Análise
Crise de representação faz com que ninguém ganhe eleitores
Exatos 20 dias separam a pesquisa anterior do Datafolha da que é divulgada hoje. Nesse período, Lula foi conduzido coercitivamente a prestar depoimento na Polícia Federal, teve prisão solicitada pelo Ministério Público de São Paulo, foi nomeado ministro por Dilma e grampeado pelo juiz Sergio Moro.
A delação do senador Delcídio do Amaral envolveu governistas e oposição, e o Brasil viu a maior manifestação política de sua história.
O balanço dessa avalanche na opinião pública, como era de se esperar, é devastador para o governo. Dilma volta a patamar próximo de seu pico de impopularidade, infla o conjunto de antipetistas refratários à sua gestão e frustra novamente parcelas de seu eleitorado que demonstravam, até fevereiro, refluxo tímido de apoio, como os mais jovens e menos escolarizados.
O discurso da falta de representatividade social nas manifestações, predominantemente compostas por classe média alta, é ainda relativizado pelo alto índice dos que apoiam os atos e dos que condenam nomear Lula à Casa Civil, posições majoritárias inclusive entre os mais pobres e moradores do Nordeste.
O reflexo disso é o crescimento importante na taxa dos que pedem tanto o impeachment quanto a renúncia da presidente, apesar de a ideia ainda dividir seu eleitorado. Da mesma forma, o segmento de simpatizantes do PT constitui, em sua maioria, o estrato mais fiel à presidente.
No duelo entre Lula e Sergio Moro por corações e mentes, o juiz levou vantagem. Há apoio majoritário em todos os segmentos sociais à condução coercitiva do ex-presidente, assim como predomina na maior parte da opinião pública a sensação de que a nomeação para a Casa Civil foi mais uma tentativa do petista de escapar da Lava Jato do que predisposição em ajudar o governo Dilma.
A grande maioria dos brasileiros aprova o modo como Moro conduz a investigação.
Com tudo isso, a rejeição a Lula para 2018 bate recorde. Mas, diante da crise de representação que domina o país, não se converte em intenção de voto na oposição. Aécio Neves, também citado em delações, vai a 32% de reprovação e perde apoio do eleitorado.
Marina Silva não sai do lugar. Nem Moro, com grande exposição positiva, pela primeira vez incluído no estudo como eventual candidato a presidente, chega a alcançar percentual muito elevado.
Oscila positivamente a taxa de entrevistados que não escolhem um candidato e cresce o índice dos que dizem não ter partido de preferência. Prova dessa desilusão do brasileiro com a "política tradicional" é a recorrente resistência de manifestantes quanto à instrumentalização partidária de seus eventos.
Chamada a se posicionar na última semana, tanto por um lado quanto por outro, a opinião pública se mobilizou de maneira passional. Porém, a história é rica em apontar exemplos do quanto essa polarização nos extremos é politicamente improdutiva e o quanto acaba por abrir espaço para rompantes autoritários. Talvez por isso, por enquanto, junto à população, Moro tenha mais apelo como um poderoso juiz do que como um possível candidato à presidente da República.
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