Ataques a tiros em mesquitas na Nova Zelândia deixam 51 mortos

Ação foi transmitida ao vivo por redes sociais; quatro pessoas foram presas por suspeita de envolvimento

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Serviço de emergência carrega pessoa ferida no ataque em Christchurch  
Serviço de emergência carrega pessoa ferida no ataque em Christchurch   - TVNZ/Reuters
Wellington (Nova Zelândia) e São Paulo | Reuters e AFP

Ataques a tiros em duas mesquitas na cidade de Christchurch, na Nova Zelândia, deixaram 51 mortos nesta sexta-feira (15, noite de quinta no Brasil), e ao menos 42 feridos por disparos, inclusive crianças.

O massacre foi transmitido ao vivo durante 17 minutos pelo atirador na internet, que publicou um manifesto após o ataque, no qual chamou imigrantes de "invasores".

Testemunhas afirmaram que por volta das 13h40 local (21h40 de quinta no horário de Brasília) um homem branco vestido com trajes militares invadiu a mesquita Al Noor, no centro da cidade, e começou a atirar.  Uma delas disse que o atirador era branco, loiro e usava capacete e colete à prova de balas.

Pessoas que estavam no local afirmaram que tiveram que sair correndo para escapar dos ataques, muitos descalços —é costume tirar os sapatos dentro da mesquita. Sexta-feira é quando os templos costumam estar mais cheios, por ser um dia especial de orações para os muçulmanos.

As testemunhas descreveram ao jornal local New Zealand Herald um cenário com muito sangue e com diversos corpos espalhados pelo chão.

Presente no local no momento de ataque, Ramzan Ali disse à emissora local TVNZ que viu um homem ser atingido pelos tiros. "Eu só pensava que ele precisava ficar sem balas", declarou ele. "O que eu fiz foi basicamente esperar e rezar. Deus, por favor, acabe com a munição dele."

O atirador percorreu todas as salas do local, disparando contra os frequentadores, que tentavam fugir. Mais de 200 pessoas estavam no local no momento que os tiros começaram, incluindo um time de críquete de Bangladesh, que conseguiu escapar.

 Uma delas foi Farid Ahmed, que usa cadeiras de rodas e participava da celebração no local. 

"Todo mundo estava instalado, estava tudo calmo, tranquilo, sossegado, como costuma ser. Quando o imã começa a falar, todo mundo fica em silêncio, você pode ouvir um alfinete caindo", afirmou ele à Radio  New Zealand

"Mas, de repente, começou o tiroteio. Começou no salão principal. O atirador deve ter entrado pelo corredor principal. E eu estava no salão lateral, então não vi quem estava atirando. Mas vi que algumas pessoas estavam fugindo, passando pelo cômodo onde eu estava. Também vi algumas pessoas sangrando e mancando", completou ele.  

Depois do ataque a primeira mesquita, houve tiros no centro islâmico Linwood. Não há confirmação de que um mesmo atirador tenha agido nos dois lugares. 

Na mesquita de Al Noor, 41 pessoas foram mortas. Outras sete morreram na de Linwood e uma no hospital. Pelo menos dois feridos estão em estado grave, incluindo uma criança de quatro anos. 

A polícia também encontrou explosivos em dois carros. A bomba em um deles foi detonada em segurança, e a outra segue em processo de neutralização.

Perto da meia-noite de sábado na Nova Zelândia (8h de sexta em Brasília), policiais protegiam mesquitas, hotéis e outros possíveis alvos na cidade. Todas as escolas de Christchurch fecharam as portas e toda a região central da cidade, de 404 mil habitantes, a terceira maior da Nova Zelândia, entrou em toque de recolher.

Quatro pessoas foram presas por envolvimento na ação, mas uma delas pode não ter nada a ver com o caso, segundo a polícia. Um homem, com cerca de 30 anos, foi indiciado por assassinato. Seu nome não foi revelado.

Além dele, outras duas seguem detidas pela polícia, que ainda não conseguiu determinar o envolvimento delas. 

O atirador que transmitiu as imagens online se identificou Brenton Tarrant, 28, um australiano. Ele publicou um manifesto de 74 páginas em uma rede social, no qual elenca líderes racistas americanos como seus heróis. 

No manifesto, Tarrant disse que suas motivações incluíram "criar uma atmosfera de medo" e incitar a violência contra muçulmanos. Ele descreve o ataque como um ato terrorista e disse que transmitiria a ação pela internet. 

Transmissão ao vivo

Um vídeo, transmitido ao vivo pelo Facebook durante o ataque, mostra Tarrant carregando um fuzil em um carro. Enquanto isso, ouvia uma canção chamada "Serbia Strong" (Sérvia Forte, em tradução livre), um cântico nacionalista que louva Radovan Karadzic, ex-presidente da Sérvia condenado por crimes de guerra e contra a humanidade devido ao massacre de Srebrenica, na Bósnia, em 1995.

Em determinado momento, ele chega até uma mesquita, entra no local e começa a atirar contra os frequentadores. Mesmo após matar muitas pessoas, o atirador volta a disparar contra os corpos no chão.  A câmera, colocada no capacete, emula a visão de games de tiro.​

A AFP estabeleceu a autenticidade do vídeo por meio de uma investigação digital, comparando as capturas de tela das imagens do atirador mostrando a mesquita com várias imagens da mesma área disponíveis na internet.

Mapa mostra a localização de Christchurch, Nova Zelândia
Mapa mostra a localização de Christchurch, Nova Zelândia - Reprodução/Google

As autoridades neozelandesas criticaram a divulgação das imagens, que seguiam disponíveis em redes sociais horas após o ocorrido. Facebook, Google e Twitter disseram que estão trabalhando para remover o material, mas foram questionadas pela demora em tomar providências. A polícia pediu aos usuários para não compartilharem esse tipo de conteúdo.

A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, afirmou que o episódio é um dos mais sombrios da história do país. "Claramente o que aconteceu aqui é um ato impressionante e sem precedentes de violência”, afirmou em entrevista coletiva. Ela classificou o ato como terrorista.

Ela não quis comentar se a ação poderia ser considerada um crime de ódio. Segundo a primeira-ministra, “muitas das pessoas diretamente afetadas pelo ataque podem ser imigrantes, podem ser refugiados, eles escolheram fazer da Nova Zelândia sua casa”.

Casos semelhantes são pouco comuns no país. O último massacre a tiros que se tem registro na Nova Zelândia aconteceu em 1990, quando 13 pessoas foram mortas por um atirador, incluindo duas crianças. O ataque ocorreu após uma briga de vizinhos. 

Mesquitas se tornaram alvo de ataques em diversos países recentemente. Em junho de 2017, um homem foi morto e dez ficaram feridos quando uma van avançou sobre um grupo que estava em uma mesquita no norte de Londres. 

O manifesto do atirador cita Darren Osbourne, numa referência ao nome de um terrorista que atacou a mesquita em Londres e cumpre prisão perpétua, e também o assassino em massa norueguês Anders Behring Breivik, terrorista de extrema-direita que realizou ataques em 2011 que deixaram 77 mortos. 

Na Nova Zelândia, a venda de armas é liberada para maiores de 16 anos e não há registro dos armamentos.

O número de mortos no massacre, 51, é maior do que a soma do total de assassinatos no país ao longo de um ano inteiro. Em 2017, houve 35 homicídios em todo a Nova Zelândia, que tem 4,7 milhões de pessoas. Neste século, o ano com mais assassinatos no país foi 2009, com 68 casos.

Como comparação, o Brasil teve 63.880 mortes violentas em 2017. O país tem 209 milhões de habitantes. 

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