Proibir corredor vai matar mais gente
Jorge Araújo/Folhapress | ||
Fila de motos em meio a carros em horário de pico na avenida Eusébio Matoso, zona oeste de São Paulo |
É pura ingenuidade achar que a proibição do tráfego de motocicletas no corredor vá salvar vidas. Qual setor econômico perde com o veículo de duas rodas como principal alternativa de mobilidade urbana?
Na ponta do lápis, o veículo de duas rodas tem menor custo de aquisição e de manutenção, consome menos combustível, polui menos o meio ambiente, ocupa pouco espaço na via pública e não fica parado em congestionamento.
Interessante que há mapeamento de acidentes e mortes no trânsito; todavia, nada se fala das causas. Qual a causa?
Após estudo, Nova Gales do Sul, na Austrália, legalizou o corredor. A Califórnia (EUA) também o fez após constatar, por meio de pesquisa da Universidade de Berkeley, que, dos 6.000 acidentes registrados entre outubro de 2012 e agosto de 2013, apenas 3% envolveram motocicletas no corredor; nos outros 97%, houve abalroamento traseiro (com a motocicleta ora sendo atingida, ora atingindo outro veículo) ou a moto ficou entre dois automóveis, muitas vezes com esmagamento e morte do condutor.
Na Espanha, que se tornou exemplo por reduzir em 56% a mortalidade nas suas vias de tráfego entre 2005 e 2011, constatou-se em 2009, por meio de pesquisa, que a cada 10 acidentes entre automóveis e motocicletas, em 7 a culpa era do motorista do automóvel.
Antes de proibir o uso do corredor, que tal o poder público cumprir seu dever?
Película escura: o agente de trânsito não está equipado para verificar a transmitância luminosa, como determina a resolução 254/07 do Contran para dar cumprimento à resolução 253/07, que regulamenta o inciso III do artigo 111 do Código de Trânsito Brasileiro. O escurecimento do habitáculo elimina a visibilidade periférica do motorista, que deixa de enxergar motociclistas e ciclistas no corredor.
A película nos vidros traseiros prejudica ainda a visibilidade de outros condutores, dificultando antecipar uma frenagem, por exemplo, causando engavetamento. Recomendo a leitura do estudo "Contrast sensitivity", de Cynthia Owsley, do Departamento de Oftalmologia da Universidade do Alabama.
Celular: deve-se criminalizar seu uso ao volante (de modo equiparável ao consumo de álcool), especialmente encorajado pela película escura. É crucial triangular os sinais do celular para saber se este era utilizado no momento do acidente.
Faixas de rolamento: em 2006, a avenida 23 de Maio, na cidade de São Paulo, teve a faixa de rolamento diminuída de 3,5 metros (padrão mundial) para 2,6 metros de largura, para a criação da quinta faixa. Resultado: aumento de acidentes com motocicletas.
Velocidade no corredor: é necessária a consciência de que deve ser moderada; com o trânsito totalmente parado, não deve ultrapassar 40 km/h, e com o trânsito em movimento não deve ser superior a 30% da mantida pelos outros veículos.
Basta o condutor da motocicleta contar até três: se já ultrapassou o automóvel, é porque está rápido demais. A fiscalização é crucial e há tecnologia para detectar isso.
O veículo de duas rodas tem uma dinâmica muito diferente. O piloto precisa ter visibilidade; ficar atrás de um automóvel prejudica possíveis ações preventivas, como desviar de obstáculos.
É necessário regulamentar o corredor. Afirmo: proibir vai matar mais gente!
ANDRÉ GARCIA é advogado, especialista em segurança de trânsito, jornalista, palestrante e autor do projeto Motociclismo com Segurança
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