Mudança de secretário da Agricultura abre espaço ao MDB na gestão Doria

Gustavo Junqueira deixa o posto para o deputado estadual Itamar Borges (MDB), que já foi condenado

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São Paulo

O secretário de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, Gustavo Junqueira, deixará o cargo para assumir a presidência da Investe SP, agência de estímulo a investimentos do governo paulista. Como adiantou a Folha, o deputado estadual Itamar Borges (MDB) ocupará seu lugar, em uma movimentação de João Doria (PSDB) para ampliar apoios políticos para 2022.

Gustavo Junqueira, que deixará a Secretaria de Agricultura e assumirá a Investe SP - Mathilde Missioneiro - 2.out.2019/Folhapress

A transição deve ocorrer nos próximos 15 dias. O atual presidente da Investe SP, Wilson Mello, que é advogado, voltará a atuar na iniciativa privada.

Itamar, que é líder do MDB na Assembleia Legislativa, é condenado criminalmente em segunda instância por desvios de verbas da educação. Ele recorre aos tribunais superiores.

Em nota enviada à Folha, o governo de São Paulo confirmou as mudanças. Em nota anterior, enviada no dia 12, a Secretaria de Comunicação afirmou à reportagem que "qualquer insinuação sobre sua saída [de Junqueira] não passa de mera especulação".

Agora, o governo informa que a mudança ocorre após a saída de Mello para atender a um convite da iniciativa privada.

"O deputado estadual Itamar Borges, que preside a Frente Parlamentar do Agronegócio Paulista e a Comissão de Atividades Econômicas, foi convidado a contribuir com a atual administração como novo Secretário de Agricultura e Abastecimento e aceitou o desafio", diz o texto.

"A partir de segunda-feira (17), Borges inicia uma transição integrada no comando da pasta ao lado de Junqueira. A transição deverá ser concluída até o fim deste mês", completa.

A secretaria de Agricultura é visada entre os políticos por sua capilaridade pelo interior de São Paulo. O MDB, partido da base de Doria, vinha pleiteando mais espaço no governo, já que nomes de outras siglas aliadas, como DEM, Republicanos e PP, ocupam secretarias.

​A entrada do MDB no primeiro escalão do governo estadual consolida a aliança com o PSDB no estado, construída ainda em 2020, com a indicação, bancada por Doria, do vice-prefeito Ricardo Nunes (MDB) para a chapa do prefeito Bruno Covas (PSDB) na eleição municipal.

Com a morte do prefeito neste domingo (16), Nunes assume a prefeitura, o que também amplia a influência do MDB na capital.

Doria pretende disputar prévias no PSDB para ser candidato a presidente da República e lançar seu vice, Rodrigo Garcia, recém filiado ao PSDB, para sua sucessão. Para obter apoios, além da troca de cargos, o governador de São Paulo tem ampliado as conversas com prefeitos e adotado estilo informal na comunicação.

Junqueira, que tem experiência na área de investimentos, terá a missão de auxiliar na retomada da economia após o abalo provocado pela pandemia. A Investe SP tem escritórios em Dubai (Emirados Árabes Unidos) e Xangai (China), e abrirá outros dois, em Nova York (EUA) e Munique (Alemanha).

Também está sob o guarda-chuva da agência a construção da nova fábrica de vacinas do Instituto Butantan.

Junqueira é produtor rural, presidiu a Sociedade Rural Brasileira e foi uma escolha pessoal do governador —a secretaria é seu primeiro cargo público.

Membros do governo afirmam que o secretário deixou um legado de modernização da administração, novas plataformas para produtores, uma nova lei sanitária, além de projetos de sustentabilidade.

"Junqueira foi responsável por iniciativas importantes como o Agro Legal, que deve regularizar ambientalmente mais de 360 mil imóveis rurais e reflorestar aproximadamente 800 mil hectares em 20 anos; o Cesta Verde, que apoia pequenos produtores e possibilita doações de alimentos à população carente; e o Rotas Rurais, parceria mundial inédita com o Google para endereçamento digital de todas as propriedades rurais e mapeamento de 200 mil quilômetros de estradas. A atuação de Junqueira também facilitou a interlocução entre o Estado e os diversos setores do agronegócio", afirma o governo em nota.​

Parte do governo avalia, no entanto, que sua interlocução com o agronegócio é insatisfatória e que sua reação foi tímida diante dos "tratoraços" de agricultores contra o fim de isenções de ICMS na gestão Doria.

Quando venceu a eleição em 2018, Doria indicou para a Investe SP o ex-senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). Mas, em fevereiro de 2019, ele deixou o cargo após virar alvo da Lava Jato.

Um ano depois, Aloysio ganhou um cargo na gestão do prefeito Covas. Ele, que sempre se disse inocente, é até hoje o presidente da SP Negócios (agência municipal de promoção de investimentos).

De acordo com emedebistas ouvidos pela Folha, o partido, ao integrar o governo Doria, sinalizou apoio à eleição de Garcia para o Palácio dos Bandeirantes, mas não necessariamente está comprometido em apoiar o governador na corrida para o Planalto. O MDB se divide entre defensores da terceira via, de Lula (PT) e de Jair Bolsonaro (sem partido).

Como previsto, a troca ocorrerá após a filiação de Garcia ao PSDB, na última sexta (14). Se o MDB foi atraído para a órbita de Doria, a mudança de sigla do vice implodiu a relação do governador com o presidente do DEM, ACM Neto.

Neto afirmou que Doria é despreparado para liderar um projeto nacional. A filiação, tuitou ele na sexta, "é fruto de uma inexplicável imposição estabelecida pelo governador de São Paulo, João Doria, cuja inabilidade política tem lhe rendido altíssima rejeição e afastado seus aliados".

A aproximação do MDB também ajuda a sepultar a possibilidade de o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disputar pelo partido a eleição ao governo em 2022 contra o candidato do PSDB.

Como mostrou a Folha, Doria estruturou seu secretariado com base em escolhas pessoais e técnicas, abrindo pouco espaço a partidos aliados —o que agora cobra seu preço em sua tentativa de formar aliança para 2022. Para driblar esse entrave, o governador tem cedido em movimentos recentes.

Doria contemplou até um partido adversário nas eleições, o PSB, que é presidido em São Paulo pelo ex-governador Márcio França —tido como candidato ao Bandeirantes no ano que vem.

O tucano escolheu o deputado estadual Vinicius Camarinha (PSB) para ser seu líder de governo na Assembleia. França suspendeu Camarinha do partido por ter aceito o convite. Para parte dos membros do governo, a escolha de Doria foi pessoal e não pretendeu atrair o PSB.

Já a escolha de Itamar, enquanto acalma insatisfações na base aliada, cria constrangimento para Doria devido às condenações do deputado.

Itamar é ex-prefeito de Santa Fé do Sul, cidade próxima às divisas com Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, e influente na região. No ano passado, o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) aplicou a ele pena de cinco anos e três meses por crime de responsabilidade em licitação fraudulenta.

A acusação diz que ele participou de um esquema que desviou em 1996, em valores atualizados, R$ 2 milhões de verbas federais da educação. Ele nega ter cometido irregularidades e recorre da decisão.
Sua assessoria diz que a licitação feita pelo ex-prefeito "seguiu todos os trâmites legais, tanto que a prestação de contas do convênio foi aprovada" pelos Tribunais de Contas do Estado e da União.

Além de Itamar e Nunes, Doria já teve outros desgastes ao tentar abrigar aliados com problemas na Justiça em seu governo

O economista Barjas Negri, ex-ministro da Saúde e prefeito de Piracicaba por três mandatos, foi exonerado do posto de subsecretário de Assuntos Metropolitanos, após decisão liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo.

A corte entendeu que Barjas —condenado à perda de direitos políticos e declarado inelegível em 2020, quando tentou a reeleição no município do interior de São Paulo— estava impedido de assumir a função.

Houve ainda os casos de Gilberto Kassab (PSD) e de Alexandre Baldy (PP), que chegou a ser preso no exercício do cargo de secretário dos Transportes Metropolitanos, mas retornou.

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