Endossado pelo MBL, prefeito de Porto Alegre dispara críticas ao PT nas redes

Crédito: Marlene Bergamo - 22.jan.2018/Folhapress Prefeito Nelson Marchesan Filho durante entrevista a Folha
Prefeito Nelson Marchesan Filho durante entrevista a Folha

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER
ENVIADA ESPECIAL A PORTO ALEGRE (RS)

"Quero mudar o mundo!", diz Nelson Marchezan Jr. (PSDB) em sua descrição do Twitter. Na mesma rede social, o prefeito de Porto Alegre parece mais apto a alterar o humor de petistas.

O mais recente quiproquó se deu com a presidente da sigla, Gleisi Hoffmann, que na semana passada o definiu como "prefeito fake news" nas bandas virtuais.

A senadora se referia ao episódio que pôs Marchezan no noticiário nacional e na linha de fogo da esquerda, quando ele enviou ofício ao presidente Michel Temer no terceiro dia de 2018.

Matizada por expressões como "ameaça de ocupação" e "desobediência civil", a carta solicitava apoio das Forças Armadas "em razão do iminente perigo à ordem pública" que, segundo ele, se avizinhava com o julgamento de Lula no Tribunal Regional Federal da 4 Região, marcado para quarta-feira (24).

O pedido era "ilegal" e "impossível", respondeu o ministro da Defesa, e "ridículo", reagiram partidários do ex-presidente, que viram ali tentativa de associar atos pró-Lula a rompantes de violência.

Marchezan não deixou barata a estocada da petista. "Chinfrim é ser corrupto e nariz empinado. Fake é a origem do patrimônio dos teus comparsas. [...] E tu, por que não te calas? Cara de pau", tuitou.

A escolha de palavras não foi gratuita: Gleisi é chamada de Narizinho por militantes da direita, como o comentarista Felipe Moura Brasil.

Não é a primeira vez que o tucano endossado pelo MBL (Movimento Brasil Livre) rivaliza com dirigentes do partido de Lula.

Em 2016, foi chamado por um, o conterrâneo Paulo Pimenta, de "filhote da ditadura", quando os dois eram deputados (seu pai e homônimo foi líder do governo João Figueiredo na Câmara, pelo Arena).

O PT portoalegrense acionou o Ministério Público para acusá-lo de usar a máquina administrativa para incitar o ódio. Exemplo: o vídeo em que proibia "formar quadrilha" quem pertencesse "a certos partidos vermelhos" (seu Facebook é pessoal e por lá faz o que bem entender, rebate Marchezan).

O prefeito recebe a Folha em seu gabinete na segunda-feira (22), quando volta ao batente numa data que parece escolhida a dedo. Passou férias na baiana Praia do Forte antes de voltar à cidade que, em dois dias, sediará o julgamento de Lula.

Jura que foi coincidência ("é porque meu vice sai de férias no dia 24") e que não pretende dar as caras no CarnaLula, para o qual foi convidado pelo MBL, que planeja celebrar eventual condenação do ex-presidente.

Marchezan reitera que, sim, ter o Exército na área é legítimo diante "da tensão que poderia ou pode vir a ocorrer", dadas as "manifestações violentas postas nas redes sociais".

Ele lembra que o próprio presidente do TRF-4 disse que juízes da corte têm recebido ameaças, com alguns deles enviando familiares para fora do Estado. Vai que um "lobo solitário" decide agir após ouvir Gleisi falar que "para prender o Lula, vai ter que matar gente, ou o líder do PT no Senado, Lindbergh Farias, citar "luta nas ruas" num momento que "não é para esquerda frouxa"?

Declarações assim, diz Marchezan, "podem ter se passado no calor do momento", mas há sempre o risco que "alguém interprete isso como um chamamento".

Fora o rebuliço nos serviços públicos, com bloqueios no trânsito e potencial dano a uma revitalização milionária da orla do rio Guaíba, afirma.

'MARCHEZITO`

A conversa com o prefeito é entrecortada pelo barulho de um ato na frente da prefeitura, com manifestantes de branco, quase todos de religiões afrobrasileiras —mais a faixa "paganismo presente contra a intolerância religiosa".

Funcionários contam que protestos contra Marchezan são de praxe. Num período, "foram 40 dias seguidos de fuzuê", diz um deles, perto de uma mesinha ao lado do gabinete do prefeito, onde há livros à disposição dos servidores (o Novo Testamento, "Nos Passos de Jesus", de Edir Macedo e "O Zahir", de Paulo Coelho).

O tucano é bom em fazer inimigos. Deu uma de suas declarações mais polêmicas no congresso anual do MBL, em novembro, ao dizer "aqui entre nós" que "todo parlamentar é cagão". Vereadores pediram "equilíbrio emocional" do chefe do Executivo.

"Tenho uma marca que é a espontaneidade, a transparência", diz o prefeito de 46 anos ("pareço menos, né?"), já comparado a "youtuber" e "dublê de João Doria" por êmulos.

"Empurrado" à política aos 30 anos, com a morte prematura do pai deputado, por enfarte, aos 63, Marchezan é um dos chamados "cabeças pretas" do PSDB, em oposição aos caciques grisalhos do partido.

Em junho, jogou as mãos para o alto para dançar o hit "Despacito". A coreografia empolgou sua militância, mas também lhe rendeu certa dor de cabeça, como um protesto em que servidores municipais trocaram "despacito" por "Marchezito".

"Uma professora que coordena uma ONG me chamou para o caminhão e queria dar aula de ginástica. Tive que dançar, estava junto. Eu sou gente, né?"

No ano retrasado, ele foi um dos deputados que penduraram uma faixa verde-amarela no pescoço para votar a favor do impeachment de Dilma Rousseff.

Prefere não falar em direita ou esquerda. "Estes rótulos mais antigos não se enquadram comigo. Sou liberal em economia, em direitos individuais? Acho que sim. Socialista com a coisa pública? Também concordo."

Quem ratifica sua gestão é o MBL, que o apoiou na eleição por "nunca ter tido medo de dizer com todas as letras que os governos petistas foram os mais corruptos da história do país".

E não só, completa Kim Kataguiri, um dos líderes do movimento: "Isso sem falar que dança despacito e dá aulas de zumba".

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.