Mesmo em tempos de crise, setor de serviços cresce em São Paulo e amplia opções
Veridiana Scapelli/Folhapress | ||
Um dos grandes compositores brasileiros, autor de canções como "Tereza da Praia", o paraense Billy Blanco (1924-2011) lançou em 1974 "Sinfonia Paulistana", com 14 músicas em homenagem à cidade. Entre elas, estava "Amanhecendo", do célebre refrão "Vambora, vambora, olha a hora".
Outra era "O Céu de São Paulo", que tinha o seguinte trecho: "A cor diferente / Do céu de São Paulo / Não é da garoa / É véu de fumaça / Que passa, que voa / Na guerra paulista / Das mil chaminés!"
As "mil chaminés" de Billy Blanco representavam a pujança da indústria. Pois as fábricas começaram a deixar a cidade de São Paulo justamente na década em que a "Sinfonia" foi composta.
Nos anos 1970, em busca de benefícios fiscais, as grandes indústrias passaram a trocar a capital por outras cidades do Estado, especialmente na Grande São Paulo.
Nessa transição, também pesou o preço dos terrenos, em geral mais baixo fora da maior metrópole do país.
Gradualmente, o setor de serviços passou a ocupar essa lacuna deixada pelas indústrias. Estabelecimentos que já existiam havia décadas —hospitais, maternidades, farmácias, lojas de departamentos, lojas de construção, escolas de idiomas, lavanderias, postos de gasolina— se fortaleceram com o passar dos anos.
Outras frentes se abriram graças ao avanço da tecnologia, como os aplicativos de banco e de transporte e os pedágios eletrônicos. As 11 áreas citadas e outras 21 fazem parte desta edição especial da sãopaulo, dedicada ao setor de serviços.
Ao longo das últimas quatro décadas, essa fatia da economia apresentou avanço no mercado paulistano.
Pesquisa da Fecomercio-SP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de SP) mostra que o faturamento do setor cresceu 1,6% em março de 2017 em comparação com o mesmo período do ano passado. Em tempos de severa crise econômica, é um resultado surpreendente. Foram R$ 20,3 bilhões de faturamento, R$ 324 milhões acima do valor registrado em março de 2016.
"O crescimento da área de serviços em São Paulo tende a continuar. Os moradores precisam cada vez mais desses segmentos. Mas não só. Como polo econômico, a cidade atrai gente de todo o país", afirma Kelly Carvalho, assessora econômica da Fecomercio-SP. Entre as áreas que compõem esse universo dos serviços, a saúde particular é a que obteve alta mais expressiva. O faturamento subiu 13,3% nesse período.
"Muitas pessoas anteciparam as consultas médicas e os exames com receio de ficarem desempregadas em meio à recessão no país", avalia Kelly Carvalho.
A assessora econômica aponta ainda outros dois fatores para explicar o crescimento dos serviços de saúde privada. De acordo com ela, pesaram também os reajustes de preços nesse segmento ao longo dos últimos meses e a abertura de clínicas particulares voltadas ao atendimento da população mais pobre nos bairros periféricos.
ENSINO SUPERIOR
A Fecomercio-SP não é a única instituição que identifica essa ascensão do setor de serviços na economia paulistana. A Fundação Seade realizou pesquisa em 3.000 domicílios de 39 cidades da Grande São Paulo, abrangendo os três primeiros meses de 2017.
Levando em conta só a capital, o levantamento mostra que 63,2% do total de ocupados trabalham nesse setor. São 5,4 milhões de pessoas. Em 2011, considerando o mesmo período, o ramo foi responsável por 59%.
Nesse intervalo, sempre na cidade de São Paulo, a participação dos ocupados na indústria de transformação caiu de 15,4% para 11,3%. Na construção, houve um recuo de 6,7% para 5,8%. Além dos serviços, o comércio também registrou alta entre 2011 e 2017, segundo o levantamento da fundação. Mas a evolução foi menor: de 17,9% para 18,8%.
A presença maciça do ensino superior na capital paulista é um dos aspectos destacados por Alexandre Loloian, coordenador da Pesquisa de Emprego e Desemprego do Seade, para explicar o vigor do filão dos serviços.
De acordo com o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), existiam na cidade 147 instituições (universidades e faculdades) em 2013.
"Há formas de serviço mais sofisticadas, como as consultorias, que exigem bastante capacitação. Como reúne muitas universidades, São Paulo leva vantagem em relação a outros centros", afirma Loloian.
As músicas de Billy Blanco serviram como uma bem-sucedida síntese da economia e dos costumes da São Paulo do século 20.
A capital dos serviços, que se consolida neste início do século 21, aguarda uma nova sinfonia para homenageá-la.