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Crônica da campanha: Com discurso antipolítico, Doria dividiu seu partido, mas cresceu com a TV

Gabo Morales/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 05-09-2016: O candidato a prefeito de Sao Paulo Joao Doria Jr (PSDB) posa durante evento de campanha no Mercado Municipal, regiao central de Sao Paulo, em 5 de Setembro de 2016. (Foto: Gabo Morales/Folhapress, REVISTA) *** EXCLUSIVO REVISTA: NAO PUBLICAR SEM AUTORIZACAO ***
O candidato a prefeito de São Paulo João Doria (PSDB) posa durante evento de campanha no Mercado Municipal

O ambiente com paredes envidraçadas, decorado nas cores branco, preto e cinza, em nada lembra o de um comitê de campanha. Mais parece um escritório comercial. Dois objetos, entretanto, dão pistas da personalidade que dirige o local.

Passando a entrada do QG, no Jardim Europa, um quadro verde e amarelo, estilo Romero Britto, retrata João Doria (PSDB) com um largo sorriso branco. Na sala de reuniões, uma placa determina: "Ao sair, apague a luz, alinhe as cadeiras e os objetos em cima da mesa".

Doria é obcecado com controle e organização. Mesmo nas reuniões internas mais rotineiras, cada participante tem o lugar indicado na mesa por plaquinhas com seus nomes. Até o modo como o "serviço de cafezinho" deve ser prestado segue o padrão determinado pelo candidato.

De certa forma, o aspirante a prefeito de São Paulo levou para dentro de seu comitê a máxima que exibe na propaganda eleitoral: "Não sou político, sou um gestor". A dinâmica assustou o grupo político que passou a apoiá-lo após vencer, debaixo de contestação, as prévias do PSDB, em março deste ano.

Neófito em disputas eleitorais, Doria foi fortemente criticado por figuras proeminentes do PSDB no Estado de São Paulo. De saída, seu único e mais valioso ativo foi o governador Geraldo Alckmin, fiador de sua candidatura.

No início, teve a campanha sabotada por nomes como Fernando Henrique Cardoso, José Serra, José Aníbal e Alberto Goldman. A resistência era fruto da disputa acirrada que travou com Andrea Matarazzo, militante do PSDB por mais de 20 anos, nas prévias partidárias.

Antes do desfecho do segundo turno, Andrea abandonou a disputa interna e o partido, acusando Doria de ter comprado votos e de ter se beneficiado da máquina do governo estadual, com o endosso de Alckmin.

Publicamente, Doria sempre minimizou a importância desses episódios e ressaltou a lisura de sua eleição. Nos bastidores, porém, aliados admitem que este foi o momento mais desgastante desde o início da pré-campanha.

As cicatrizes permaneceram até a reta final do primeiro turno da eleição municipal, que acontece neste domingo (2). Faltando menos de dez dias para a votação, um terço da direção do PSDB paulistano abandonou seus cargos em boicote a Doria.

"A prévia não divide. Ela escolhe", disse Alckmin à Folha, na última sexta (30). "Ele foi escolhido numa votação interna com 7.000 eleitores. Muitos municípios não têm um colégio eleitoral como esse. Não foi uma escolha de gabinete, com dez pessoas", respondeu.

O governador contou que, quando Doria manifestou o desejo de disputar a Prefeitura de São Paulo, decidiu submeter o aliado a um teste. "Coloquei diante dele várias razões para que ele não fosse candidato. O João é muito perseverante."

Há quem diga que o candidato é, além disso, teimoso. No início da campanha, seus principais conselheiros defenderam que ele modulasse o discurso antipetista a depender do público a que se dirigisse. Ele não quis. Argumentou que seguiria seu instinto. Deu certo.

João Doria apostou em duas frentes que se mostraram em alta com o eleitorado: a antipolítica e o antipetismo. A fórmula, no entanto, não o impediu de cometer deslizes. No momento em que começava a expor seus planos para a cidade, Doria prometeu extinguir secretarias.

"Gestão", repetiu o candidato, "é reduzir custo. Sem penduricalhos". Entre os "penduricalhos", apontou estruturas de pastas voltadas a negros, pessoas com deficiência e mulheres. Para piorar, citou como alvos da tesourada duas secretarias que não existem: juventude e LGBT.

A declaração foi dada durante visita em uma feira livre no bairro dos Jardins. Numa agenda típica de candidato, Doria comeu um pastel e tomou um pingado. Flagrado fazendo cara feia para a comida, pediu para que não o fotografassem mais enquanto se alimentava. No dia seguinte, sites estampavam imagens dele comendo.

APRESENTADOR

A maré mudou com o começo da campanha na TV. Apresentador de programas de entrevistas, Doria exibiu desenvoltura na frente das câmeras. Candidato de uma coligação que une 13 partidos, dispunha do maior tempo de propaganda entre todos os adversários.

O crescimento nas pesquisas eleitorais veio na sequência. E, com isso, a maioria dos adversários internos de Doria foi deixando os holofotes e restringindo as críticas aos bastidores.

FHC, Aníbal, Aloysio Nunes Ferreira e até Aécio Neves (PSDB-MG), presidente nacional da sigla e rival interno de Alckmin pelo posto de presidenciável em 2018, pediram votos para o candidato na TV. Na reta final da campanha, Doria havia se descolado dos outros candidatos a prefeito, praticamente assegurando uma vaga no segundo turno.

Assistiu de camarote à disputa fratricida que Celso Russomanno (PRB), Marta Suplicy (PMDB) e Fernando Haddad (PT) travaram para enfrentá-lo na etapa seguinte da eleição. Usou esse tempo para afiar o discurso.

Chamado de lobista, deixou de exibir irritação. Passou a dizer que defende uma administração "moderna, atual". Acusado por Luiza Erundina (PSOL) de "fazer política negando a política", condição que o relegaria ao posto de "um político tão velho quanto qualquer outro político velho deste país", recorreu a um outro bordão: "Respeito sua trajetória, mas penso diferente".

Doria deu um jeito de transformar sua polêmica trajetória empresarial, baseada em relacionamentos com pessoas influentes, em um ativo eleitoral. Descobriu, como descreveu um aliado, que não é ruim exibir riqueza aos penalizados pela carestia.

"Não quero nivelar na pobreza", passou a dizer Doria. "Quero distribuir a riqueza."

O candidato também encontrou uma fórmula simples para redefinir sua condição na disputa. "Não sou o candidato dos ricos. Eu sou 'o' candidato rico."

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