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Medvedev se afasta de Putin às vésperas de ano eleitoral
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IGNACIO ORTEGA
DA EFE
O presidente russo, Dmitri Medvedev, precisou de quase três anos no poder para deixar sua marca como líder nacional, mas o afastamento ideológico de seu padrinho político, Vladimir Putin, é cada vez mais evidente.
Em uma entrevista aos principais canais de televisão russos, Medvedev discordou do primeiro-ministro em dois dos principais assuntos da agenda nacional: a oposição não parlamentar e o controvertido julgamento contra o magnata Mikhail Khodorkovsky.
"A conhecida como oposição antissistêmica se encontra fora do sistema político porque não se vê dentro dele", declarou Medvedev na sexta-feira, em referência à presença de apenas quatro partidos, dois deles governistas, no âmbito parlamentar da Rússia.
Medvedev rompeu tabus ao mencionar os líderes da oposição radical ao Kremlin como políticos que contam com certo respaldo entre a população, embora as emissoras de televisão próximas ao Kremlin ignorem suas atividades há anos.
O líder citou expressamente os nomes do ex-primeiro-ministro Mikhail Kasyanov, do ex-vice-primeiro-ministro Boris Nemtsov, do campeão mundial de xadrez Garry Kasparov e do líder do proscrito Partido Nacional Bolchevique Eduard Limonov.
Nesta semana, Nemtsov e outros líderes, que recentemente criaram um novo partido opositor ao Kremlin, processaram Putin na Justiça por calúnia.
"Apresentamos uma denúncia porque o primeiro-ministro (...) nos acusou de, junto a (o empresário exilado Boris) Berezovsky, termos roubado bilhões da Rússia. Isso é mentira e calúnia", afirmou Nemtsov à agência "Interfax".
Ao responder na semana passada ao vivo às perguntas dos russos pela televisão, Putin questionou-se: "O que querem Nemtsov, Rijkov, Milov e outros? Dinheiro e poder. O que mais vão querer?".
O primeiro-ministro disse que, após a dissolução da antiga União Soviética, em 1991, "foram levados não poucos bilhões" por Berezovsky e magnatas "que agora se encontram na prisão".
"Acabou o dinheiro deles e agora querem voltar e encher os bolsos", afirmou Putin. Segundo o premiê, se eles voltassem ao poder, "venderiam a Rússia inteira".
Putin costuma acusar os liberais pelas fraudulentas privatizações realizadas no final do século XX para defender sua gestão, na qual vários dos oligarcas caíram em desgraça e os principais ativos do país retornaram às mãos do Estado.
Entre esses oligarcas está Khodorkovsky, que pode ser condenado na segunda-feira a vários anos de prisão no segundo julgamento aberto contra ele por roubo de petróleo e lavagem de dinheiro.
"Nem o presidente nem outro funcionário têm o direito de expressar sua postura até o momento que se anuncie o veredicto", enfatizou Medvedev.
Ocorre que, uma semana antes, Putin disse que, nos EUA, Khodorkovsky seria condenado a 150 anos, tal como foi o investidor nova-iorquino Bernard Madoff, o que lhe valeu inúmeras críticas por exercer pressão sobre os tribunais.
"Os crimes cometidos por Khodorkovsky foram demonstrados nos tribunais. O ladrão deve estar na prisão. Khodorkovsky é acusado de roubo e desvio, (...) falamos de centenas de bilhões de rublos", declarou Putin.
O primeiro-ministro acusa Khodorkovsky de ter a consciência manchada de sangue, já que o chefe de segurança de sua petrolífera Yukos é acusado de vários assassinatos.
Medvedev, por sua vez, criticou o partido governista Rússia Unida --liderado por Putin e que é comparado ao Partido Comunista da União Soviética-- por, segundo ele, se acomodar no poder, promover a corrupção e contribuir para a estagnação do sistema político que marginaliza os pequenos partidos.
Em seus primeiros dois anos à frente do Kremlin, o talante liberal de Medvedev não se traduziu em decisões políticas que desafiassem o modelo forjado por Putin, mas as coisas mudaram há algum tempo.
Nos últimos meses, Medvedev fez algo que Putin nunca se atreveu a fazer: destituir à força ou de mútuo acordo os barões regionais mais veteranos do país, como o poderoso prefeito de Moscou, que tinham transformado seus territórios em alvos de coronelismo.
O atual presidente também foi muito mais enérgico ao criticar o assédio contra opositores, jornalistas e ativistas e a negligência policial na onda de ataques xenófobos por parte de grupos ultranacionalistas.
Embora ainda não se saiba se Medvedev vai tentar se reeleger, o líder, durante a entrevista aos canais de televisão, criticou-os por exercerem censura e divulgarem uma imagem da Rússia muito diferente àquela mostrada pelos diários digitais.
Isso representa uma aberta crítica contra o sistema de flutuação da gestão de Putin, que criou nos últimos dez anos uma rede de meios de comunicação acríticos, que mantêm os cidadãos russos afastados da realidade.
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