Vizinhos de casarão nos Jardins tentam evitar corte de 60 árvores

Em um terreno cercado por três edifícios no Jardim Paulista, mais de noventa árvores, entre jabuticabeiras e pitangueiras, honram o nome do bairro. A área de 1.300 metros quadrados abriga um dos últimos casarões da região, erguido há décadas e vendido no ano passado para uma construtora.

O destino do local, que deve virar um prédio de 16 andares, levou moradores a entrar na Justiça para tentar evitar a derrubada de parte da vegetação. A Secretaria do Verde autorizou em outubro o corte de 60 árvores (51 vivas e nove mortas) para viabilizar as obras. Como compensação, estabeleceu o plantio de 38 mudas no imóvel e uma na calçada.

Os moradores e o Ministério Público, que ajuizou em março uma ação civil pública contra a autorização, argumentam que ela foi equivocada e destacam os futuros prejuízos ambientais. O MP diz que as árvores foram declaradas patrimônio ambiental e imunes de corte em decreto de 1989.

"Vão trocar exemplares centenários por mudas. Quando elas vão ser plantadas e como? Realmente dói no coração. Elas abrigam pássaros, melhoram o clima e a qualidade de vida", diz o administrador Luiz Antônio de Araújo Queiroz.

Da janela de seu apartamento no décimo andar, Luiz tira fotos dos pássaros que circulam por ali, como pica-paus e bem-te-vis.

Ele e sua mulher, a jornalista Judith Meirelles, fazem parte do movimento organizado pelos moradores dos prédios próximos para questionar a retirada da vegetação. O grupo fez abaixo-assinado, tem um site e se juntou a vizinhos advogados para entrar com uma representação no Ministério Público no fim de 2014."

A representação tornou-se uma ação civil pública e no final de março uma liminar foi concedida para impedir qualquer alteração no imóvel até que haja nova decisão sobre tema. Caso a liminar seja descumprida, a multa diária é de R$ 10 mil e sanção de R$ 100 mil por exemplar cortado.

"A gente está defendendo um espaço verde como a região não tem mais. O perfil de manifestação é diferente, pela internet. Não vamos chamar o [repórter da TV Globo] Márcio Canuto para fazer uma mobilização."

Enquanto espera o julgamento do caso, Judith aponta para as árvores da janela e conta um pouco da história que sabe.

A CASA

A reportagem não encontrou registros do ano de construção da casa de dois pisos. Por documentos de cartório, sabe-se que ela foi doada em 1976 de pai para filho. O médico Oswaldo Moacyr Butteli dou-a para o decorador Ivan Butteli, último ocupante do imóvel. A família se mudou em outubro, após a venda para a construtora Gafisa. Ela não foi encontrada para comentar o caso.

Era o filho que cuidava das árvores, a maioria plantada por ele, como conta o administrador. A manutenção do imóvel, no entanto, era cara.

O IPTU beirava os R$ 51 mil e, para não aumentar o valor, o proprietário evitava fazer reformas.

Tentativas de compra do terreno tinham ocorrido outras vezes, mas o preço alto e supostos conflitos entre os herdeiros complicavam o negócio. Moradores de um dos edifícios limítrofes até fizeram uma oferta, mas as conversas não continuaram.

"Sempre torci para que algum banco transformasse numa agência ou numa Casa das Rosas [centro cultural na Avenida Paulista]", diz o administrador.

O apego dos moradores fazia com que, à noite, corressem para janela ao ouvir qualquer barulho semelhante ao de serra elétrica. Temiam que a demolição acontecesse de madrugada.

"Na cidade grande você se apega, as pessoas têm uma relação de afeto com o verde", diz a jornalista.

OUTRO LADO

Em nota, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente informou que o Termo de Compensação Ambiental do imóvel foi suspenso em março por ordem judicial. Também disse que a Portaria 130, de 2013, rege a compensação em São Paulo. Ela estabelece um cálculo para chegar ao número de mudas necessário.

Por sua vez, a Gafisa disse que o "projeto foi regularmente aprovado e obtidas todas as licenças necessárias junto aos órgãos competentes". Segundo a empresa, ela já tomou conhecido da ação movida pelo Ministério Público e, até que haja nova decisão sobre o tema, cumprirá a determinação judicial.

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