Teses debatidas no mensalão devem voltar à tona em julgamento de Lula

MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO

Duas questões que foram centrais no mensalão e reaparecem no julgamento desta quarta (24) no TRF-4 (Tribunal Regional da 4ª Região) podem beneficiar o ex-presidente Lula se a jurisprudência do Supremo for seguida, segundo os advogados e professores Celso Vilardi, da Fundação Getúlio Vargas, e Gustavo Badaró, da USP.

São as polêmicas jurídicas sobre ato de ofício, jargão que designa a decisão formal por parte do ex-presidente que tenha beneficiado a OAS, e em torno dos supostos pagamentos dissimulados no caso do tríplex: eles são só corrupção, ou corrupção e lavagem de dinheiro, como está na sentença do juiz Sergio Moro?

Crédito: Joel Rodrigues - 25.jun.2014/ Folhapress Ministros do STF analisam recursos do mensalão, no plenário do tribunal, em Brasília, em junho de 2014
Ministros do STF analisam recursos do mensalão, no plenário do tribunal, em Brasília, em junho de 2014

Moro considerou que os atos de ofício decorriam da força do cargo de Lula e da nomeação de diretores da Petrobras, o que é contestado pela defesa.

Vilardi, que defendeu o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares no mensalão, diz que a a decisão de Moro é "tentadora para leigos, mas parece contrariar a jurisprudência do Supremo".

Segundo ele, o Supremo não aboliu a necessidade de ato de ofício no julgamento do mensalão, em 2013, mas aceitou que ele possa ser indeterminado. "O que o Supremo decidiu é que conluio [entre corrupto e corruptor] seria suficiente para caracterizar a corrupção, desde que o corrupto tenha capacidade de entregar o que foi combinado", afirma Vilardi.

Como Lula não nomeava formalmente os diretores da Petrobras, mas sim o conselho da estatal, a jurisprudência do Supremo pode beneficiá-lo no futuro.

À época em que Lula visitou o apartamento em Guarujá, em 2014, quando o imóvel ainda não fora reformado, ele já não ocupava a Presidência e não tinha poder para editar atos que beneficiassem a OAS, diz Badaró.

"Esse é um ponto fragilíssimo da sentença de Moro", afirma o professor da USP, referindo-se ao ato de ofício. "É quase um saci-pererê: muito difícil de parar de pé. Sem ato de ofício não há corrupção, e isso beneficia Lula".

É LAVAGEM OU NÃO É?

A questão da lavagem de dinheiro é tão polêmica quanto o ato de ofício. No julgamento dos embargos infringentes do mensalão, o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) foi inocentado do crime de lavagem.

O Supremo considerou que as vantagens ilícitas que ele recebera eram o ato final do crime de corrupção, não a volta ao mercado legal de dinheiro ilícito –a definição de lavagem de dinheiro.

"Do ponto de vista técnico, essa é a posição mais correta. Mas há julgamentos que contrariam essa decisão do Supremo", pondera Vilardi.

Badaró diz que até há indícios de lavagem no modo dissimulado como o apartamento é reservado para Lula, nas visitas, na escolha dos móveis para a cozinha.

O problema, para ele, é que faltam provas de corrupção. "Se não há corrupção, não há como lavar dinheiro de um crime que não houve".

A sentença de Moro é o ponto de partida do julgamento desta quarta, mas o TRF-4 não precisa se ater a ela, segundo Silvana Battini, professora de direito da Fundação Getúlio Vargas no Rio e procuradora federal.

"É um novo julgamento. O tribunal está livre para fazer o que bem entender com as provas e reavaliá-las de maneira diferente", diz Battini.

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