Bolsonaro entrega prestação de contas final e mantém omissão de gastos

Custo declarado foi de R$ 2,4 milhões, sendo 27% com internet; sobra foi de R$ 1,6 milhão

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) fala com a imprensa após almoço com o presidente do STJ, João Otávio de Noronha, em Brasília
O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) fala com a imprensa após almoço com o presidente do STJ, João Otávio de Noronha, em Brasília - Pedro Ladeira - 7.nov.2018/Folhapress
Ranier Bragon Letícia Casado
Brasília

A campanha do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), entregou às 22h06 da última terça-feira (6) a prestação de contas final de sua campanha, 11 dias antes do prazo, que é 17 de novembro. Ao todo, o presidenciável declarou à Justiça Eleitoral ter gasto R$ 2,436 milhões, menos do que o limite permitido a um postulante a deputado federal —R$ 2,5 milhões.

Conforme a Folha mostrou no último dia 24, a campanha do então candidato havia omitido uma série de detalhes de seus gastos na prestação de contas parcial de campanha entregue na primeira quinzena de setembro, o que contraria a legislação eleitoral.

Embora a prestação final traga um volume bem maior de informações, permanecem lacunas.

Não há declaração sobre serviços prestados por um dos principais advogados da campanha, Tiago Ayres, pela mulher do ex-presidente do PSL Gustavo Bebianno, Renata —que cuidou da agenda do candidato e da interlocução com a imprensa—, ou custo de aquisição de suprimento para comitês de campanha.

A resolução do TSE 23.553/2018, que regulamentou a prestação de contas para essas eleições, ratifica a legislação eleitoral no sentido de que todo trabalho prestado à campanha, remunerado ou não, deve ser informado e divulgado na internet. No caso de serviço voluntário, o custo estimado da mão de obra entra como doação ao candidato e tem que ser calculado "mediante a comprovação dos preços habitualmente praticados pelo doador e a sua adequação aos praticados no mercado, com indicação da fonte de avaliação".

Em sua declaração final, Bolsonaro diz não ter usado R$ 1,59 milhão do que conseguiu arrecadar —a maior parte por meio de financiamento coletivo, as chamadas vaquinhas virtuais (R$ 3,7 milhões). Ao todo, o presidente eleito declarou receita de R$ 4,15 milhões.

A prestação de contas de campanha é uma exigência da lei eleitoral e tem como um de seus objetivos permitir aos eleitores a fiscalização da veracidade da movimentação financeira declarada pelos candidatos.

Para isso, o Tribunal Superior Eleitoral publica em sua página todas as informações prestadas durante a campanha, com atualizações diárias e com consolidação de informações em dois períodos específicos: na prestação de contas parcial, em 15 de setembro, e na final: para o caso daqueles que disputaram o segundo turno, até 17 de novembro.

O maior gasto declarado pelo presidente eleito é com a AM4 Brasil Inteligência Digital LTDA para serviços de "criação de site de campanha e mídias digitais" e "consultoria marketing/mídias digitais" —R$ 650 mil.

A Folha mostrou em 18 de outubro que empresários impulsionaram disparos em massa por WhatsApp contra o PT na campanha. 

A empresa afirma não ter contratado impulsionamento de conteúdo na internet ou disparo em massa de campanha contra o PT. 

Ela diz ter feito, entre outros serviços, modernização do portal do PSL, produção de conteúdo para as redes oficiais do candidato, criação do portal da campanha, de aplicativos para eleitores —como o "Mito na Selfie"—, além da plataforma de arrecadação de doações pela internet. 

Sobre o uso do WhatsApp, a AM4 disse que usou o aplicativo em três frentes: "Atendimento aos apoiadores (doadores e fiscais do Jair), transmissão de conteúdo (comitês estaduais de distribuição e contato) e recebimento de denúncias".

O segundo maior gasto declarado é da Studio Eletrônico Assessoria e Produção de Cinema e Televisão, responsável pelo programa de TV e rádio do candidato no segundo turno, com R$ 525 mil.

Apesar de nas declarações anteriores entregues ao TSE a campanha ter informado gasto de R$ 300 mil com a Pontestur Agência de Viagens e Turismo, na final houve declaração de apenas R$ 66 mil. 

Ao todo, Bolsonaro afirma à Justiça que sua campanha desembolsou R$ 85 mil com viagens, o que inclui deslocamento aéreo, aluguel de veículos, gasto com combustível e hospedagem, entre outros. Antes de sofrer o atentado a faca, em 6 de setembro, Bolsonaro foi em campanha a pelo menos 16 cidades de sete estados, onde participou de carretadas e comícios com caminhões de som, além de ter dado entrevistas coletivas em hotéis.

A título de pessoal, o presidente eleito declarou apenas um coordenador financeiro, dois auxiliares, a intérprete de libras e 26 seguranças —para 17 deles há registro de pagamento de R$ 500 reais para cada um pelo trabalho exclusivo no dia do segundo turno (28 de outubro).

As contas de Bolsonaro serão julgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. No caso de desaprovação, as contas são encaminhadas ao Ministério Público Eleitoral para avaliar a proposição de ação de investigação judicial, questionando se houve abuso de poder econômico ou político.

Se as contas de um candidato são aprovadas com ressalva, o plenário do TSE pode decidir encaminhar o caso para o Ministério Público. Independentemente disso, o procurador ou algum partido político pode pedir abertura de investigação judicial eleitoral.

A Folha enviou perguntas à assessoria de imprensa e jurídica de Bolsonaro na tarde desta sexta-feira (9). Não houve resposta até a publicação desta reportagem.

Adversário de Bolsonaro no segundo turno, Fernando Haddad (PT) não entregou ainda a sua prestação de contas final. De acordo com os dados informados pelo petista ao TSE até o momento, sua campanha arrecadou R$ 36,9 milhões e gastou R$ 36,2 milhões.

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