Gastronomia e cultura atraem um em cada três visitantes de shoppings

Há dez anos, se divertir no shopping era quase sempre sinônimo de comprar ou ir ao cinema e comer um lanche. Hoje, a escolha é mais abrangente: há teatros, festivais gastronômicos, exposições, bares, restaurantes e padarias entre as alternativas, que irão crescer nos próximos meses.

Só em 2014 foram realizados dois encontros de food truck (no Iguatemi e no Center Norte), uma apresentação do maestro João Carlos Martins com integrantes da Vai-Vai, no shopping Pátio Higienópolis, e mostras temáticas como "Segredos do Egito" -que trouxe aumento médio de 10% no fluxo de visitantes do MorumbiShopping.

Até o fim do ano, virão atrações como uma mostra do artista holandês M.C. Escher no JK Iguatemi e a abertura de uma versão descontraída do restaurante do chef Jun Sakamoto, no Iguatemi da Faria Lima.

Com esse leque maior de opções, mais gente tem ido ao shopping sem pensar nas vitrines. Segundo estudo de maio deste ano da Abrasce (Associação Brasileira de Shoppings Centers), embora 37% dos paulistanos declarem ir aos centros para comprar, a procura por alimentação tem crescido.

Há cinco anos, 15% afirmaram ter como objetivo principal a gastronomia. Atualmente, esse percentual é de 22%. Somado ao total que busca cinemas, teatros, exposições e outras atividades (11%), os índices quase se equiparam.

Editoria de Arte/Folhapress

O designer Pedro Gerab, 28, prefere frequentar lojas e restaurantes de rua, mas está cedendo. "Geralmente vou ao shopping pelo cinema, mas a última vez foi para a abertura da SP-Arte/Foto. Aliás, todas as vezes que eu fui ao JK Iguatemi foram por causa disso."

Idealizada por Fernanda Feitosa, 47, a feira de fotografia teve sua primeira edição, no Iguatemi, há sete anos. "Hoje em dia, o público está na casa dos 12 mil visitantes", calcula. "Os shoppings têm um tráfego de pessoas diversificado. Eles podem assumir o papel de um difusor cultural, por que não?", questiona a empresária.

Para Robert Richard, 60, curador do espaço cultural do Continental, "levar uma exposição para dentro do shopping é o que há de mais contemporâneo". O shopping da zona oeste, quase em Osasco, recebe mostras que unem trabalhos artísticos a propostas de conscientização, como em "Soutien", que alertava sobre o câncer de mama.

"Uma minoria frequenta museus. O shopping já tem público garantido. A intenção é colocar a obra de arte no caminho das pessoas", defende Richard.

FILAS PARA COMER

Esses estabelecimentos também têm atraído restaurantes badalados, cujas refeições ultrapassam os R$ 100 por cabeça. O Spot conta com uma filial dentro do JK Iguatemi desde o ano passado. Nos próximos meses, o Iguatemi Faria Lima receberá uma unidade do Maní, de Helena Rizzo, e a casa de comida japonesa Junji, de Jun Sakamoto.

"Muitas pessoas se sentem inibidas de vir ao meu restaurante, por isso pensei em abrir outro com serviço mais descontraído", diz o chef. Na casa que leva seu nome, em Pinheiros, (zona oeste), o menu-degustação sai por R$ 295 e é servido num balcão para somente oito comensais.

Há novidades também para o café da manhã. A padaria belga Le Pain Quotidien tem lojas dentro dos shoppings Cidade Jardim e Vila Olímpia. O West Plaza terá em breve uma franquia da St. Etienne Padaria Gourmet. O Ibirapuera planeja transformar a área onde havia um supermercado em "espaço gourmet". "Buscam-se restaurantes que melhorem a oferta de alimentação e rejuvenesçam o público", explica o gerente de marketing do Ibirapuera, Ricardo Portela, 39.

O happy hour também tem vez. No West Plaza, há um bulevar com bares que ficam abertos até o último cliente. Esses estabelecimentos têm acessos independentes das entradas do shopping e dão direto para a rua.

Essas novidades tentam repetir o sucesso de redes como o Outback, que tem 12 restaurantes em shoppings paulistanos. Uma delas, a do Center Norte, é a que mais fatura no mundo. A espera para entrar pode chegar a duas horas. "Conseguir uma grande área bem localizada em espaços urbanos é difícil. Os shoppings viabilizam isso", aponta Salim Maroun, presidente do Outback Brasil, conhecido por servir a cebolona Bloomin' Onion.

Editoria de Arte/Folhapress

DE DJAVAN A JENECI
Eventos nos shoppings são comuns desde que eles se espalharam pelo Brasil, a partir dos anos 1970. O que mudou foi o porte das atrações: as exposições, por exemplo, deixam o modelo de cartazes no corredor para ocupar áreas exclusivas. Em vez de um cantor anônimo que dispara hits de Djavan na praça de alimentação, nomes emergentes da MPB, como Marcelo Jeneci, fazem shows gratuitos.

Para o público, ter acesso a várias atrações no mesmo lugar permite economizar tempo no trânsito. Ao sair de uma peça, há opções para jantar a poucos passos de distância. A sensação de segurança gerada por um lugar fechado é um convite para esticar o passeio até mais tarde. O boliche Villa Bowling, no Vila Olímpia, fica aberto até as 3h de domingo.

Quanto mais atividades são feitas no shopping, mais lucro para o empreendimento, que leva uma parcela do faturamento de cada inquilino. O ingresso de teatro, por exemplo, é mais caro que o de cinema. "Mesmo shoppings que já são cheios podem ganhar mais dinheiro ao investir em lazer", observa Denise von Poser, especialista em marketing.

Para os negócios voltados ao entretenimento, os shoppings trazem garantia de visitação: o West Plaza, por exemplo, recebe 33 mil pessoas por dia. "O shopping oferece fácil acesso para o público e até rede de esgoto, por um preço não muito distante de outros terrenos nos arredores", destaca Rody Jardim, 29, diretor do Circo dos Sonhos, que se mudou para o estacionamento do Mooca Plaza, na zona leste. "Esses espectadores estão acostumados a ver TV paga, cinema e teatro, então precisamos mostrar um espetáculo completo."

MUDANÇAS NA EXPERIÊNCIA
Especialistas apontam que a mudança dos shoppings também reflete alterações nos hábitos de compra, principalmente a busca por experiências. "O despertar dos sentidos como cheiros, imagens e sons podem ser ferramentas para estimular as compras", diz José Roberto Baldin, professor de MBA da Faap. "A alta da inflação e a diminuição do crédito reduziram as intenções de compra e favorecem o escapismo e a busca pelo lazer", avalia.

A solução, então, é diversificar o "mix" de atrações. O shopping Frei Caneca aumentou em 26% o fluxo de clientes e em 38,5% as vendas desde a reforma que trouxe uma livraria, uma Starbucks e um Outback, em 2013.

A adaptação também responde ao avanço do comércio eletrônico nas vendas de roupas e calçados, os produtos mais comuns nas vitrines dos shoppings. O estudo da Abrasce aponta que 71% dos frequentadores paulistanos já deixaram de comprar em lojas para fazer um negócio virtual. "Moro ao lado de dois shoppings, mas prefiro a internet. Não tem fila e pago menos", conta Bruno Nagumo, 29, coordenador de desempenho.

Para Silvia Camargho, diretora de marketing da JHSF, responsável pelo Cidade Jardim, um modelo não prejudica o outro. "O comércio on-line não substitui o prazer de uma visita ao shopping, que agrega lazer e serviços."

Porém, a evolução ainda não chegou a todos: vários empreendimentos ainda embalam o jantar com músicas batidas. "Os shoppings ainda engatinham em matéria de lazer", avalia a consultora Denise von Poser. Ela destaca a falta de atrações específicas para idosos.

Uma lei municipal determina que centros de compra com mais de 30 mil m² tenham um teatro. Com isso, vários empreendimentos correm para construí-los. O Theatro Net SP, aberto no Vila Olímpia, custou cerca de R$ 10 milhões. Os shoppings Metrô Santa Cruz e Villa-Lobos também preparam novas salas de espetáculo.

Pela regra, ao menos outros seis endereços precisam ter estruturas do tipo. Entre eles, o MorumbiShopping e o Pátio Paulista.

A capital tem hoje 53 shoppings. Outros três devem abrir até 2015.

Até a década de 1990, a maior parte dos cinemas ficava na rua. A migração para os shoppings foi rápida e até agora pouco revertida. Se depender da vontade dos centros de compra, teatros e restaurantes terão o mesmo destino.

*

Veja as próximas atrações que serão realizadas em shoppings.

JK IGUATEMI
Exposição "Experiência Escher" (24/10 a 23/11).

IBIRAPUERA
9ª Mostra de Teatro Infantil
(4 a 26/10 aos sáb. e dom.). De 2/10 a 30/11 o estabelecimento abriga um ateliê temporário no qual exibirá quadros do artista Israel Madeira, que realizará pinturas ao vivo.

WEST PLAZA
Seu bulevar abrigará uma filial da padaria St. Etienne a partir de janeiro de 2015.

MORUMBISHOPPING
Até 19/10 o local realiza a feira de livros Book Lovers Kids, que aborda a literatura infantil no mês da criança.

IGUATEMI
Realiza o projeto "Style Me", que oferece palestras sobre moda, e também recebe peças de teatro infantil todos os domingos em sua filial da Livraria Cultura. Na primeira quinzena de novembro deve ser inaugurado o Junji, restaurante do chef Jun Sakamoto.

VILA OLÍMPIA
Encerra a edição de 2014 da série Grandes Encontros, com show gratuito em 19/10 (atração não foi definida). O projeto recebeu nomes como Fernanda Takai, Luiza Possi e Marcelo Jeneci. O Theatro Net SP apresenta a peça "Bem-vindo Estranho", com Regina Duarte (até 12/10), e shows de Martinho da Vila (8/10) e Elba Ramalho (25/11).

FREI CANECA
Abriga, de 2 a 17/10, uma exposição com personagens de desenho animado que reúne criações de trajes em miniatura. Na mesma data apresenta uma exposição de bonecas Cupcake Surpresa personalizadas por artistas de diversas partes do mundo.

CONTINENTAL
Aulas de ioga (segunda, quarta e sexta de manhã; turmas lotadas) e tai chi chuan (terça e quinta das 19h30 às 20h30). Também apresenta exposições em seu espaço cultural.

LIGHT
No dia 26/10, promove tour interno abordando a história do edifício antigo que serve de sede. Também organiza passeios ciclísticos por pontos turísticos do centro.

SÃO BERNARDO PLAZA SHOPPING
Recebe nove esculturas da mostra "Mônica Parade", que reúne estátuas customizadas da personagem icônica de Mauricio de Sousa. Até 2/11.

PÁTIO HIGIENÓPOLIS
Um painel de 6 X 3,5 m feito pelo grafiteiro Eduardo Kobra, retratando os frequentadores do local, ficará exposto de 22 a 31/10.

CIDADE JARDIM
Nos sábados e domingos de outubro será realizada, no terraço do espaço, a "Caça aos Bichos do Cidade Jardim". A atividade, gratuita, é voltada para crianças.

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