Natal

Panetones de luxo são feitos por marcas que cobram menos da metade

A designer Luara Zomignan está parada no corredor do shopping Frei Caneca, em dúvida se compra o panetone Toffee da Amor aos Pedaços ou o Caramelo do Starbucks.

Tanto faz, Luara: os dois são feitos pela mesma fábrica, listam os mesmos ingredientes em ordem idêntica na sua composição e têm sabores "muito parecidos" na análise de cinco especialistas. Só os preços que não se parecem.

A Casa Suíça faz os panetones das duas marcas e cobra R$ 18,40 por um do mesmo tamanho do vendido na Amor aos Pedaços por R$ 48.

A diferença de preço é de 263% -dá para comprar mais de dois do mais barato com o preço do mais caro.

Esse é o caso de maior diferença de preço, mas outras marcas também produzem em seus fornos doces para grifes. O panetone Fasano, por exemplo, é da Bauducco.

A prática é comum e pode ser percebida consultando o nome do fabricante nas embalagens. Mas 30 clientes entrevistados em docerias como a Kopenhagen e a Ofner disseram não ter reparado no detalhe.

"Cada cliente possui uma receita especial", afirma a Casa Suíça, que ainda diz ser "um prazer" representar outras empresas. Tanto a Amor aos Pedaços quanto a Starbucks informam que suas receitas são exclusivas. Os recheios são "desenvolvidos em função de bebidas tradicionais", afirma a rede americana.

O padeiro Felipe Benjamin Abrahão, 28, e a professora de panificação do Senac Samara Trevisan Coelho, 31, pedem licença para discordar.

O caramelo e o chocolate trufado que preenchem o bolo foram considerados "o mesmo recheio" dos da Casa Suíça e da Amor aos Pedaços.

"Eu não entendi por que se chamam trufados. Eles não têm gosto de trufa. Cheiram a álcool e deixam gosto de sal na boca", avalia Tess Abreu, doceira da Adoro Brownie.

"Parece que os recheios saíram de um balde, são bem industrializados", diz Edward Davies, 30, que há um ano voltou da Suíça para São Paulo e aqui abriu a Éclair Moi Paris.

"Os dois são muito parecidos e também têm em comum não ter gosto de panetone", diz Gleusa Ferreira, 61, à frente das padarias Bologna e Saint Germain e do sorvete Vipiteno.

QUESTÃO DE MASSA

Nos testes às cegas convocado pela sãopaulo, a massa que saiu ganhando foi a da Ofner. Ou seria da Kopenhagen? Não importa: a chocolataria compra os préstimos da doçaria e as bases dos dois panetones são "iguais" na opinião dos críticos, ainda que a quantidade de frutas cristalizadas e de uvas passas varie "um pouco" e o da Kopenhagen tenha cobertura de castanhas.

"A massa do bom panetone tem de fazer um véu quando você a puxa com o dedo. Só esse [o da Ofner] faz isso", avalia a professora Coelho. O doce ideal tem de ser úmido mas preservar consistência com liga, ensina.

"Esses dois são iguais. Ah, não são: tem uma casquinha com castanhas de diferença", diz a doceira Tess Abreu. "É um bom aroma."

A Kopenhagen afirma: "O produto é supervisionado por profissionais nossos, a produção é exclusiva Kopenhagen, com nossa receita e nossos insumos". A finalização do doce também é feita pela doceria.

A Ofner não comenta -alguns contratos são regidos por cláusulas de confidencialidade, segundo empresários dos doces.

Outro caso de forno que cozinha para fora é a Bauducco, que assa os pães de fim de ano do grupo hoteleiro de luxo Fasano. Mas só de olhar para a versão clássica da Bauducco e a do Fasano os profissionais do pão já notaram diferença.

"A fermentação é mais bonita, a massa tem menos gosto de essência. É bem menos seco [que o tradicional da Bauducco]", afirma Coelho. "A apresentação deste [do Fasano] é impecável", diz Davies, o especialista em éclairs (ou bombas).

O Fasano afirma que sua receita é "própria e diferenciada". A Bauducco não respondeu a duas semanas de pedidos de entrevista.

Terminado o teste, o doceiro Davies ainda pensava no pão festivo: "Eu vou atrás de um panetone caseiro, que leva até seis semanas para ficar pronto. Aí, sim, será único."

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