Veja verdades e mentiras do discurso do Estado da União de Trump

Crédito: Pablo Martinez Monsivais - 30.jan.2018/Associated Press O presidente dos EUA, Donald Trump, discursa no Congresso nesta terça (30)
O presidente dos EUA, Donald Trump, discursa no Congresso nesta terça (30)

LINDA QIU
DO "NEW YORK TIMES"

Repórteres do jornal "The New York Times" checaram os fatos do primeiro discurso sobre o Estado da União do presidente Donald Trump. Veja a avaliação das afirmações de Trump sobre a economia, a infraestrutura, a luta contra o Estado Islâmico e suas realizações no último ano.

EMPREGOS
"Desde a eleição, criamos 2,4 milhões de novos empregos, incluindo 200 mil só no setor industrial."

A matemática está certa, mas o contexto é importante. A economia ganhou cerca de 169 mil empregos por mês desde a eleição em 2016, mas isso é um pouco menos que os 185 mil empregos por mês adicionados nos sete anos anteriores.

DESEMPREGO DOS NEGROS
"O desemprego afro-americano está no nível mais baixo já registrado."

Verdade, mas precisa de contexto. É exato que o desemprego entre americanos negros foi o mais baixo já registrado, 6,8% em dezembro. Mas também foi o apogeu de uma tendência de longo prazo. Além disso, é uma pergunta em aberto quanto crédito um presidente pode reivindicar pela economia, especialmente em seu primeiro ano.

CORTE DE IMPOSTOS
"Nós aprovamos os maiores cortes de impostos e reforma fiscal na história americana."

Falso. Trump não para de fazer essa afirmação, apesar de não haver evidências em seu apoio. Os cortes fiscais assinados pelo presidente Ronald Reagan foram maiores como porcentagem da economia e por suas consequências para as receitas federais. A lei aprovada recentemente parece ficar em 12º lugar na história dos EUA, como porcentagem da economia.

INVESTIMENTO
"A Apple acaba de anunciar o plano de investir ao todo US$ 350 bilhões nos EUA e contratar mais 20 mil funcionários."

Exige contexto. A gigante tecnológica Apple de fato disse depois da aprovação do corte de imposto que "investiria" US$ 350 bilhões no país nos próximos cinco anos. Mas pelo menos US$ 275 bilhões dessa quantia eram simplesmente a continuação das tendências anteriores da empresa. A quantia de novo investimento parece ser de aproximadamente US$ 37 bilhões.

ENERGIA
"Pusemos fim à guerra à energia americana –e pusemos fim à guerra ao lindo e limpo carvão. Agora somos exportadores de energia para o mundo."

Enganoso. Ao todo, os EUA são um importador líquido de energia, embora esteja projetado para ser um exportador líquido em algum momento na década de 2020. Uma análise do governo descobriu que os EUA se tornaram um exportador líquido de gás natural em 2017 pela primeira vez desde 1957, e continua sendo um exportador líquido de carvão. Mas ainda é um importador líquido de petróleo.

Embora seja exato que Trump ordenou que a Agência de Proteção Ambiental reveja regulamentos sobre a queima de carvão, não fez quase nada para reanimar a indústria, que, segundo economistas, já estava em decadência devido à concorrência do gás natural, mais barato.

FÁBRICAS
"Muitas companhias de carros estão construindo e ampliando fábricas nos EUA –algo que não víamos há décadas."

Exagero. Sim, algumas empresas de automóveis anunciaram novas fábricas ou sua expansão sob Trump, mas isso não é inédito "há décadas". A Toyota, por exemplo, inaugurou uma fábrica no Mississípi em 2011. Não houve um aumento no emprego na indústria automotiva sob o mandato de Trump –na verdade, ele diminuiu em relação a um ano atrás.

MEDICAMENTOS
"Uma das minhas principais prioridades é reduzir o preço dos medicamentos vendidos sob prescrição. Em muitos outros países, esses remédios custam muito menos do que pagamos nos EUA, e isso é muito, muito injusto."

Verdade. Os preços de medicamentos com nomes de marca são geralmente mais altos nos EUA do que em outros países desenvolvidos, que regulam os preços ou os definem em negociações com os fabricantes. Os laboratórios se opuseram fortemente à regulação dos preços nos EUA. Drogas contra câncer e outros novos remédios às vezes entram no mercado americano com preços que superam US$ 50 mil por ano. E um grupo de empresas aumentaram os preços de alguns antigos remédios cujas patentes expiraram há anos.

ACORDOS COMERCIAIS
"Os EUA também finalmente viraram a página sobre décadas de acordos comerciais injustos que sacrificaram nossa prosperidade e levaram embora nossas empresas, nossos empregos e a riqueza do nosso país."

Exige contexto. Economistas acreditam que a perda de empregos fabris tem mais a ver com a automação e a globalização do que com acordos de comércio específicos.

A pesquisa sugere que o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte, na sigla em inglês) teve um efeito desprezível nos empregos nos EUA. E a entrada da China na Organização Mundial do Comércio em 2001 parece ter tido um impacto mais pronunciado nos empregos fabris. Enquanto Trump abandonou a Parceria Transpacífico, as negociações para reformular o Nafta estão em andamento.

BUROCRACIA
"Nós construímos o Edifício Empire State em apenas um ano –não é uma desgraça que hoje possa levar dez anos para se conseguir a aprovação de uma simples estrada?"

Parcialmente verdadeiro, mas precisa de contexto. O Edifício Empire State foi construído em pouco mais de um ano. Mas o tempo de construção não deve ser comparado com o tempo necessário para se obter uma autorização (o projeto do Empire State mudou pelo menos 15 vezes durante o planejamento e a construção). As exigências para construção e autorizações também são diferentes entre estradas e edifícios, duas peças diferentes de infraestrutura.

Trump também está exagerando o processo para construção de estradas. Enquanto alguns projetos maiores podem levar cerca de dez anos para receber autorização, pequenos projetos, como o recapeamento de estradas, podem demorar muito pouco. O tempo médio de espera variou de três a seis anos nas últimas duas décadas, segundo a Administração Federal de Rodovias.

IMIGRAÇÃO
"O terceiro pilar põe fim à loteria de vistos –programa que distribui aleatoriamente 'green cards' [vistos de residência] sem qualquer consideração por capacidade, mérito ou a segurança de nossa população."

Falso. O programa de loteria de vistos oferece 50 mil vistos de imigrante para pessoas de países com baixos índices de imigração para os EUA. Um guia de 18 páginas do Departamento de Estado diz que os candidatos devem ter educação de nível secundário ou dois anos de experiência de trabalho nos últimos cinco que exija "dois anos de treinamento ou experiência".

Os candidatos devem se submeter a um exame médico, não podem ter registro criminal e devem demonstrar que não se tornarão "despesas públicas". Os ganhadores de vistos são então submetidos a uma verificação de seu passado que pode durar meses.

ESTADO ISLÂMICO
"A coalizão para derrotar o EI libertou quase 100% do território antes detido por esse assassinos no Iraque e na Síria."

Verdade, mas precisa de contexto. Trump está certo de que o Estado Islâmico teve de abandonar a maior parte do território que ocupava –98%– no Iraque e na Síria. Mas ele está colhendo as vantagens de uma estratégia iniciada pelo governo Obama.

As forças lideradas pelos EUA já haviam recuperado mais de 33 mil km2 de território do grupo quando Trump foi eleito, em novembro de 2016. As coisas se aceleraram depois que ele deu aos comandantes americanos mais autoridade para ordenar ataques aéreos e tomar decisões no campo de batalha. Mas a derrota do califado não significa o fim do EI como movimento ou ideologia.

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.