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Tribunais de contas reagem a decisão que afeta Ficha Limpa

A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de que apenas as Câmaras Municipais têm competência para julgar contas de prefeitos provocou reação dos tribunais de contas, que, em muitos casos, dividiam essa função com o Legislativo.

O novo entendimento afeta diretamente a aplicação da Lei da Ficha Limpa, que determina a inelegibilidade, por oito anos, de candidatos que tiveram suas contas rejeitadas devido a alguma irregularidade irreparável que possa ser enquadrada como ato de improbidade administrativa intencional.

Para o ex-juiz Márlon Reis, um dos criadores da lei, o julgamento da Câmara, que é político, vai acabar isentando os prefeitos que cometeram irregularidades nas contas públicas.

"É muito raro a Câmara rejeitar contas. Os vereadores estão submetidos aos prefeitos. Não analisam a questão técnica, a decisão depende se são oposição ou situação", afirma à Folha.

"A decisão do Supremo libera aqueles que praticaram corrupção nas prefeituras e foram descobertos pelos tribunais de contas", completa.

Marilda de Paula Silveira, doutora em direito público pela UFMG, discorda. "Não existe a fuga de inelegibilidade porque as contas não deixam de ser julgadas. Reconhece-se a validade de julgamento de um órgão diferente", afirma.

O tribunal de contas, de qualquer maneira, é responsável por elaborar um parecer que orienta a Câmara.

Caso o parecer seja pela rejeição das contas, é preciso o voto de dois terços dos vereadores para derrubá-lo e reverter a decisão.

Silveira diz que não é possível fazer um juízo de valor sobre quem julga melhor, os tribunais ou o Legislativo.

"É uma questão de aplicação constitucional. A Constituição fez essa escolha de atribuir o julgamento político às contas de prefeito."

EFEITO NAS ELEIÇÕES

Estudo realizado pela Faculdade de Direito da USP mostra que, nas eleições de 2012, a reprovação de contas foi o motivo que mais gerou inelegibilidade pelas regras da Ficha Limpa —149 casos entre 323 inelegibilidades reconhecidas pela Justiça Eleitoral no Estado de São Paulo.

De acordo com dados da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), cerca de 6.000 prefeitos e ex-prefeitos que tiveram suas contas rejeitadas pelos tribunais poderão escapar da inelegibilidade na eleição deste ano.

Isso porque, para esses gestores, a decisão de reprovar as contas veio dos tribunais e não da Casa Legislativa.

Mesmo sem a mudança, nem todos esses prefeitos e ex-prefeitos ficariam de fato inelegíveis –caberia à Justiça Eleitoral analisar em quais casos as contas foram rejeitadas por uma irregularidade grave.

Ainda segundo a Atricon, esses gestores respondem por ações de ressarcimento na ordem de R$ 3,5 bilhões.

"Se o Supremo diz que o tribunal não julga as contas, nosso entendimento é de que também não pode aplicar multas ou ressarcimentos. Ou seja, esse valor será perdoado", diz Valdecir Pascoal, presidente da Atricon.

Para Silveira, o impacto da decisão do STF sobre a aplicação de penalidades pelos tribunais de contas ainda não foi esclarecido. É possível que, mesmo a Câmara tendo a palavra final, os prefeitos continuem submetidos a multas dos tribunais.

REAÇÃO

A Atricon e o MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), de Reis, pretendem sensibilizar a população e os ministros do STF para tentar reverter a decisão –o que é improvável.

"Nem que seja um voto. A gente perdeu por um voto. A imunização dos prefeitos é um grande retrocesso", afirma Pascoal.

"Tentaremos demonstrar ao STF que essa decisão fere o espírito da Lei da Ficha Limpa. Há suporte constitucional mais do que suficiente para se manter a lei tal como ela é", afirma Reis.

Nesta semana, no julgamento de recursos do caso, o ministro Gilmar Mendes chegou a criticar a lei, dizendo que "foi feita por bêbados". O colega Luís Roberto Barroso discordou: "Acho que a lei é boa, importante e sóbria". O presidente da OAB, Claudio Lamachia, criticou a declaração de Mendes.

Na segunda (22), as entidades têm reunião com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para discutir medidas contra a determinação do Supremo.

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