Bolsonaro ataca Moraes e Lula aos gritos e abandona tentativa de tom moderado

Presidente volta a se exaltar em entrevista no Palácio da Alvorada, acusa Moraes de desgastar governo por 'questão pessoal' e chama Lula de 'pinguço'

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Brasília

Depois de conceder diversas entrevistas após o resultado do primeiro turno da eleição em tom sereno e rodeado de aliados políticos, o presidente Jair Bolsonaro (PL) se exaltou nesta sexta-feira (7) e proferiu novos ataques ao presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com tom de voz agressivo e elevado.

"Alexandre de Moraes, mostre o valor das movimentações. Tenha caráter e mostre o valor das movimentações. É só tentativa de desgaste, isso é bem claro. A minha esposa não tem escritório de advocacia", disse o presidente, aos gritos, em entrevista no Palácio da Alvorada.

"Você está ajudando a enterrar o Brasil, por questão pessoal. Não sei qual, mas é pessoal. Para onde vai o Brasil com essa quadrilha do PT voltando ao governo?", completou Bolsonaro, em referência ao presidente do TSE.

O presidente Jair Bolsonaro durante entrevista coletiva no Palácio da Alvorada - Gabriela Biló-7.out.22/Folhapress

Na entrevista, Bolsonaro ainda disse que a quebra de sigilo autorizada por Moraes contra Mauro Cesar Barbosa Cid, ajudante de ordens do presidente, é um "crime".

"Já desafiei o Alexandre de Moraes, que vazou a quebra de sigilo telemático do meu ajudante de ordens, que é um crime que esse cara fez. É um crime o que esse cara fez. O meu ajudante de ordens, em especial o Cid, é um cara de confiança meu. 'Cid, aquele assunto com o Putin é assim'. 'Aquele assunto com o Joe Biden é assado'. E esse cara [Moraes] consegue pegar tudo para ele", afirmou.

O presidente ainda disse que alguns ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) preferem Lula na Presidência por ter "rabo preso".

"Por que muitos preferem o Lula, alguns do Supremo? Porque vai ser mais orientado, vai ser mandado, vai ter rabo preso e [se houver] vontade de cassar o Lula, se um dia ele chegar, para o Alckmin, amigo íntimo de Alexandre de Moraes, assumir o governo", disse.

Bolsonaro concedeu a entrevista, de cerca de 40 minutos, após se reunir com o apresentador de TV Datena. O presidente abandonou o discurso moderado que vinha adotando desde domingo (2) e voltou a radicalizar.

Além de Moraes, outro alvo das críticas e ataques de Bolsonaro foi Lula. O petista teve desempenho melhor que o do presidente no primeiro turno da eleição, com 48,4% dos votos contra 43,2%.

Na entrevista, Bolsonaro tentou associar o opositor a ataques contra religiosos.

"Se você botarem um pinguço para dirigir o Brasil, um cara sem qualquer responsabilidade que tem um rastro de corrupção, um rastro de deboche com a família brasileira, de ataques a padres e a pastores, de ataques às Forças Armadas, de ataques aos policiais, vocês acham que vai dar certo?", disse.

Datena, de terno escuro e óculos escuros, está em pé, do lado esquerdo da tela. do lado direito, bolsonaro, de camisa branca e diante de um púlpito onde estão posicionados microfones, gesticula, com os braços abertos, enquanto fala
O presidente Jair Bolsonaro durante entrevista coletiva no Palácio da Alvorada, ao lado do apresentador Datena - Gabriela Biló/Folhapress

Com desempenho pior no Nordeste, Bolsonaro disse que pretende reduzir a rejeição e aumentar a quantidade de votos na região mostrando as entregas de seu governo.

"O que o ex-presidente Lula fez pelo Nordeste? Eles ficaram aí 14 anos no poder, nem mesmo o auxílio aos mais necessitados ele conseguiu dar num valor razoável [...] Nós pagamos no mínimo R$ 600, e [o Auxílio Brasil] atende muita gente do Brasil todo, do Nordeste também, pessoas humildes, pobres", disse.

"A transposição do Rio São Francisco, obra que começou a ser pensada por Dom Pedro que, segundo o próprio Lula diz, deveria ter sido encerrada em 2012. Não foi. Por quê? Má gestão, corrupção, desvio, outros interesses. Nós concluímos em 2022, e o reconhecimento coube na pessoa do [ex-ministro do Desenvolvimento Regional] Rogério Marinho, que foi eleito senador pelo Rio Grande do Norte."

Bolsonaro ainda criticou declarações de Lula, que disse que tirará militares de cargos comissionados no governo.

"'Vamos colocar os militares no devido lugar deles, vamos colocar os pastores e padres em seus lugares'. Se lugar de militar é no quartel, e de pastor é na igreja, lugar de ladrão é na cadeia", disse Bolsonaro.

O presidente começou a elevar o tom de voz e a atacar Lula e Moraes enquanto dava entrevista ao lado de Datena. Ele iniciou a entrevista em tom sereno, mas, no decorrer do tempo, exaltou-se quando fazia comparações de seu governo com as gestões do PT.

Datena, por sua vez, manteve-se ao lado sem fazer comentários nem esboçar reação.

Antes, o apresentador havia afirmado que, por ser jornalista, não poderia declarar voto em ninguém, nem em Bolsonaro nem em Lula.

Apesar disso, disse que foi ao Palácio da Alvorada por reconhecer a "gratidão" do presidente, que o convidou para ser candidato a senador e não retirou o apoio mesmo diante de críticas de aliados. No fim das contas, porém, Datena acabou recuando e não foi candidato.

Ao final da entrevista, o apresentador afirmou que "não concorda com muita coisa que o presidente disse" e que "gostaria que as pessoas estivessem mais calmas no momento de conduzir as eleições".

Seu rival na disputa do segundo turno, Lula usou suas redes sociais para criticar o tom alterado de Jair Bolsonaro, afirmando que um chefe de Estado "não pode ficar nervoso".

"Vamos viajar o Brasil, visitar os estados que vão ter segundo turno. E vamos fazer debates. Vi que o Bolsonaro anda nervoso, anda me xingando. Mas ele precisa saber quem quer ser um chefe de Estado não pode ficar nervoso", escreveu Lula.

Bolsonaro reagiu, também nas redes sociais, minutos depois: "o que um chefe de Estado não pode fazer é roubar, seu vagabundo".

Depois da entrevista, a assessoria de Bolsonaro convidou os jornalistas para almoçar com o presidente.

Ele recebeu integrantes da imprensa numa ampla mesa de almoço do Palácio da Alvorada junto com os ministros da AGU (Advocacia-Geral da União), Bruno Bianco, da CGU (Controladoria-Geral da União), Wagner Rosário, de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, e da Secretaria-Geral da Presidência, Luiz Eduardo Ramos.

O prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, que deixou o PSB para se filiar ao PL, também estava presente –pouco antes, havia dado entrevista ao lado de Bolsonaro para declarar apoio ao mandatário.

No almoço, foi servido arroz, salada, dobradinha e filé com ervilha. Depois de comer, o presidente respondeu a perguntas e fez comentários sobre as eleições.

Ele disse que a Bahia é o "estado mais vermelho" do Brasil e que teve uma conversa ao telefone com ACM Neto (União Brasil), que foi prefeito de Salvador e está no segundo turno da disputa pela chefia do Executivo baiano. Até o momento, porém, Neto não declarou em quem votará na corrida presidencial.

O presidente também disse que analisa a recriação do Ministério da Segurança Pública caso seja reeleito e disse que não tem um perfil definido para a escolha dos próximos dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) caso seja reconduzido no Executivo federal.

No entanto, afirmou que deverá ser alguém que "tome tubaína" com ele, ou seja, que tenha uma relação pessoal.

O presidente disse que os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, indicados por ele ao Supremo, por exemplo, fazem visitas ao Palácio da Alvorada. Nunca, no entanto, esses encontros foram registrados nas agendas oficiais do mandatário ou dos magistrados.

Com o ministro Luiz Fux, que deixou a presidência do STF em setembro, por sua vez, ele disse que "raramente" tem conversas. Sobre Gilmar Mendes, ele disse que o ministro "há muito tempo" não vai ao Palácio da Alvorada.

O presidente também descartou indicar o ex-ministro Sergio Moro, que se elegeu senador, para o Supremo. E disse que questionou ao ex-juiz, na conversa que teve com ele nos últimos dias em que selaram acordo para apoio no segundo turno, se acreditava que conseguiria ser aprovado pelo Senado para a corte e que não acreditava nessa possibilidade.

O presidente também disse que não poderia comentar a afirmação da ex-ministra Damares Alves (Republicanos) de que pretende presidir o Senado no próximo ano.

Na noite desta sexta, em transmissão em suas redes sociais, Jair Bolsonaro voltou a atacar Lula e buscou afastar o eleitorado cristão da campanha do petista. Afirmou que sua posição contrária ao aborto se dá agora apenas porque Bolsonaro estaria "pegando mal para ele".

"O cristão que aceitar votar em um cara desses acreditando que ele vai dar picanha pra você, você não é cristão, mas de jeito nenhum", afirmou.

O presidente ainda voltou a se defender das críticas por sua fala recente sobre nordestinos —associação da vitória de Lula no Nordeste às altas taxas de analfabetismo na região— e afirmou que sua esposa é "filha de um nordestino, o Paulo Negão". "Minha filha Laura tem sangue de cabra da peste na veia dela", completou.

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