Aos 90, madrileno que nunca se sentiu brasileiro vive entre boleros e seu inseparável passarinho

Maximiano Lopez Rodriguez, 90, morador do Tucuruvi, na zona norte

Por onde anda no sobrado em que vive "solo", a música o acompanha. Em volume civilizado, o iPad está sempre ligado num bolero do trio mexicano Los Panchos. Quando não, a cantoria fica sob a responsabilidade de Paquito, 4, o inseparável canário. O passarinho tomou conta do quintal depois que seu antecessor, aos seis anos de vida, decidiu permanecer calado. Na ocasião, em 2008, morria a mulher de Maximiano, Maria Del Carmen.

Paquito 1º ainda viveu mais quatro anos, sem jamais levantar um pio. Seu dono, ao contrário, segue falante. Gosta de conversar com Paquito 2º e ainda reserva um dedinho de prosa para as plantas do jardim, hábito que herdou da mulher. As conversas, é bom dizer, são sempre em espanhol com o forte sotaque madrileno que não perdeu desde 1958, quando chegou aqui. De início, trabalhou como pedreiro, antes de ter a sua própria equipe de funcionários, à qual se dedicou até os 65 anos.

Em caso de dúvida, ele sacava do infalível "portunhol" e pronto: o azulejo estava assentado direitinho, do jeito que queria. Hoje, "tranquilo, tranquilo", como gosta de dizer, dispensa malabarismos linguísticos. Em bom espanhol, confessa: "Nunca me he sentido brasileño" ["Nunca me senti brasileiro"].

Não abre mão de uma taça de vinho, adora torcer para o Real Madrid e se emociona ao falar do amor das duas filhas e dos quatro netos –os genros, é verdade, não o empolgam tanto. Embora diga não se sentir brasileiro, seu time do coração é o Corinthians, o que o integra numa das maiores torcidas do país. "Não sou fanático", avisa. Nessas horas, é de bom-tom evitar discussão. Melhor acompanhá-lo na gostosa gargalhada e voltar a ouvir a música de Los Panchos.

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