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20/10/2010 - 14h00

Pesquisador francês descreve trajetória tortuosa de "Mein Kampf", o credo de Hitler

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MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA REVISTA sãopaulo

"Mein Kampf" ("Minha Luta") é um livro que provoca um curto-circuito nas noções convencionais de liberdade de expressão. O catecismo germano-imperialista, eugenista e antissemita escrito por Hitler na prisão, em 1924, é hoje proibido na Alemanha. Em outros países democráticos, como Holanda, EUA, Japão ou Brasil, tem suas edições sujeitas a complexas negociações jurídicas com o estado da Baviera (que detém os direitos autorais do líder nazista).

Em compensação, a obra é publicada livremente, a ponto de ter se tornado best-seller, em países em que a liberdade de expressão soa como um insulto e na qual a censura é um instrumento legal corriqueiro, como Síria e Irã (igualmente inimigos dos judeus). Essa é uma das contradições flagradas pelo jornalista e escritor francês Antoine Vitkine em "Mein Kampf - A História do Livro". Ele não pretende dar novas interpretações sobre o conteúdo da "bíblia názi" (expressão usada pejorativamente pelos adversários de Hitler, mas logo incorporada por seus asseclas).

E, embora se possa acompanhar aqui boa parte da história do Terceiro Reich, a pesquisa vale pelos dados sobre a trajetória editorial do livro de cabeceira dos SS. Vitkine mostra que, além de ter dado aura de "teórico" ao pretensioso soldado que esbravejava pelas cervejarias de Munique, "Mein Kampf" literalmente financiou a retórica da incorruptibilidade de Hitler: afinal, o líder alemão só pôde renunciar ao salário de chanceler porque havia enchido a burra de dinheiro com os direitos autorais.

Apesar de, até o final da Segunda Guerra, terem sido vendidos 12,5 milhões de exemplares desse cartapácio de 700 páginas, não se deve superestimar sua influência doutrinadora.
Muitos perpetradores de crimes nazistas revelaram nunca ter aberto o livro: o engajamento deles na "solução final" não foi, portanto, uma decisão ideológica meditada, mas um ódio aos judeus disseminado e insuflado pelos discursos de Hitler. Prova de que "Mein Kampf" é bem menos perigoso do que os leitores que deixam suas perversões dormindo nas prateleiras.

LIVRO
MEIN KAMPF - A HISTÓRIA DO LIVRO *
AUTOR: Antoine Vitkine
TRADUÇÃO: Clóvis Marques
EDITORA: Nova Fronteira (227 págs., R$ 44,90)

conexões

FILMES

A QUEDA! **
As últimas horas, no bunker, de um Hitler à beira da demência, em interpretação magistral de Bruno Ganz.
DIRETOR: Oliver Hirschbiegel
DISTRIBUIDORA: Europa Filmes (2004, R$ 20,80)

MOLOCH **
Num castelo dos Alpes, Hitler, a amante Eva Braun e Goebbels conversam sobre amenidades, nas quais se introduzem aberrações como a "solução final", numa arrepiante encenação da "banalidade do mal".
DIRETOR: Aleksandr Sokurov
DISTRIBUIDORA: Koch Lorber (1999, R$ 59)

LIVROS

PARA ENTENDER HITLER **
AUTOR: Ron Rosenbaum
EDITORA: Record (2002, 644 págs., R$ 62,90)
Percorre diversas teorias sobre o hitlerismo e entrevista historiadores, mostrando o desnorteamento provocado pelo homem que encarnou o mal absoluto.

FUMAÇA HUMANA *
Nicholson Baker; tradução de Luiz Antônio Araújo (Companhia das Letras, 464 págs., R$ 58)
Essa releitura da Segunda Guerra caminha no fio da navalha: ao reunir documentos que mostram as hesitações e o calculismo das potências que derrubaram Hitler, corre risco de igualá-las aos nazistas (e amenizar a culpa destes), quando sua intenção é mostrar conveniências e manipulações que culminaram na maior carnificina da história.

FILME
A FITA BRANCA *
Michael Haneke (Imovision, só locação)
Às vésperas da Primeira Guerra, uma comunidade alemã é assolada por estranhos acontecimentos: um acidente criminoso com o médico da vila; o assédio do filho do maior proprietário local; surtos de fúria entre camponeses. Tais fatos são a contrapartida sádica de sinistros pendores puritanos e punitivos que, sugere Michael Haneke, estão na gênese do nazismo.

DISCO
SHOSTAKOVICH: PRELUDES & FUGUES **
Alexander Melnikov (Harmonia Mundi; R$ 132, CD triplo e DVD)
Compositor de vanguarda às voltas com o "realismo socialista", Shostakovich escreveu uma sinfonia programática sobre a batalha de Stalingrado. Na música de câmara e nas peças para piano, porém, manteve-se intransigente, mesmo quando faz um tributo a Bach, como nesses prelúdios e fugas.

 

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