editorial
Caixa-preta explosiva
São pouco convincentes as justificativas do Ministério da Defesa, sob o comando de Raul Jungmann, para manter o sigilo de documentos sobre vendas de armamentos de guerra do Brasil ao exterior.
A solicitação negada, feita pela reportagem desta Folha sob guarida da Lei de Acesso à Informação, se refere a documentos de 2003 a 2005, no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na essência, trata-se do mesmo pedido feito por este jornal em 2012 e então aprovado pelo ministério. Havia ali informações de grande interesse público, principalmente a de que o Brasil vendeu, em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), US$ 5,8 milhões em bombas de fragmentação e incendiárias ao Zimbábue, no governo do ditador Robert Mugabe.
Agora, no entanto, o ministério alega que a documentação está em sigilo por prazo indeterminado por incluir "segredo comercial/industrial" garantido na legislação. Alega, ainda, que se trata de informação ligada à segurança da sociedade e do Estado, protegida pela Constituição.
Toda a legislação mencionada, porém, já estava em vigor em 2012. Além disso, o ministério afronta a Lei de Acesso ao não especificar, em sua página na rede, uma série de informações sobre os documentos mantidos em sigilo, como o assunto do texto e a identificação da autoridade que o classificou.
Ao voltar atrás e manter em segredo a comercialização de material bélico, o ministério impede o monitoramento, pela sociedade civil, de transações moralmente indefensáveis, como a realizada com o regime de Mugabe.
Para além de municiar uma feroz ditadura, o tipo de armamento vendido ao Zimbábue já foi banido em mais de cem países (o Brasil não é signatário do tratado correspondente) por representar grave ameaça a populações civis –as bombas de fragmentação lançam centenas de projéteis em áreas equivalentes a até três campos de futebol.
Por manter essa opacidade, o Brasil amargou o último lugar em ranking da Transparência Internacional que mede o risco de corrupção no setor de defesa.
O levantamento, que avalia os mecanismos de fiscalização sobre a área militar em cada país, coloca o Brasil no mesmo nível de China e Arábia Saudita, ambos os países sob regimes autoritários. Todos os três foram classificados como de "risco muito alto" para corrupção por carecer de supervisão eficaz.
O danoso episódio de venda de armas ao Zimbábue deveria ter aperfeiçoado os mecanismos de controle desse comércio no Brasil. O ministro Jungmann, no entanto, prefere manter tais relações na completa escuridão.
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