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23/09/2010 - 18h02

Cuba procura saída à la China para resolver situação socioeconômica, diz jornalista; leia íntegra do bate-papo

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DE SÃO PAULO

A jornalista Laura Capriglione, repórter especial da Folha, participou de bate-papo nesta quinta-feira (23) sobre as mudanças sociais e econômicas em Cuba. Ela viajou ao país para uma série de reportagens para o jornal.

Folhapress
A jornalista Laura Capriglione é repórter especial da *Folha*
A jornalista Laura Capriglione é repórter especial da Folha

No último dia 13, o governo cubano anunciou o corte de pelo menos meio milhão de funcionários públicos até o começo do ano que vem, e a redução as restrições a empreendimentos privados para ajudá-los a encontrar novos empregos. É a medida mais dramática já anunciada no governo de Raúl Castro para atenuar a grave situação econômica que enfrenta a ilha.

Participaram do chat 214 pessoas. Veja a agenda de bate-papo do UOL.

O texto abaixo reproduz exatamente a maneira como os participantes digitaram suas perguntas e respostas.

*

Bem-vindo ao Bate-papo com Convidados do UOL. Converse agora com Laura Capriglione sobre a situação socioeconômica de Cuba. Para enviar sua pergunta, selecione o nome do convidado no menu de participantes. É o primeiro da lista.

(04:55:56) Laura: olá!!!

(05:00:36) Laura: tô aqui

(05:00:36) aloisio fala para Laura: Num exercício de futurologia, o que irá acontecer com Cuba, no dia seguinte da morte de Fidel Castro?

(05:02:09) Laura: aloisio, Cuba já se está acostumando à vida sem Fidel, desde que ele se afastou, em 2006, por problemas de saúde. hoje em dia, sua presença na vida cubana acontece pelos artigos no jornal Granma. É pouco, quase nada

(05:02:38) marcelo zelic fala para Laura: qual a relação do que se passa em cuba e o bloqueio economico?

(05:04:50) Laura: marcelo, Cuba e bloqueio econômico são praticamente sinônimos. Os Estados Unidos eram o principal cliente de Cuba até a revolução, em 59. Com a vitória dos guerrilheiros, a URSS e os países da Europa do Leste substituíram os vizinho do norte. Mas a queda do Muro de Berlim deixou Cuba com uma mão na frente e outra atrás.

(05:04:54) Capittu fala para Laura: Há possibilidade de democratização em Cuba?

(05:07:23) Laura: Cuba é um Estado auto-definido por sua Constituição como socialista. Lá, a ditadura do proletariado (termo cunhado por Lênin) só se encerraria se houvesse uma grande mobilização popular, como a que aconteceu na Europa do Leste. E não há nada parecido com isso na ilha.

(05:07:38) lulu fala para Laura: como vc avalia o governo de Raul Castro?

(05:09:50) Laura: Lulu: O governo de Raul Castro já se iniciou, em 2008, grande ele assumiu plenipotenciário, sob o lema da liberalização da economia. As mudanças no regime de trabalho, agora, com a permissão para um cubano trabalhar por conta própria e até contratar outros cubanos (algo que era proibido) são apenas um aprofundamento dessa liberalização econômica

(05:10:02) rodrigo fala para Laura: Qual será o impacto social da demissão dos 500 mil trabalhadores anunciado pelo governo? O país dará conta de reabsorver essa mão-de-obra?

(05:12:21) Laura: Rodrigo, já existe um imenso setor informal (quer dizer, ilegal, segundo as leis atuais do país). É gente que trabalha principalmente com turismo, recebe em moedas fortes e não com o enfraquecido pelo cubano, e quer se estabelecer autonomamente. Basicamente, seriam esses "empreendedores" que seriam os primeiros a serem demitidos. Resta saber se o turismo conseguirá absorver uma massa tão grande de gente

(05:12:26) BSB fala para Laura: Laura, sinceramente, você pensa que a maioria das pessoas em Cuba vivam mal? Faltam produtos? Tem racionamento? Como é a vida de um cubano?

(05:15:10) Laura: BSB, falta, sim, muita coisa. Faltam remédios (os laboratórios americanos não podem vender para Cuba, nem por meio de suas filiais em outros países). Faltam alimentos (a agricultura cubana é uma crise só). Falta vidro (incrível). Faltam casas (vc vai na igreja matriz de Havana e os pedidos para a Virgencita é feito por "casinhas" de madeira).

(05:15:50) El Nina fala para Laura: Com a queda do muro de Berlim, muitos alemães da parte socialista sentiram-se desamparados, sem emprego, sem garantias de sobrevivencia que o estado fornecia, Cuba democratizando a população não passaria pelo mesmo problema? sem a mãe pátria a fornecer o básico?

(05:16:42) Laura: BSB, mas os cubanos em geral não se desesperam. Não há violência social, não há delinquência. E os cubanos são um povo muito educado e alegre.

(05:17:18) marcos fala para Laura: Laura, diga com sinceridade: o povo cubano ama Fidel?

(05:20:16) Laura: El Nina, o que Cuba está tentando fazer é uma saída à la China ou Vietnã. Ou seja, em vez de deixar o regime apodrecer até desabar (como aconteceu na Europa do Leste), pretende-se abrir o país para pequenos empreendimentos que criem uma economia alternativa à estatal. É uma inovação que traz muitos riscos, mas eles não tem alternativa.

(05:20:39) Guilherme_RJ fala para Laura: Existem pessoas ricas em Cuba? Quem pode ser considerada a "elite" do país, se é que ela existe?

(05:23:36) Laura: Marcos, os mais velhos, principalmente, tem uma espécie de adoração por Fidel. Não se pode esquecer que o regime de Fulgencio Batista, que foi derrubado pela revolução, era conhecido por sua crueldade e indiferença ao sofrimento do povo. A revolução cubana, particularmente em seus primeiros anos, trouxe um grande salto em termos de qualidade de vida. Mas os jovens não conhecem essa história toda e adoram os Estados Unidos (camisetas American Eagle são um must em Havana)

(05:23:36) brasileiro fala para Laura: E a saúde,educação continua sendo de boa qualidade para população?

(05:25:44) Laura: Guilherme_RJ, sim, existem pessoas obviamente mais afluentes em Cuba. "Ricos", eu não diria, porque não podem ter propriedades. Afluentes, sim, porque podem viajar para fora, comprar televisões de LCD e computadores. São principalmente atletas e músicos --setores em que os cubanos são mesmo muito bons

(05:26:02) megadeth fala para Laura: Se o governo cubano implantar o capitalismo qual seria o impacto disso sobre o caribe?

(05:27:50) Laura: brasileiro, a saúde e a educação em cuba ganham reconhecimento por suas qualidades em qualquer ranking que se refira a países em desenvolvimento. Sim, ainda são muito boas. Fui de surpresa à escola especial República do Vietnã, no centro de Havana, e é sensacional a forma como eles tratam alunos com dificuldades de aprendizado, em uma escola moderna e aberta.

(05:28:02) Carlos fala para Laura: O governo cubano nunca admitirá que o socialismo fracassou?

(05:29:54) Laura: Megadeth, o governo cubano nem cogita implantar o capitalismo tal como o conhecemos aqui. Mas não se descarta uma trajetória de capitalismo estatal, nos moldes do que se fez na China. Ainda assim, sob controle dos burocratas do Partido Comunista Cubano.

(05:32:23) Laura: Carlos, recentemente Fidel concedeu uma entrevista à revista "Atlantic" em que, sim, admitiu que o regime cubano estava em dificuldades. Depois, ele desdisse o que disse, mas os anúncios de liberalização da economia, que vieram logo depois, parecem confirmar a veracidade da entrevista

(05:32:53) marcos fala para Laura: Laura, na sua percepção, o que o povo cubano acha do governo Lula?

(05:35:31) Laura: É claro que há os que acham que Lula deveria ser mais duro com o regime cubano na questão dos presos políticos, mas a população em geral tem por Lula uma gratidão muito grande pelos esforços que seu governo vem fazendo para pôr fim ao embargo econômico. Além disso, o Brasil está ajudando a construir um novo porto no país e tem vários acordos comerciais. Os cubanos, claro, gostam desse apoio.

(05:35:37) Araújo fala para Laura: Ainda está longe o dia em que vai haver eleições gerais por lá?

(05:38:00) Laura: Araújo, eleições Cuba tem o tempo todo. Eles elegem o Conselho de Defesa da Revolução, os representantes das assembléias municipais etc. O que não tem em Cuba são eleições diretas para presidente. Como eu disse antes, isso não virá por iniciativa própria do regime, mas sim por exigência da população, o que não ocorre hoje (nem remotamente)

(05:38:00) theo fala para Laura: Laura, o acesso a informação em cuba, como é? Há internet totalmente liberada?

(05:38:02) Laura: Theo, Cuba tem os jornais controlados pelo Estado, como o Granma (do Comitê Central do PC), o Juventud Rebelde, o Trabajadores (da Central dos Trabalhadores Cubanos), além de revistas, como "La Calle", dos Comitês de Defesa da Revolução, etc. Mas não há imprensa de proprietários particulares, como temos aqui. A internet é caríssima. Basicamente, está nos hotéis, em poucas lan houses e nas universidades. Os cubanos participam de comunidades na rede, escrevendo tudo offline, e plugando-se só para transmitir e baixar aquivos. Pen drive é obrigatório.

(05:42:18) Carlos fala para Laura: Os jovens em Cuba veem Fidel como ditador ou herói?

(05:45:29) Laura: Os jovens estão entre dois mundos: o de seus pais, com toda a idolatria por Fidel e pela Revolução, e o dos exilados cubanos, que lhes falam de um outro mundo. Naturalmente, por isso, eles têm uma relação ambígua com o maior nome de Cuba. Não se ouve, por parte de jovens com quem conversei, um juízo radicalizado pró ou contra.

(05:45:41) marcos fala para Laura: Laura, como é a vida noturna em Havana?

(05:46:59) Laura: Marcos, me desculpe, mas eu não tive tempo para me aprofundar nesse lado da vida. Fica para a próxima vez. (Tomara! rsrsrs)

(05:47:05) Cientista Social fala para Laura: Como está se comportando a imprensa cubana frente as mudanças introduzidas em Cuba?

(05:48:23) Laura: Cientista Social, a imprensa cubana é porta-voz do governo, do PC e dos chamados "interesses da revolução". Por isso, não será por ela que se encontrarão as vozes dissonantes.

(05:48:23) guevara fala para Laura: Laura, Fidl e Raul estão em idade avançada, quais são os nomes mais influentes da politica de Cuba que podem substitui-los?

(05:51:09) Laura: Guevara, este é um grande problema do PC Cubano. Queira-se ou não, Fidel e Raul são portadores de toda a mística da revolução. Faz tempo que o PC tenta colocar no Bureau Político quadros mais jovens. Entretanto, são apenas burocratas partidários, e não lideranças políticas reconhecidas no país. É um drama nacional.

(05:51:09) Guilherme_RJ fala para Laura: Como os cubanos veem Che Guevara? Ele entrou na cultura "pop", a exemplo de outros países?

(05:53:36) Laura: Guilherme_RJ, Che é o cara em Cuba também. Vi muitos jovens namorando no Malecón (a avenida à beira mar de Havana)com tatuagens no braço com a cara do Che. Ele é pop lá também.

(05:54:06) ygalves pergunta para Laura: Na década de 60 e 70 o regime cubano era visto como uma alternativa à democracia liberal, e com a queda do muro ficou à margem e em parte concebido de forma caricatural. Os avanços econômicos da China, um modelo paulatinamente adquirido por Cuba, pode servir de possibilidade para o socialismo retornar ao seu posto de vanguarda no pensamento político crítico?

(05:57:10) Laura: Ygalves, eu não vejo muito essa hipótese, não. Também não vejo essa possibilidade para a China, que pode ser uma potência econômica, mas não é e nem será "vanguarda no pensamento político crítico" (cá entre nós, nem os chineses esperam por isso em seu pragmatismo atroz)

(05:57:28) LucianoSC fala para Laura: Laura, vc vê relações entre o processo revolucionário venezuelano e as mudanças em Cuba? A Venezuela sonhada por Chavez pode ser considerada como uma continuação do processo cubano?

(06:00:26) Laura: LucianoSC, eu acho que a Venezuela de Chávez era muito importante para os cubanos, primeiro por causa do apoio político e depois por causa do petróleo (que Chávez exportava para lá na base da amizade). Agora, com as dificuldades na Venezuela (vide eleições), Cuba sabe que não poderá contar tanto com o amigo bolivariano. Terá de se virar por conta própria.

(06:01:08) Laura: Pessoal, obrigada pelas perguntas inteligentes. Espero que tenham gostado. Um abração!

(06:01:20) Moderadora UOL: O Bate-papo UOL agradece a presença de Laura Capriglione e de todos os internautas. Até o próximo!

 

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