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22/09/2012 - 03h30

Marcelo Leite: Norte

Nosso inverno extravagante termina hoje, minutos antes do meio-dia. O equinócio, data em que noite e dia têm a mesma duração (12 horas), marca também o fim do verão no hemisfério Norte --um verão para entrar na história.

Seis dias atrás, o oceano Ártico alcançou um recorde notado por pouca gente. A calota de gelo que flutua sobre ele, na região do polo Norte, encolheu para a menor área já registrada: 3,4 milhões de km² (para comparar, o território do Brasil tem 8,5 milhões de km²).

Parece uma vastidão de gelo, mas isso é relativo. São 760 mil km² menos que no recorde anterior, medido por satélite em 2007 (as medições começaram em 1979). Nas duas primeiras décadas, a média da cobertura mínima era da ordem de 7 milhões de km².

Todos os anos a calota polar se expande e se contrai. São fortes os indícios, no entanto, de uma tendência para sobrar cada vez menos gelo. Confira os gráficos da Universidade do Colorado (EUA) em nsidc.org/arcticseaicenews.

Essa tendência foi prevista por sucessivos relatórios do vilipendiado IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima), nos quais se apontava que o aquecimento global seria mais rápido e intenso no hemisfério Norte. Só que as projeções do IPCC indicavam um Ártico livre de gelo no verão ali por 2100, e agora parece cada vez mais provável que esse evento descomunal ocorra já nesta década.

Por trás da aparente aceleração estaria o "feedback positivo" temido por climatologistas, ou seja, uma tendência que se realimenta de si própria --uma reação em cadeia.

Menos gelo significa uma área menor de superfície branca para refletir a luz do sol, radiação que passa a ser absorvida pela água escura. Mais quente, o oceano forma menos gelo, e assim por diante.

Para as empresas de carga, é uma dádiva. Abrem-se rotas de navegação que encurtariam em até 40% o trajeto entre portos europeus e asiáticos, como a mítica passagem Noroeste, em busca da qual pereceu, no Ártico canadense, o explorador britânico John Franklin (1786-1847) --revivido no grande romance histórico "A Descoberta da Lentidão" (1983), do alemão Sten Nadolny.

Neste verão ficou livre a passagem Norte, ao longo da Rússia. Estima-se que 1,5 milhão de toneladas de carga tenham circulado por ali; em 2020, poderão ser 64 milhões. Os que prestam atenção nas mudanças do Norte o fazem por esse prisma --o das oportunidades.

Há outro, porém, menos reconfortante: um Ártico sem gelo tumultuaria o clima no hemisfério Norte. Paradoxalmente, prevê-se que seus invernos fiquem mais rigorosos.

Por isso, se lá por dezembro ou janeiro caírem nevascas gigantes na Europa ou nos EUA, fique esperto com os murmúrios de que o aquecimento global é pura farsa. Pode ser só um truque para desnorteá-lo.

MARCELO LEITE é editor de "Opinião"

 

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