'Repensar o gesto constrói civilidade', diz coreógrafo Ivaldo Bertazzo

"O que mais me incomoda na cidade é a desordem e a falta de acesso livre para deficientes e idosos", responde rápido Ivaldo Bertazzo.

Inércia e cacofonia previsivelmente desagradam o artista e professor, célebre pelo método de reeducação do movimento que dissemina desde os anos 1970 em livros e aulas.

Rodrigo Dionisio/Folhapress
O coreógrafo Ivaldo Bertazzo posa em sua casa, no bairro de Higienópolis; ele estreia novo espetáculo "Ensaio Para um Gesto Orientado" no Sesc Vila Mariana, no sábado (28)
O coreógrafo Ivaldo Bertazzo em sua casa; ele estreia espetáculo no Sesc Vila Mariana, no sábado (28)

A questão sobre o que mais o contenta em São Paulo, porém, demanda gestuais 21 segundos de silêncio: "A proliferação de centros culturais que somam bem-estar, como o Sesc".

Bertazzo formou mais de 3.000 pessoas em cursos pagos ou patrocinados, voltados a arte-educadores sem recursos. Seus princípios? "Fala, audição, olhar e gesto formam o intelecto e estruturam a identidade".

Nascido na Mooca, crescido em Interlagos -"minha mãe desceu muito na pista do autódromo pra me levar pra casa"- e hoje em Higienópolis, ele também dirige espetáculos.

O primeiro, "Cidadão Dançante", foi em 1976; o próximo, "Ensaio Para um Gesto Orientado", estreia no sábado (28) no Sesc Vila Mariana, onde fica em cartaz até 6/12 -de graça.

Ensaio Para um Gesto Orientado - Sesc Vila Mariana. R. Pelotas, 141, região sul, tel. 5080-3000. Sáb., ter. e qui.: 20h. Dom.: 11h. Até 6/12. Livre. Retirar ingr. c/ antecedência. Estac. (R$ 4,50 e R$ 10 a 1ª h). Acesso para deficientes. GRÁTIS

*

sãopaulo - A cidade dita o gesto das pessoas?
Ivaldo Bertazzo - Nessa aceleração, é cada vez mais difícil obter a disponibilidade das pessoas para, por exemplo, pensar em como se movem. Mas é isso o que constrói os conceitos de civilidade e adaptação. Aprender a se concentrar é valioso em meio a toda essa turbulência.

E como isso reverbera em quem não é esportista ou bailarino?
A maior conquista é a vivacidade. O aluno fica mais comunicativo e adaptável a mudanças emocionais. Também é interessante observar como cada um soluciona suas dificuldades. Dizer que uma pessoa só é capaz de uma coisa é ridículo! Não somos confinados em uma vocação.

O que você faz é dança ou esporte?
É incompreensível que essa fronteira exista. Exercícios de habilidade de grandes jogadores de futebol são passinhos, parece que estão dançando, mas estão adaptando articulações. Temos de quebrar a divisão entre lazer, esporte e arte.

Quais suas atividades preferidas?
Caminhar na Cantareira. É pertinho e tem trilhas muito bonitas. Subo na Pedra Grande, vejo toda a cidade, isso me agrada demais! Quando volto, o contraste é monstruoso. E gosto de fazer feira no Ceasa, aos sábados, e depois vir pra casa cozinhar. Estou estudando a cozinha.

Você está ansioso para a estreia?
Tenho um período da ansiedade quando ainda não há uma imagem global do trabalho. Você constrói pacotinhos e eles precisam se unir, mas nem sempre o jeito que bolou dá certo... Assim que a coisa toma forma, acalmo muito.

Foram 500 pessoas no curso. Como selecionou cem para o elenco?
O primeiro critério foi terem tempo livre. O segundo é só concentração; não é preciso ter aptidões técnicas ou dançarinas.

E qual o papel deles no espetáculo?
Minha segurança depende dessas cem pessoas! Um monte de malucos se mexendo. [risos] Em um momento como este [refere-se aos atentados terroristas em Paris], vemos como é forte o coletivo. Para a destruição tanto quanto para a construção.

Publicidade
Publicidade