editorial
A saúde da medicina
O termo "corporativismo" costuma implicar uma conotação negativa, mas nem sempre a defesa de uma determinada categoria conflita com o interesse geral. Existe coincidência, por exemplo, no caso da luta por meios que possam melhorar o ensino de medicina.
O despreparo do médico recém-formado tem consequências óbvias para a saúde individual e pública. Resistir a exigências para aprimorar a qualificação oferecida nas faculdades só beneficia as instituições que negligenciam a obrigação de diplomar profissionais de fato qualificados a exercer esse ofício.
Na vanguarda do aperfeiçoamento da formação do médico está, entre outras entidades, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp). O órgão instituiu há uma década exame de proficiência que em 2012 se tornou precondição para receber o registro profissional –qualquer que seja a nota obtida, cabe assinalar.
A prova do Cremesp favorece o interesse público na medida em que escancara o descalabro: foram reprovados 55% dos 2.891 formandos paulistas em 2014, por exemplo. Ou seja, tornaram-se médicos 1.589 formandos que nem conseguiram obter nota 6 no exame.
Dada essa situação calamitosa, o passo lógico, à luz do interesse público, seria condicionar o registro a um desempenho mínimo no teste –como defende esta Folha. Contra essa providência de saneamento se levanta, entretanto, o Conselho Federal de Medicina com a resolução 2.130/2015, de 15 de dezembro.
A decisão proíbe os conselhos regionais de "implementar exames de proficiência para avaliação de egressos dos cursos de medicina, em caráter obrigatório ou coercitivo, como exigência para registro ou inscrição do profissional médico". É um desserviço à melhor administração da saúde.
Tudo sugere que se trata de reação, tardia e fadada a fracassar, à crescente aceitação do exame do Cremesp. Além de ser aprovado por 94% da população paulista, auscultada em pesquisa Datafolha para a Associação Paulista de Medicina, o certificado de realização da prova passou a ser exigido por vários programas de residência médica e concursos públicos.
As estatísticas do Cremesp revelam também que o índice de reprovação é ainda maior (65%) entre escolas médicas particulares. O Conselho Federal de Medicina, ao que parece, está mais inclinado a defender os interesses dos donos das faculdades do que os dos pacientes de seus associados.
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