Descrição de chapéu Eleições 2018

Tem gente entrando na política com práticas velhas, diz Marina Silva

Ex-senadora diz se preparar para campanha presidencial 'franciscana'

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São Paulo

Com experiência em cargos públicos e em campanhas presidenciais —deve ir para sua terceira—, Marina Silva diz ver com bons olhos a entrada de novos nomes na política, mas defende que a tarefa exige construção. "É preciso que se crie um processo de enraizamento", afirma.

Terceira colocada no Datafolha, a fundadora da Rede sobe para a segunda colocação no cenário sem Lula (PT), caso o ex-presidente seja impedido de concorrer por estar condenado, e aí disputaria com Jair Bolsonaro (PSC). No segundo turno, porém, ela venceria o deputado federal.

Folha - O que a decisão de Luciano Huck de não ser candidato muda no cenário eleitoral?

Marina Silva - Ele não estava colocado nesse lugar de candidato, estava sendo colocado. Vejo com bons olhos os esforços de renovação na política. Mas você tem um caminho de construção. Huck, com certeza, deve dar continuidade ao trabalho nos movimentos dos quais ele está participando, de busca de novos quadros.

A sra. já afirmou que não acha adequado uma pessoa sem experiência começar disputando a Presidência.

É uma tese que eu advogo há tempos, antes de se colocar a candidatura do Huck. Falo o mesmo em relação a essa história de que é preciso alguém de fora da política, ou alguém que seja apenas um gerente. É bem-vinda a contribuição, mas é preciso que se crie um processo de enraizamento. Os agentes políticos vão criando raízes em si mesmos, no contato com a população, com outros agentes. Você não faz política sozinho.

A sra. é apresentada por apoiadores como uma representante do "novo". Virá com essa roupagem na eleição?

Nunca foi tão necessária a ideia de novas propostas, novas posturas e novas atitudes na política. E isso não tem nada a ver com o tempo de participação na política. Isso tem a ver com encarar a política como um processo vivo, onde você não repete fórmulas.

A única coisa que eu sei neste momento é que vamos fazer uma campanha onde vamos nos deparar com a firmeza e a clareza da verdade. É o momento de refundar a República, onde aqueles [políticos] que criaram o problema sejam generosamente encaminhados para um período de férias. Para reler seus estatutos e programas, conversar com pessoas que pagam o alto preço do desemprego e da corrupção.

A sra. se vê então como exemplo de que é possível ser novo mesmo tendo uma trajetória?

Obviamente que quando falo isso não posso me tomar como exemplo. Não é ser uma pessoa que não tem nenhuma participação no processo político que vai significar que você é novo ou velho. Tem muita pessoa que está entrando na política pela primeira vez com práticas completamente ultrapassadas, estagnadas. Política não é repetição, é ressignificação. É nesse lugar que a política precisa se colocar. E me vejo como parte dessa necessidade.

A saída de Huck abre vácuo para candidaturas de centro. Considera que poderia preencher esse espaço?

A gente tem que trabalhar para construir algo que esteja à frente. À frente dessa polarização de centro, direita, esquerda. A sociedade quer ver mudanças, não quer dar seu voto com base apenas se está votando no centro, na direita, na esquerda. Isso não diz nada do problema de saúde, de educação, de segurança pública que estamos vivendo. Eu quero estar à frente.

Vê espaço para outsiders?

Muitos usam o [presidente francês Emmanuel] Macron como exemplo de alguém de fora da política, mas não é verdade. Ele tem uma trajetória, foi ministro, mas foi capaz de uma proposta inovadora. Já o [presidente americano Donald] Trump é de fora, e esse não está dando certo. Os Estados Unidos têm instituições que operam o governo apesar do presidente. Na América Latina, não temos o mesmo amadurecimento institucional.

A ex-ministra Marina Silva dá entrevista na sede da Rede Sustentabilidade, em Brasília
A ex-ministra Marina Silva na sede da Rede Sustentabilidade, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

Eleição sem Lula é fraude?

A eleição deve ser feita em obediência à lei. E a Lei da Ficha Limpa diz que os que não estiverem aptos de acordo com ela não podem participar da eleição. Eu insisto que a gente não pode ficar fulanizando as coisas, senão a gente cria pesos e medidas com base em quem está sendo julgado. A lei deve ser para todos, e a democracia se realiza quando a lei é para todos.

Pesquisas de intenção de voto mostram que a ausência de Lula beneficia a sra. Como irá se aproximar desses eleitores?

A gente não pode partir da ideia de que, antes do voto confirmado na urna no dia da eleição, existe o voto a priori da Marina, do Lula, do Ciro, do Alckmin, de quem quer que seja. O voto é do cidadão. E, enquanto não chegar esse momento, devemos dialogar com respeito a todos os eleitores. Não parto do princípio de que já existe uma cesta de votos e que é possível privatizar essa decisão soberana. Vou trabalhar no diálogo, defendendo propostas, me colocando como sempre me coloquei, dizendo que coisas boas que vieram dos governos do PT, do PSDB, do PMDB serão mantidas, porque são conquistas da sociedade.

Quais as perspectivas de suas discussões para alianças da Rede com outros partidos?

O importante, e foi o que disse para o PSB e os demais partidos com os quais venho falando, é que para darmos continuidade à conversa não é preciso necessariamente que alguém abra mão de seus projetos. Acho legítimo que numa eleição em dois turnos os partidos apresentem candidaturas. Se for possível em algum momento uma composição, é desejável que aconteça.

A sra. diz que foi vítima de ataques duros na campanha de 2014. Como está se preparando para agora?

Com muito trabalho. Com consciência das dificuldades de fazer uma campanha com dez segundos de televisão. Com consciência de que foi feito um acordo entre PT, PSDB, PMDB e DEM para que só eles tenham os meios para ganhar uma eleição. Vou fazer uma campanha de Davi contra Golias.

Não é que eu não tenha medo de tudo que sei que alguns dos adversários são capazes de fazer, mas o medo jamais será maior do que o compromisso. Será uma campanha franciscana no sentido sagrado, ou seja, sem muitos recursos financeiros. E não no sentido profano que acabaram associando à linda oração de São Francisco de Assis, o de que é dando que se recebe.

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