O Melhor de sãopaulo - Compras & Mimos 2014

Blogueiras cobram até R$ 40 mil por postagem de marcas

"Amei esse vestido! Como faço para comprar?", perguntou a leitora Cláudia para a blogueira Lalá Noleto, 29, na página de internet em que ela mostra as roupas que veste, os pratos que come e as viagens que faz.

Se a leitora tivesse lido até o fim o texto de Noleto (com frases como "As roupas mais que bacanas, com preços incríveis para alegrar o Natal de todo mundo"), teria encontrado um link que a levaria em um clique para a loja que vende o produto. E, se olhasse no canto superior direito da tela, veria uma palavra em letras menores avisando que aquilo era um anúncio, com custo de R$ 7.000.

O valor vem de uma planilha enviada a agências de publicidade, com preços do espaço no maior conglomerado de blogs do país, o F Hits.

Entre as quase 30 páginas pessoais englobadas, há de opções em três dígitos, como uma menção da sua marca no "Juliana e a Moda", por R$ 950, até ofertas ao preço de um carro, caso de texto no blog da atriz global Sophia Abrahão, 23, que sai por R$ 32.500, segundo a tabela.

Cabe a Alice Ferraz, uma morena de 44 anos e também blogueira, negociar a publicidade das páginas.

Foi ela que há três anos fundou a F Hits e diz que os negócios "vão bem, obrigada". Marcas como C&A e Samsung já compraram anúncios, e o escritório "está em expansão".

Mas dez marcas de moda que pagam por textos escritos por blogueiras afirmaram ainda não ter comprovado a eficiência do modelo.

A grife americana Kate Spade é uma das poucas a falar abertamente sobre "fazer parcerias" com blogueiras (é o jargão predileto da categoria para dizer vender publicidade).

"Vemos essa plataforma como um componente dentro do nosso plano de marketing, para nós, ela nunca funcionaria sozinha", diz a marca.

"Parcerias e posts pagos funcionam tão bem quanto uma foto espontânea, mas é preciso haver uma sinergia entre o estilo e o universo da blogueira e do blog com a marca."

E colocar um produto na mão dessas invejadas garotas vende? "Já houve casos com bom nível de vendas, mas nunca de esgotar. No e-commerce' [comércio on-line], vemos mais vendas no dia do post e mais algumas até dois dias depois."

Ainda assim, os profissionais de marketing da Kate Spade consideram haver "pouca evidência que os posts alcancem a audiência com uma força considerável para consumir marcas premium e de luxo".

Arte

É o caso de Francisco Ventura, oculista de celebridades como Marília Gabriela e Claudia Raia, que já fez óculos para blogueiras e apareceu no rosto de várias delas em fotos vistas por milhões. Mas não sentiu retorno por aparecer nas páginas. "Se vendi nove, foi muito."

Por serem contadas nos dedos das mãos, ele se lembra em detalhes de algumas dessas compras.

"A última foi uma senhora já nos seus 50 anos que trouxe o tablet com a foto de uma blogueira de 19, 20 anos, usando uns óculos meus. Pensei em perguntar: São para sua filha?', mas ainda bem que não falei. Ela disse que eram para ela mesma."

O estilista Walério Araújo afirma que a exposição nessas páginas pode não funcionar para marcas pequenas, como a sua. "Já pediram muita peça de graça. Até usaram coisas minhas que compraram, mas nunca tive um cliente por causa disso."

Para o analista de mídia Roberto Alcaide, esse mercado "ainda é quase uma terra de ninguém". "Cada blogueira cobra o que quer e é difícil medir o retorno para as marcas. Acredito que, dentro de uns cinco anos, haverá estudos e informação para descobrir se e para que produtos essa publicidade funciona. Mas, por enquanto, ainda é um tiro no escuro. Questão de crença."

Alice Ferraz defende que fazer propaganda se associando a essas pessoas físicas tende a funcionar melhor com ações seguidas do que só com um texto ou foto. "As pessoas ainda compram um só post, sem plano de divulgação, pensando: Gosto dessa blogueira'. Estamos caminhando para a profissionalização."

Essa profissionalização será sacramentada no início do ano letivo de 2015: é quando começa a ser ministrada a primeira "faculdade de blogueira" do país (e do mundo, segundo a faculdade Belas Artes).

O curso tem mensalidade na casa dos R$ 2.000 e dura dois anos. As inscrições foram "muitas". "É a democratização desse trabalho. Há pessoas com o estilo inato, já outras podem aprender a escrever", diz Ferraz, também por trás desse projeto.

Um caso que deve ser estudado na escola será o blog de Thássia Naves, mineira de 25 anos, 1 milhão de amigos no Instagram e 5 milhões de leitores mensais na sua página.

A popularidade de Naves a permite pedir regalias em contratos. Uma marca que a chamou para posar na Europa diz que ela exigiu três passagens de classe executiva, além do cachê –uma delas para a mãe. A blogueira não fala sobre publicidade.

Mas a faz muito bem: uma linha de roupas que assinou vendeu mais do que as peças projetadas pela cantora Claudia Leitte em uma coleção de dez famosos que a Riachuelo fez em janeiro. A sãopaulo apurou que uma segunda parceria está a caminho –a marca não confirma.

Mas o grosso das "it girls" profissionais está longe de tal glamour.

Claudinha Stoco, 26, que há seis anos assina com seu nome um blog de beleza, integra a "classe média" da categoria. Vive dela, mas não anda de jatinho. "Comecei como um hobby e hoje é a minha profissão."

Além de publicar 15 textos por semana, ela faz três vídeos para seu canal no YouTube. A última empreitada foi o Claudinha Gourmet: "Ensino receitas rápidas e saudáveis".

A nova seara no vídeo pode render mais contratos. "Os banners que tenho no blog são pagos mensalmente, e também faço publieditoriais, tanto no blog como em vídeo."

Há casos de caminho inverso, em que uma empresa vira blog para ajudar na sua divulgação. Paula Martins, 42, tem um escritório de conteúdo de moda. Faz reportagens para sites, revistas e marcas. Há três anos, sentiu a necessidade de estar on-line e montou o "Look do Dia". "O blog é um complemento."

Mesmo "curtida" por 55 mil pessoas no Facebook, a página não virou seu ganha-pão. "Ele tem um rendimento, obviamente, porque fazemos parcerias, mas não compete com nenhum dos outros serviços."

Também há uma nova geração que faz sucesso sem se deixar iludir. Ana Carolina, 19, toca o "Fashion Sandwich" há cinco anos e recebe 600 leitores diários –a maioria mulheres abaixo dos 20 anos. Publica todos os dias, mas não se considera uma trabalhadora. "É um hobby. Eu não vivo dele, ele não é minha profissão", diz a estudante de jornalismo, que planeja estagiar. Não que viva sem dinheiro. "Me procuram mais do que eu fecho com as empresas." Diz que cinco marcas a sondaram no último mês. "A gente negocia."

Até porque a vida de blogueira não é tão fácil: "As pessoas têm essa impressão de que é só dinheiro. Mas demora muito tempo para você criar um nome e as empresas te procurarem", diz a veterana de 19 anos.

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