Edi Rock, dos Racionais, diz que rap é livre e pode ser feito em todo lugar

Edi Rock, 44, um dos integrantes do quarteto de rap Racionais MC´s, responde à mensagem da sãopaulo sobre se seria possível conversar com ele por telefone naquele dia.

"Sim. Estou almoçando agora [às 15h40]. Depois vou buscar meu carro no mecânico, aí tô livre."

A semana que antecede o show de lançamento de "Cores e Valores", no Espaço das Américas, neste sábado (20/12), com ingressos a R$ 140, está corrida. Ele chegou de apresentação em Belém (PA) e ainda fez um som na Vila Madalena.

Leia, abaixo, trechos da conversa.

*

sãopaulo - Qual a diferença entre fazer rap aos 20 e poucos anos e agora, depois dos 40?
Edi Rock - Agora a gente tem seguidores, tem fãs. Antes, as pessoas não conheciam nosso trabalho, nossa cara, o que a gente queria mostrar, por que a gente veio. Agora, as pessoas curtem a gente, se inspiram, então a gente tem que ter responsa, tem que ter noção do que fala.

Essa importância, então, fez com que vocês tivessem que pensar mais antes de falar?
A gente sempre pensou antes de falar, mas agora a responsa é redobrada. A gente fazia para divulgar nossas ideias. Temos noção que a gente é conhecido, mas temos a liberdade de pensamento. Racionais é livre, sem a liberdade de pensamento, não tem motivo de ser. O rap é livre, nós conquistamos esta liberdade.

Por que, 25 anos depois, os Racionais continuam sendo a maior referência do rap nacional?
Não sei se somos referência, acho que é mais identificação. As pessoas se identificam com o que a gente fala, os grupos se identificam. Acho também que a gente consegue fazer uma coisa contemporânea e de vanguarda. Fazemos as coisas da época e ainda conseguimos fazer coisas que ainda não foram feitas. Fazer o que não fizemos ainda, fazer o que as pessoas não tiveram coragem de fazer. O que fazemos é em cima da realidade, dos problemas do dia a dia, e esses não mudam. Temos que criar uma coisa em cima do mesmo, essa é a dificuldade.

Você imaginava que o rap e os Racionais teriam o espaço que têm hoje?
A gente não imaginava. Ninguém sabe o dia de amanhã. A gente só quer que o show encha [em referência à apresentação no Espaço das Américas, em 20/12]. A gente tem que ser profissional, tem que fazer o que sabe fazer. Quando a gente faz o que sabe, dificilmente erra. Não adianta falar pra eu fazer funk. Eu não sei.

Mas e seu grupo de samba?
Isso foi antes do rap. Era o Doce Delírio. Chegou uma hora que eu tive que escolher entre os dois, e eu optei pelo rap, pela força da batida.

Quem da nova geração de rappers representa bem a cena paulistana? Eles fazem rap de raiz? Ainda é feito na periferia?
O rap é livre, pode ser feito em qualquer lugar, mas tem que ser feito com verdade. Na periferia ou nos grandes centros. Hoje é inegável que quem desponta é o Emicida, ele é um talento. Tem também Projota, Rachid, Rincon. Eles têm consciência e fazem um bom rap. Eles se inspiram nos Racionais, não copiam a gente.

As meninas sempre participaram das batalhas?
Quando a gente começou, não tinha batalha, isso surgiu bem depois. O rap feminino foi conquistando o espaço aos poucos. O rap é machista, agora que está perdendo um pouco isso, é mais libertário. Elas, antes, não tinham o espaço merecido.

Na entrevista que vocês deram há 20 anos [para a "Revista da Folha", que antecedeu a sãopaulo], ao definir em uma palavra a polícia, você respondeu: "patife". Você usaria essa mesma palavra hoje?
Sim e acrescentaria outras, como racista, corrupta, fascista e mentirosa. Mas principalmente racista.

Mesmo depois de se tornarem conhecidos, vocês continuaram sendo parados pela polícia?
Isso não muda, continua igual. Nós somos o estereótipo do suspeito, as roupas que a gente veste, os carros que andamos.

Mas muitos policiais vivem ou vieram do mesmo lugar que vocês.
Mas a instituição [policial] faz uma lavagem cerebral. A instituição da polícia é que é preconceituosa.

Você ainda mora na zona norte?
Estou me mudando para a zona oeste. Eu me separei e casei de novo e minha mulher mora na zona oeste. Ficava mais fácil eu me mudar pra lá.

Você passou os últimos anos acompanhando a vida na periferia. Ela melhorou?
Os salários continuam baixos, falta emprego. O que tem agora é a possibilidade de as pessoas adquirirem mais coisas. Aumentou a facilidade de acesso à telefonia [com o celular], à tecnologia, aos computadores, ao transporte. Quem não podia comprar um carro há 20 anos agora tem condições. Mas saúde, educação e emprego melhoraram parcialmente. Hoje tem mais vagas de emprego, mas tem mais gente pra elas.

Os seus projetos pessoais têm ocupado mais tempo que os Racionais?
Com os 25 anos, o novo CD, não. Eu faço shows solo onde os Racionais não fazem. O "Contra Nós Ninguém Será" é de 2013, por enquanto não deve ter novidade. O CD novo [dos Racionais] tem muita música, falta videoclipe.... Até março já temos agenda com os Racionais, principalmente fora de São Paulo. Depois do Natal, vamos para Fortaleza e Belo Horizonte.

Se há 20 anos vocês ganhavam X, por quanto a gente tem que multiplicar pra saber o quanto vocês ganham hoje?
A gente já ganhava bem. Quanto mais você produz, mais você ganha, e a gente sempre produziu bastante. Antes, vendia CD. Agora não vende mais, então tem que fazer mais shows. Hoje, para um show dos Racionais, o lugar tem que ter no mínimo 3.000 lugares. Graças a Deus.

O público de vocês hoje é diferente do de 25 anos atrás?
Não acho. Ele aumentou, ou melhor, está rejuvenescendo. Em alguns shows, principalmente em Sescs e CEUs, vemos os pais com os filhos, algumas vezes até com os netos.

Você quer acrescentar algo?
Que o povo vá ao show [no Espaço das Américas, em 20/12]. Tem disco novo, tem cenário novo. Foi um investimento. Talvez não tenha retorno, mas a gente faz para ter um bom show. O show é de lançamento do novo CD, mas vai ter também os 25 anos [músicas antigas]. Vai ser uma hora e meia de show.

Espaço das Américas - r. Tagipuru, 795, Barra Funda, tel. 3864-5566. Sáb. (20): 22h. 90 min. 18 anos. Ingr.: R$ 70 a R$ 140 - 2º lote. Ingr. p/ 2027-0777 ou ticket360.com.br.

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