Eduardo Cunha
Somos todos Câmara
O editorial "Desconcerto", publicado pela Folha nesta quinta (6), contém críticas e ilações que ultrapassam a razoabilidade e a boa-fé.
Apesar de declarar publicamente a minha mudança de alinhamento político em relação ao governo federal, sempre afirmei que se trata de posição pessoal, que não influencia a institucionalidade do cargo de presidente da Câmara Federal, garantindo a preservação da harmonia entre os Poderes.
Não sou ativador de "pautas-bomba". Aliás, publicamente, por várias vezes as refutei. A Folha inclusive registrou minha posição contrária à aprovação pela Câmara dos Deputados de reajuste das aposentadorias pelo mesmo índice de correção do salário mínimo.
Veridiana Scarpelli | ||
As pautas são elaboradas pelo colégio de líderes e, no caso específico da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 443, foi definida como prioritária para o mês de agosto de forma unânime.
Na terça (4), a maioria dos líderes assinou requerimento solicitando adiamento da votação para o dia 25 deste mês. Ao submeter o requerimento à votação do plenário, as bancadas não acompanharam a orientação e impuseram derrota ao governo por 99 votos de diferença.
Depois de o requerimento ter sido rejeitado, suspendi a sessão e tentei um acordo com líderes em reunião extraordinária, sem sucesso. Adiei a votação para o dia seguinte, precedida de outra negociação pela manhã.
Busquei novo entendimento pela manhã, e o governo optou por colocar mais assuntos na PEC, incendiando ainda mais a matéria. Diante do quadro, assumi publicamente que não pautaria a votação da proposta em segundo turno antes da aprovação e promulgação da PEC 172, que impede a imposição de despesas aos entes federados sem a definição das respectivas receitas.
A discussão foi adiante e na madrugada desta quinta-feira procurei, mais uma vez, adiar a votação do substitutivo da PEC 443 para terça-feira (11), mas o plenário rejeitou de forma veemente a sugestão, permitindo apenas resguardar os destaques para a próxima terça.
O texto foi votado e obteve 445 votos a favor –sendo 59 deles do PT e 13 do PC do B–, e a mesma Folha que noticiou corretamente o andamento da votação em reportagem na página A5 se contradisse na página A3 ao me atacar em editorial.
Dizer que o presidente da Câmara possui tal poder de intervenção a ponto de fazer as bancadas não seguirem seus líderes é dizer, também, que 445 dos 513 deputados me seguem, incluindo os do PT. A argumentação beira o ridículo de tão impossível. Não existe "Câmara de Cunha". O que existe é uma Câmara independente, na qual a maioria exerce a vontade de seus representados por meio do voto.
Não compactuo com irresponsabilidades no exercício da independência dos Poderes nem na submissão à vontade de corporações que usam a Constituição Federal como refúgio a vetos de aumentos salariais, mas não sou o dono dos votos. Aliás, por disposição regimental, nem sequer exerci o meu.
Por fim, jamais aceitarei a insistente tentativa de me imputar o papel de conspirador pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. Na mesma edição desta quinta, a Folha noticiou, sem tanto alarde, a realização de reunião de outros parlamentares, supostamente para tratar do assunto.
Tenho afirmado reiteradamente que o impeachment não é recurso eleitoral de quem perde as eleições, mas um grave instrumento jurídico a ser utilizado em situações muito específicas, sob o risco de abalar alicerces democráticos que demoramos muito a construir.
EDUARDO CUNHA, 56, deputado federal pelo PMDB-RJ, é presidente da Câmara dos Deputados
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