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Bolsonaro cobra discurso político de Mandetta em pandemia do coronavírus

Presidente avalia que pasta da Saúde gera histeria e defende mudança de tom em retórica de ministro

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro tem cobrado do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que passe a adotar um discurso mais afinado ao do Palácio do Planalto no combate à pandemia do coronavírus.

O presidente tem defendido a deputados bolsonaristas que o auxiliar presidencial, que se tornou o porta-voz do governo na atual crise, incorpore em sua retórica pública a defesa para que a atividade econômica não seja paralisada e o apoio ao direito do cidadão de participar de protestos.

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta - Sérgio Lima / AFP

Ele também tem considerado que o tom adotado pelo Ministério da Saúde tem gerado histeria e que, neste momento, o papel do poder público deveria o ser de acalmar a população, não o de estimular o pânico.

Com um discurso técnico, em consonância com os protocolos internacionais de saúde pública, o ministro tem defendido, por exemplo, que as pessoas não participem de aglomerações e adotem medidas de precaução, além de ficarem em isolamento se tiverem sintomas.

Com as recomendações, na avaliação de assessores palacianos, Mandetta acabou fazendo um contraponto a Bolsonaro, o que incomodou o presidente e tem servido de munição para adversários do governo.

No último final de semana, por exemplo, Bolsonaro reclamou sobre a participação de Mandetta, na última sexta-feira (13), em uma entrevista à imprensa ao lado do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), pré-candidato à sucessão presidencial de 2022.

O ministro informou ao presidente que iria participar de reunião na capital paulista, mas, segundo aliados, Bolsonaro não imaginava que ele posaria ao lado do tucano. Desde então, Doria tem feito elogios públicos a Mandetta e afirmado que se arrependeu de ter votado em Bolsonaro.

O presidente também se irritou, de acordo com auxiliares próximos, com o fato de Mandetta não tê-lo defendido, em entrevistas à imprensa, por ter participado de manifestação a favor do governo em Brasília.

Em conversa com a Folha, por exemplo, o ministro disse que a participação em manifestações não é ilegal, mas reforçou que a orientação é para não participar. “E continua sendo não para todo mundo”, disse.

Após o incômodo, Mandetta adotou nesta terça-feira (17) um discurso mais próximo ao do presidente. Ao comentar a previsão de que o Brasil terá aumento de casos de infecção pelo novo coronavírus até junho, o ministro disse que medidas de restrição poderiam ser utilizadas nesse período.

E completou: "Devemos ter muito cuidado com medidas restritivas que possam interromper abastecimento de grandes eixos. Não adianta parar tudo e depois não ter alimentos para os outros estados. Temos que ver a logística de abastecimento do país".

No ano passado, quando considerava uma reforma ministerial, o presidente chegou a cogitar uma mudança no comando da pasta. Na época, a avaliação era de que Mandetta tinha um perfil muito técnico, o que não agradava o núcleo ideológico.

Para tentar mudar esse diagnóstico, o ministro chegou a endurecer o discurso, o que ganhou a simpatia do presidente. Neste momento, em meio a uma pandemia de coronavírus, a hipótese de uma troca de Mandetta é classificada como impossível no Palácio do Planalto.

Ainda assim, ao mesmo tempo em que enfrenta um incômodo com Mandetta, o presidente tem se aproximado cada vez mais do diretor-presidente Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antônio Barra Torres, que não é descartado para o comando da Saúde em uma futura reforma ministerial.

Desde o final de semana, o presidente tem entrado em choque com medidas da Saúde no esforço de reforçar a necessidade de que a atividade econômica não seja impactada pela crise de saúde. Ele defendeu, por exemplo, que as partidas de futebol não sejam suspensas e que os estabelecimentos comerciais sigam funcionando.

“Vai ter um caos muito maior se a economia afundar. Se a economia afundar, afunda o Brasil”, disse Bolsonaro, em entrevista na segunda-feira (16). “Se acabar a economia, acaba qualquer governo. Acaba o meu governo", acrescentou.

A preocupação com o impacto econômico levou até mesmo a Saúde a recuar, após pressão do Planalto, na decisão que impedia a saída de novos cruzeiros no país enquanto durar a situação de emergência pelo novo coronavírus.

Para demonstrar normalidade, o presidente também tentou impedir que a fronteira do Brasil com a Venezuela fosse fechada. “Não é fechar a fronteira, não é assim que funciona. O que eu vou sugerir hoje é que nesta entrada de pessoal você faz um exame. Quem tiver os sintomas fica", disse Bolsonaro na segunda-feira (16).

Nesta terça-feira (17), no entanto, após pressão do núcleo militar e de entidades de saúde, ele recuou. A entrada em Roraima deve ser fechada para pessoas, mas não para mercadorias, na tentativa de manter a atividade econômica.

A AMB (Associação Médica Brasileira) encaminhou no domingo (15) um ofício ao presidente para que a fronteira fosse fechada por causa da falta de equipamentos mínimos de segurança e proteção em Roraima.​

A postura do presidente diante da pandemia tem sido criticada, em caráter reservado, por integrantes da bancada federal da Saúde, para os quais Bolsonaro deveria seguir o exemplo de Mandetta no combate à doença.​

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