incomparável em termos de contexto, com um episódio ocorrido na Guerra Fria.

Em 1965, os EUA lideraram uma intervenção na República Dominicana para evitar a reinstalação de um governo esquerdista. Para dar um verniz legalista à ação, acionaram a Organização dos Estados Americanos.

Juntaram-se aos 42 mil soldados americanos tropas de seis países. O Brasil, retribuindo o apoio dos EUA ao golpe de 1964, enviou quase 4.000 homens ao longo do ano que a ação durou.

Dois anos antes, o esquerdista Juan Bosch havia sido deposto por direitistas, que acabaram sendo desalojados por militares legalistas.

Os EUA temiam uma "nova Cuba" e promoveram, após intervir, uma eleição entre Bosch e Joaquín Belaguer —que ganhou um pleito contestado e virou um autocrata.

Isso não quer dizer que a Venezuela não esteja no topo das preocupações externas do governo brasileiro.

A resiliência do regime chavista vem surpreendendo o governo, e um hipotético crescimento do movimento em prol da intervenção militar está obviamente sob observação constante.

Por ora, preocupa especialmente a área de inteligência o fluxo de refugiados venezuelanos na fronteira do país com Roraima.

O foco de uma crise humanitária maior causada pelo conflito tende ser a Colômbia, que divide uma fronteira geograficamente mais acessível com o vizinho e compartilha a mesma língua, o espanhol.

Veja abaixo outras reações ao artigo de Ricardo Haussmann

"Além da impossibilidade de se concretizar, a ideia de uma solução militar é politicamente absurda e favorece os argumentos de Nicolás Maduro para continuar em seu caminho de radicalização. A crise política só se resolve mediante uma negociação apoiada pelas potências regionais que permita a realização de eleições justas
COLETTE CAPRILES
psicóloga social e professora de teoria política na Universidade Simón Bolívar

Os países latino-americanos são radicalmente opostos ao uso da força na região, justamente por terem passado a maior parte de suas existências lidando com intervenções estrangeiras. A pior coisa que se pode fazer é apoiar uma intervenção militar no país
MATIAS SPEKTOR
professor de relações internacionais da FGV e colunista da Folha

Todas as outras vias para resolver a crise venezuelana fracassaram. Fracassou a via eleitoral, fracassou a via dos protestos e está fracassando o diálogo, então é preciso pensar o impensável. Duvido que o Brasil, em especial o atual governo, seja tão atrevido a ponto de apoiar uma ideia tão pouco convencional
CLÓVIS ROSSI
colunista da Folha

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