Primeira festa para gays, lésbicas e transexuais negros vira moda em SP

"Meu cabelo está batendo em você? É que ele dá uma chicotada." Tássia Reis, uma cantora que faz seu penteado de poderosas tranças sintéticas no Divas' Hair, na Vila Matilde, está em transe na pista de dança da Batekoo e me pergunta se fui nocauteado por aquela juba cor-de-rosa. Sim, eu fui.

Mas também poderia ter sido alvo dos voluptuosos bumbuns que tremem frenéticos ao som da música nessa que se anuncia como a primeira festa para gays, lésbicas, travestis e transexuais negros de São Paulo.

Desde agosto do ano passado, a Batekoo, evento importado de Salvador pelos produtores Wesley Miranda e Artur Santoro, vem se firmando como um fenômeno na noite da cidade —começou como uma festa mensal no discreto Morfeus Club, no centro, e agora vai dobrar a frequência e ampliar seus endereços para dar conta da demanda.

Enquanto isso, outras festas com pegada semelhante, como a Nêga e a Don't Touch My Hair, também vêm ganhando mais força na cena paulistana.

De shortinho jeans, salto alto e uma enorme cabeleira também rosa-choque, Santoro costuma ficar na porta da Batekoo organizando a fila, que às vezes chega a dar a volta na esquina.

"Tudo que é festa LGBT em São Paulo é na verdade uma festa GGG, só para o público gay e branco, enquanto as festas negras são só para os héteros", diz o produtor. "A Batekoo tenta romper com tudo isso."

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Batekoo

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Lá dentro, o que à primeira vista parece uma balada gay como qualquer outra, com pop grudento bombando nas caixas de som, logo desmonta todos os clichês —negros, de fato, são maioria, ao contrário de qualquer boate no congestionado eixo das baladas do Baixo Augusta.

Mulheres e garotas, ali, também estão em número igual ou maior que o de rapazes. Os padrões de beleza ditados pela indústria da moda parecem ter sido abolidos, e meninas plus size, com peitos transbordando de seus decotes, desfilam pela casa só de sutiã, ostentando suas curvas.

"Ninguém aqui me chama de puta porque estou de shortinho e decote. Isso aqui é a liberdade", dizia a atriz Juliana dos Santos, na pista da Batekoo. "Esse é o rolê. Isso é a periferia de verdade."

Logo depois dessa conversa, Santos e uma amiga subiram ao palco para a competição da noite. Toda Batekoo reserva para o auge da festa uma batalha de dança, em que baladeiros vão até o chão em duelos que lembram os célebres torneios de "voguing", forma de dança que marcou o underground de Nova York nos anos 1980.

Mas enquanto as drags americanas montavam seus melhores looks para chacoalhar os inferninhos do Harlem, o figurino da Batekoo segue a linha do menos é mais —menos roupa, no caso, e muito mais pele.

Estilo que batiza a festa, o batekoo, de acordo com os produtores da balada, é uma mistura do twerking, o rebolado que celebrizou a versão adulta e periguete da ex-meiga Miley Cyrus, do funk carioca e de danças africanas —todos eles envolvem chacoalhar a bunda sem parar, em movimentos bruscos e agressivos de sobe e desce.

"É uma coisa que vem da minha raça", dizia a drag Kiara de Paula, na última Batekoo. "Você precisa ter muita desenvoltura no quadril para ter esse tremelique."

Tremeliques à parte, a plateia vai ao delírio, aplaudindo e dançando. "Esse é um lugar sem críticas", acrescenta Kiara. "São só elogios. É uma festa para negros, pobres e gays. É maravilhoso porque esse é meu dia a dia. Isso é a favela, é tudo que a sociedade apaga."

Do lado de fora da festa, que realizou sua última edição no teatro Mars, na Bela Vista, Francinato Abreu, mais conhecido como Jubba, descansava depois do duelo de dança.

"É difícil, falta ar, o joelho dói", dizia o rapaz, com um topete afro que desafia a gravidade. "Aqui tenho a liberdade de subir no palco e dançar. Uma gay negra não podia dançar de quatro no palco. Agora pode. Dá licença, que essa é minha música."

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AS MAIS TOCADAS

1. "TOMBEI"
Karol Conká

2. "NÃO FOI CABRAL"
Mc Carol

3. "BAILE DE FAVELA"
Mc João

4. "NA PONTA ELA FICA"
Mc Delano

5. "WORK"
Rihanna Ft. Drake

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