Líderes de Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Paraguai e Peru enviaram nesta quarta-feira (26) ao Tribunal Penal Internacional (TPI) um pedido de investigação por crimes de lesa-humanidade cometidos pelo regime de Nicolás Maduro desde fevereiro de 2014 na Venezuela.
É a primeira vez que governos nacionais acionam a corte, sediada em Haia (Holanda), contra outro país signatário do Estatuto de Roma, que rege a atuação da instância. A Procuradoria do tribunal se pronunciará nesta quinta (27) sobre o documento.
Os chanceleres dos seis proponentes anunciaram o envio da correspondência ao TPI às margens da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York.
O governo brasileiro resolveu não se juntar ao pedido porque a procuradora geral já estava investigando a Venezuela, desde fevereiro, e o Itamaraty acredita que a carta poderia ser encarada como pressão política sobre ela.
A Folha apurou que o governo também entende que o fato de um Estado pedir investigação de outro abre um precedente que não é bom.
Entre as acusações listadas pelo representante argentino, Jorge Faurie, estão “detenções arbitrárias, assassinatos, execuções extrajudiciais, torturas, abusos sexuais, violações e atentados contra o devido processo”.
Algumas das vítimas são menores de idade, afirmou o ministro, para quem, se as denúncias fossem comprovadas, “ficariam claramente configurados os crimes de lesa-humanidade”.
A carta pede à procuradora-geral Fatou Bensouda que sejam investigadas acusações desde 12 de fevereiro de 2014, “para que determine se se deve acusar uma ou várias pessoas”, disse o chanceler peruano, Néstor Popolizio.
O pedido se baseia em dois informes sobre a violação de direitos humanos na Venezuela, um da OEA e outro do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU.
“Em um momento em que muitos países dão as costas à ordem internacional baseada em regras e quando o próprio TPI está sob ataque, é alentador ver e participar de um esforço para transmitir os crimes do regime de Maduro a esse órgão [à jurisdição dele]”, acrescentou a chanceler do Canadá, Chrystia Freeland.
Ela se referia às palavras duras dirigidas no começo de setembro pelo assessor de segurança nacional do governo Trump, John Bolton, à corte de Haia, que chamou de ilegítima: “Para todos os efeitos, está morta para nós”.
Bolton reagia à movimentação do tribunal para investigar supostos crimes de guerra cometidos pelos EUA no Afeganistão. Washington retirou seu apoio ao TPI em 2002, apenas dois anos depois de assinar o Estatuto de Roma.
Já há um exame preliminar em curso na corte sobre a situação na Venezuela. Essa etapa antecede a abertura de uma investigação formal e não tem prazo para terminar; pode levar alguns meses ou até anos.
A pré-apuração, anunciada pelo tribunal em fevereiro deste ano, se debruça sobre supostos crimes cometidos durante manifestações contra Maduro que deixaram mais de 120 mortos, a partir de abril de 2017.
O que se apura é o uso excessivo de força pelas tropas do governo para dispersar e reprimir manifestantes, além de detenções aleatórias e abusos cometidos contra eles durante o encarceramento.
As agressões cometidas por opositores contra forças maduristas também estão no escopo de análise da procuradoria do TPI. A carta desta quarta pede ao TPI que acelere essa investigação e apresente suas conclusões.
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