Editorial
Fazenda de cliques
Todo sistema de medição que sirva de base para a concessão de recompensas está fadado a se tornar objeto de tentativas de fraude. Não poderia ser diferente com as chamadas redes sociais.
É notório que o fenômeno distorce, por exemplo, as provas padronizadas de avaliação escolar. Não é raro que elas engendrem desvios no ensino, na direção do treinamento específico para sair-se bem naquele tipo de exame.
A popularidade de um perfil pessoal, de um canal de vídeo ou de um blogueiro se mede pela quantidade de cliques (acessos), curtidas (endossos) e compartilhamentos (reprodução do conteúdo). Além da possível satisfação pessoal, essas cifras também podem proporcionar recompensa pecuniária, na forma de publicidade paga.
Sob esse incentivo poderoso, começam a surgir as maneiras de ludibriar o sistema. Ficou famoso o caso de jovens do Leste Europeu que, durante a última campanha presidencial dos EUA, multiplicavam notícias falsas desfavoráveis ao Partido Democrata.
O engodo já adquiriu proporções de um comércio de popularidade artificial, como mostrou reportagem da Folha. Há fornecedores que vendem o milheiro de curtidas a preços de US$ 45 a US$ 75, dependendo da rede social em vista.
Uma das maneiras de inflar indevidamente a audiência ou o número de seguidores de uma página na internet é contratar os serviços de "fazendas de cliques", hordas de perfis de aluguel, ou mesmo fictícios, mantidos em países como China, Filipinas, Paquistão, Índia e Bangladesh.
A parte do leão da publicidade mundial é carreada hoje para pouquíssimas redes sociais, com usuários na casa de centenas de milhões, se não bilhões. No ano passado, uma só delas, o Facebook, amealhou US$ 27,6 bilhões.
A empresa, contudo, já se ressente do desgaste de credibilidade acarretado por estimados 32 milhões de contas duvidosas em 2015. Tanto é que encetou esforço para reduzir esse número, que caiu para 19 milhões no ano passado.
Essas redes não são propriamente veículos noticiosos, mas as distorções que induzem afetam o próprio campo do jornalismo. Mais que nunca, cabe a ele —se fiel à sua missão— combater a busca de audiência fácil por meio de vulgarização e sensacionalismo.
Assim preconiza o novo Projeto Editorial desta Folha: "É valioso ser lido e seguido, mas é imperativo preservar os padrões de qualidade e ressaltar a unidade de propósitos e estilo nas diferentes versões em que circula".
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