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'Rio não comporta mais megaeventos e obras', diz Marcelo Freixo

Mídia Ninja - 15.set.2016/Divulgação
O candidato do PSOL à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo
O candidato do PSOL à prefeitura do Rio de Janeiro e deputado estadual Marcelo Freixo

O deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), 49, disputa pela segunda vez a Prefeitura do Rio praticamente sem aliança partidária. Está coligado apenas com o nanico PCB, que não tem vereador na cidade.

Apesar do pouco apoio formal, Freixo aposta na "aliança com a sociedade", em referência a especialistas que reuniu para debater seu plano de governo.

"Não é a aliança tradicional porque a política que se pede hoje não é a tradicional. Temos um quadro de governabilidade melhor do que qualquer aliança partidária", disse, em entrevista à Folha na última quinta-feira (21).

Em segundo lugar nas pesquisas, ele diz que vai se relacionar de "forma republicana" com o presidente Michel Temer, embora considere o governo "golpista"."Os interesses do Rio estarão à frente das divergências."

Para ele, a cidade precisa se planejar melhor após a passagem da Olimpíada. "O Rio não comporta mais megaeventos e obras."

*

Folha - Uma das críticas ao PSOL é de que o partido se empenha mais na defesa do mandato de Dilma Rousseff do que na cobrança pelos casos de corrupção do PT. O que o sr. acha dessa crítica?

Marcelo Freixo - Acho que é injusta. O PSOL não fez parte do governo. Ele não defendeu o governo porque não pertenceu nem teve identidade com ele. Sempre pontuamos críticas muito contundentes no que diz respeito à questão do desemprego, na questão previdenciária, política para as mulheres, indígenas...
Agora, o golpe existiu e foi muito violento. São duas coisas separadas. Uma é a crítica à lógica de governabilidade que levou à prática de corrupção sim, e o golpe.

Em nenhum momento dissemos que não havia corrupção ou que não era necessário investigar. Questionamos a parcialidade da Justiça criminal. Ela também foi política. Mas a crítica à parcialidade não é construída para esconder uma denúncia.

Num comício recente o sr. disse que o que ocorria com o ex-presidente Lula era uma injustiça.
Fiz duras críticas ao PMDB do Rio, às alianças da esquerda com o PMDB, ao modelo de governabilidade do Lula e PT, e ao mesmo tempo disse que o episódio do Ministério Público mais uma vez era equivocado diante da Justiça criminal.

Mas há uma denúncia de que a OAS bancou a reforma num triplex supostamente dele e a guarda de seus bens pessoais.
Se isso for provado, evidente que deve ser investigado. Não existe meia corrupção. Mas tem que ter prova.

Por que o sr. não tem usado a crítica ao que chama de golpe como mote de campanha, assim como tem feito Jandira [Feghali]?
Acho que temos mais condição de falar contra o golpe e contra o PMDB do que qualquer outra candidatura. Quem fez a denúncia contra Eduardo Cunha fomos nós. Até o último momento o governo tentou um acordo. Nós não. Fizemos oposição ao PMDB e não estamos com ele em nenhuma aliança nacional.

Usamos isso na medida certa. A questão é que não temos só isso para dizer. Temos um programa de cidade que disputa com o do PMDB. A gente tem condições de divergir do projeto de cidade do PMDB. Nem todos têm.

Quem não tem?
Quem participou do governo. [Carlos Roberto] Osório, Índio [da Costa], Jandira. Todos participaram do governo.

Como sr. pretende se relacionar com um governo que considera golpista?
De forma republicana. O interesse da cidade está acima das nossas divergências políticas. O governo Michel Temer é oriundo de um golpe. Não vou mudar de opinião em relação a isso. Mas enquanto ele exercer a Presidência, mesmo sendo um governo golpista, os interesses do Rio de Janeiro estarão a frente das nossas divergências.

O PSOL tem dificuldades de formar alianças?
Não, formou várias alianças Brasil afora. O PSOL está crescendo no tempo certo. Não está com as dores de crescimento que outros partidos tiveram. O PSOL hoje disputa com chances as prefeituras de Porto Alegre, Cuiabá, Belém, Rio, Sorocaba, Friburgo, Niterói. O crescimento é de uma trajetória coerente, e não com alianças que não se explicam ou financiamento que não deve ser feito. No Rio foi onde ele mais cresceu. Temos a segunda maior bancada de vereadores, uma das maiores da Alerj e três deputados federais. No Rio é bem maior do que o PSDB, por exemplo.

No Rio vivemos momento complicado em que o PMDB abraçou todo mundo, estava todo mundo no governo. Temos uma fragmentação agora que dificulta a aliança.

Fizemos aliança com movimentos sociais importantes, intelectuais, pensadores. Não é a aliança tradicional porque a política que se pede hoje não é a tradicional. Temos um quadro de governabilidade que é melhor do que qualquer aliança partidária pode apresentar para o Rio. Temos uma quantidade enorme do que há de melhor para governar com uma outra lógica política.
Não é pelo sectarismo do PSOL que alianças não foram feitas. É porque todos estavam no guarda-chuva do PMDB.

O prefeito de Macapá saiu do PSOL dizendo que queria ter "relações mais amplas".
Sim, ele foi se coligar com o DEM. Não podia ficar no PSOL. Teve de ir para a Rede. Aliança com o DEM no PSOL não dá. Aliança para a gente não é para ganhar tempo de TV nem para ganhar eleição de qualquer maneira.

Por que não conseguiu agregar outros partidos no Rio?
Isso tem a ver com conjuntura. O Molon foi para a Rede para ser candidato. É legítimo. A Jandira veio com a aliança PT e PC do B que até fevereiro apoiava o Pedro Paulo. Quando veio o impeachment, isso muda. Eles precisam de uma candidatura, o que também é legítimo. O importante é que tenha uma candidatura progressista no segundo turno. Estamos muito perto disso.

Como sr. pretende ter uma governabilidade na Câmara?
Passa pela mobilização da sociedade.

Mas quem vota são os vereadores.
[Votam] Olhando para a sociedade. Os gabinetes podem estar cheios, a sociedade pode estar mobilizada. A prefeitura pode informar melhor sobre os projetos de seu interesse que estão sendo votados na Câmara.
Olívio Dutra, na década de 80, ganha a Prefeitura de Porto Alegre com dois vereadores dos 21 que a cidade tinha. Ele cria o orçamento participativo e muda completamente o modelo de administração e vira uma referência internacional. Naquela época nem tinha internet.

Pode-se criar um aplicativo para consultar os moradores pelo celular. Pode ter também um conselho de moradores que se reúne com frequência como Nova York e Berlim fazem. Se cria uma cultura de participação, melhora também a relação com a Câmara de Vereadores.

Vou conversar com todos os vereadores eleitos, desde que não tenha sido eleito pelo banditismo político. Quero que o PT, PSDB, PC do B e todos os partidos elejam bom vereadores. Mas vamos acabar com a ciranda de cargos comissionados para o bem do Rio.

A única aliança partidária é com o PCB, tido como mais radical do que o PSOL. O site deles nesta quinta (21) tinha uma saudação a um encontro de guerrilheiros das Farc.
PCB é um partido com quadros intelectuais no Rio. Nosso programa não se restringe a nenhum partido, mas na discussão com toda a sociedade.

É a primeira vez que o sr. declara ao TSE como ocupação deputado. Virou político profissional?
Não sabia disso. Sou professor. Deputado é um instrumento. Fui professor até 2010. Só não continuei dando aula por conta da CPI das Milícias, que me fez ter que andar com segurança.

O sr. acha possível governar com essa necessidade de segurança?
Uma cidade em que o prefeito não pode circular tem problemas para além do prefeito, né? Temos que enfrentar. Eu não tenho problemas de segurança por conta da minha vida privada. Ao contrário de outros deputados, não fui parar em delegacia por problemas domésticos. As vezes que tive acesso a segurança foi por determinação de função pública.

O sr. acha que corre mais risco como prefeito do que como deputado?
Acho que não, pela visibilidade que tem.

Qual sua avaliação sobre o legado da Olimpíada?
O problema não está na Olimpíada, mas no desperdício da oportunidade. Você chega no final de uma Olimpíada com mais da metade das escolas sem quadra poliesportiva, sem uma política de esporte que chegue nos lugares mais pobres.

Houve também uma insistência no modelo rodoviário. Evidente que o BRT melhora o sistema rodoviário. Mas insiste no modelo rodoviário. Não se pensa a bicicleta como um modal como todas as cidades do mundo hoje pensam. As ciclovias continuam fazendo parte da Secretaria Meio Ambiente, porque interessa aos empresários de ônibus.

Não tem uma integração tarifária. Em qualquer cidade do mundo um bilhete pode ser usado por uma semana em trem, barca, metrô, ônibus. Isso porque há um poder público que pensa a mobilidade. Aqui não há poder público. Há a Fetranspor que determina o que acontece no transporte do Rio.

O VLT é mais caro e demoraria mais para ser construído.
Mas a médio prazo você ganha muito mais porque é efetivamente um transporte de massa.

Temos algumas PPPs em andamento. Como será sua relação com as grandes empreiteiras?
O que estiver no contrato, temos uma responsabilidade republicana. Contrato é contrato. Vamos fazer auditorias nos contratos tanto das empreiteiras como OSs. Mas um contrato que estiver correto será cumprido. A gente não quer demonizar a iniciativa privada. Queremos ter uma boa relação, mas as parcerias precisam ter um interesse público mais nítido. Às vezes tenho dificuldade de ver o que o poder público ganha com determinadas parcerias.

Eu queria pensar também na parceria público-público. Por que não temos uma parceria com a Fiocruz na área de saúde? A Cidade Universitária da UFRJ é muito distante da cidade do Rio de Janeiro. Uma série de pesquisas sobre mobilidade urbana na Cidade Universitária não são usados, ou sequer do conhecimento, da cidade do Rio. Nem parece que uma está dentro da outra.

Para tirar minha capa de maldade com a rede privada, tem duas coisas de modelo de desenvolvimento do Rio que são muito mal aproveitadas. Tenho muito diálogo com os donos de bares e restaurantes. Eles são os que mais empregam jovens, cerca de 25%. É um setor que nos interessa uma parceria. Os polos gastronômicos reclamam do completo abandono da prefeitura.
Há também a economia colaborativa em que o Rio não desenvolve nada.

Mas não tem a mesma escala de [geração de empregos em] obras de infraestrutura.
São alternativa ao modelo de desenvolvimento. O Rio não comporta mais essa quantidade de megaeventos e obras. É uma cidade que tem cuidar mais das pessoas.
Mas no que diz respeito às obras, uma das coisas que defendemos são obras de saneamento básico com mão de obra local.

Sempre que o sr. cita o prefeito Eduardo Paes e uma obra com a Odebrecht, por exemplo, aponta como se já fosse um indício de fraude. Como funcionaria essa relação dessa forma?
Não acho que a empresa já traga fraude. Acho que a maior parte das fraudes é responsabilidade do poder público que exige propina quase como de forma contratual. Muitas criaram seu departamento de propina porque não conseguiriam se relacionar com o Rio de Janeiro. Mas isso não as isenta de responsabilidade. A corrupção é sempre de mão dupla. Acho que há uma peemedebização da vida política no Rio que fez com que a relação com as empresas se tornassem algo muito ruim. Não acho que toda empresa seja necessariamente corrupta, que seja intrínseco. Mas fato é que no contrato da zona portuária tem o dedo do Eduardo Cunha num esquema de corrupção. Maracanã idem.

O sr. foi um grande crítico da derrubada do elevado da Perimetral. Qual sua avaliação atual sobre a obra?
O dinheiro gasto ali faria boa parte do saneamento da zona oeste. Estou dizendo que a obra e a consequência foram ruins? Não. Está bonito. Mas acho que a cidade poderia ter participado dessa decisão um pouco mais. Não quer dizer que não deveria ter sido feito. Acho que tem que ter mais debate e possibilidade de consulta. Não dá para o prefeito agir como um príncipe. O problema é o método.

Governar em determinado momento não é tomar medidas impopulares?
Como em qualquer lugar do mundo. Mas é o exercício da democracia. Você não pode tomar uma decisão sobre um bairro sem ouvir aquele bairro, aprofundar o debate. Pode ser que tenha que se tomar decisões impopulares. Cada uma a seu momento. Mas o método da democracia tem que acontecer. Todas as cidades do mundo que avançaram fizeram assim.

Qual sua avaliação sobre a gestão Eduardo Paes?
O instituto Rio Como Vamos fez uma pesquisa em 2011 e 2015 perguntando aos cariocas quem sairia ou não do Rio. A proporção era de 70 e poucos não sairiam e 20 e poucos sairiam. Em 2015 isso se inverte. Esse é um termômetro do que foi a gestão Eduardo Paes. Teve acertos, como o Parque Madureira. Mas a cidade tem que ser pensada como um todo. A expansão da Clínica da Família e do atendimento básico de saúde é algo com o qual a gente concorda. Mas ele fez isso através de OSs sem nenhuma transparência. Temos que reconhecer avanços. Mas a cidade se tornou uma das mais caras do mundo, injusta e mais violenta. O IDH da Rocinha é comparável ao de Botswana e da Gávea, ao da Noruega. É o único lugar do mundo que você consegue ir de Botswana para a Noruega de mototáxi.

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