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15/11/2010 - 11h25

Aprenda 10 lições sobre Itaquera, o bairro que vai receber o estádio do Corinthians

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GIBA BERGAMIM JR.
JULIANA VILAS
DE SÃO PAULO

Itaquerão ou Fielzão. Não há certeza sobre o nome do futuro estádio do Corinthians escolhido por um comitê para sediar o primeiro jogo da Copa de 2014. Mas sobre um fato não resta dúvida: Itaquera é portal e sinônimo de zona leste. Com população de 528 mil habitantes, formada por classes C e D, Itaquera não tem vergonha de ser chamada de periferia.

Pode ser resumida pelas imagens da massa trabalhadora que embarca no terminal de ônibus/metrô, pelo samba da Leandro de Itaquera, pelos rachões nos campos de várzea, pelas chácaras no cenário urbano, e, claro, pelo centro de treinamento de um dos times mais populares do mundo, assim como seu camisa 9: Ronaldo.

Agora está na mira do mercado imobiliário e de projetos públicos. Prefeitura, Estado e governo federal planejam investimentos em infraestrutura. A sãopaulo apurou que a Cohab (Companhia Metropolitana de Habitação) prevê ali um conjunto com 2.178 apartamentos. Incorporadoras lançam imóveis --só a Tenda está levantando dez torres.

Tudo é gigante em Itaquera. Não há na América Latina um shopping maior que o Aricanduva, com suas mais de 500 lojas, nem um McDonald's que receba mais clientes que o do shopping Metrô Itaquera. Lá também está o maior Sesc do Estado, que recebe 15 mil visitantes por dia.

A distância do centro (viagens de até uma hora, no trânsito engarrafado ou no metrô lotado), áreas de alagamento e bolsões de pobreza colocam o bairro na condição de carente. "Há um preconceito com a região por conta do passado. Mas temos estrutura para receber o estádio. E o metrô está aqui desde 1988", diz o subprefeito Roberto Tamura.

Para João Crestana, do Secovi (sindicato da habitação), Itaquera vai crescer. "O bairro tem ruas largas e bom comércio. Pode melhorar. Mas falta trabalho. No centro, há 40 empregos por habitante. Em Itaquera, há 20 habitantes por emprego", diz.

Itaquera parece ser mesmo a bola da vez. Saiba mais sobre a futura casa do Corinthians abaixo.

1. TERRA DE GIGANTES

terminal
Um vaivém frenético de 431.868 passageiros em 67 linhas de ônibus que operam diariamente. Essa é a rotina do terminal Corinthians-Itaquera, ligação dos moradores
com o centro. Muitos pegam o metrô, que recebe 100 mil passageiros por dia naquela estação, ou os trens da CPTM -bem menos usados ali.

parque do carmo
É um dos maiores da cidade (1,5 milhão de m2). Há 32 anos, recebe a Festa das Cerejeiras, sinal da influência nipônica. No "hanami", todos se sentam sob as 2.000 cerejeiras para ver a chuva de pétalas, como acontece no país em que nasceu Katsutochi Matsubara, morador que morreu em 1997 e iniciou a tradição.

parque raul seixas
Com 33 mil m2, era fazenda da família Morganti, que produzia carvão na década de 1930. Hoje, é a área verde ao lado da Cohab José Bonifácio, onde foram catalogadas
26 espécies de aves. Há ainda um bosque de eucaliptos e jardins com espécies nativas e exóticas, com destaque para a alameda de ciprestes.

sesc itaquera
A área total de 66.074,89 m2 faz da unidade a maior do Estado de São Paulo. Inaugurado em 1992, é referência de lazer gratuito na cidade. As escolas públicas costumam organizar excursões, e os estudantes aproveitam a principal atração do local: as piscinas. Diariamente, passam por lá cerca de 15 mil pessoas.

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2. HISTÓRIA DA REGIÃO

De zona rural a bairro-dormitório
A palavra Itaquera significa "pedra dura" (Ita-Aker), em guarani. O distrito foi fundado, oficialmente, no dia 6 de novembro de 1686. Antes de se tornar bairro-dormitório, Itaquera foi uma próspera área rural (leia ao lado). Os primeiros registros são de 1920, quando a Roça Itaquera era só uma área próxima à Aldeia de São Miguel. Inaugurada em 1875, a estação ferroviária foi o principal marco de desenvolvimento da região. Antes do trem a vapor, os moradores tinham de se deslocar de carroça até o centro, já que não havia comércio próximo. O centro de Itaquera era cercado por sítios, e a primeira área loteada foi na chácara Caaguassu. Dividida em lotes de 10 mil m2, foi vendida para o empresário Oscar Americano, que fez um loteamento popular urbano planejado, que hoje é a Vila Carmosina. Embora a atividade industrial e o setor de serviços tenham crescido rapidamente nos anos 2000, a economia de Itaquera não é capaz de absorver a maior parte da mão de obra da região, que depende de empregos em outros bairros mais centrais.

Itaquera em números

79% dos moradores vivem em casa

70% têm telefone

36,9 minutos é o tempo médio que os itaquerenses levam para chegar ao trabalho

56% têm animais de estimação

4% da população vai ao cinema uma vez por semana

54% acessam a internet

Fonte: Datafolha/2008

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3. NOME DE AVENIDA

A terra do pêssego
A comunidade nipônica de Itaquera foi criada no começo da década de 1920, depois que as 32 primeiras famílias japonesas chegaram à região dispostas a investir na agricultura. Menos de dez anos depois, diante das condições do solo e do clima, muitos desistiram, foram para outros bairros ou voltaram para o Japão. Os que ficaram, entretanto, transformaram a região na "terra do pêssego". A fruta mais plantada em Itaquera batizou uma das principais vias do distrito, a avenida Jacu-Pêssego -Jacu é o nome de um rio do bairro. Durante alguns anos, moradores do centro costumavam embarcar na Maria Fumaça, nas manhãs de domingo, para passar o dia e fazer piquenique nas chácaras de Itaquera. Já as caixas de pêssego, nos dias úteis, faziam o percurso contrário, nas locomotivas, para serem vendidas no mercado central.

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4. LOCALIZE-SE (veja mapa na edição impressa)

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ANÁLISE

Distinção entre centro e periferia fica mais turva

HEITOR FRÚGOLI JR.

A zona leste passa por processos que acarretam paisagem urbana crescentemente heterogênea.

A desindustrialização deu lugar à proliferação de pequenos estabelecimentos produtivos e à precarização dos empregos; o mercado imobiliário verticaliza várias regiões, enquanto em outras predominam pequenas casas e conjuntos habitacionais; grandes estruturas de consumo surgem justapostas a pequenos locais de comércio e serviço; territórios consolidados se desenvolvem paralelamente a novas e vulneráveis fronteiras de expansão da cidade.

Nesse quadro urbano em que as distinções entre centro e periferia se tornam cada vez mais turvas, a construção de um estádio de futebol em Itaquera -bairro cuja população supera 520 mil habitantes- representaria um marco em tal paisagem, desde que o poder público enfrente de forma sistemática e planejada os vários impactos decorrentes, inclusive a provável expulsão dos mais pobres.

Muito se fala de benefícios urbanos decorrentes de Copas ou Olimpíadas, mas tais ganhos são, em geral, privatizados. É preciso que os recursos públicos tenham uma destinação efetivamente pública, mesmo que tal estádio depois se dirija a um time de massas.

Heitor Frúgoli Jr. é professor do Departamento de Antropologia da FFLCH/USP

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5. PERSONAGENS

Padre Rosalvino
O jaleco branco é a marca registrada do padre espanhol
Rosalvino Viñayo, 69, cuida da obra Social Dom Bosco. Trabalhava no centro, nos anos 1970, quando notou que a maioria dos jovens que atendia morava na zona leste. "Pensei: o que estou fazendo aqui? Preciso ir aonde eles estão". Hoje, seu Centro Profissionalizante atende 5.000 pessoas por dia. Está sempre de jaleco. "Nunca mais deixei de usá-lo depois que um ladrão, no escuro, tentou me assaltar e desistiu ao reconhecer a roupa. Ainda o abençoei."

J.C. Gutierrez
Ele fundou e edita o jornal "Itaquera em Notícias"
No logotipo do jornal há inscrições em japonês. "É marketing, a comunidade nipônica aqui é forte", explica J.C. Gutierrez, 64, que fez parte do movimento Queremos Metrô em Itaquera. "Ajudei a recolher mais de 100 mil assinaturas." A estação foi inaugurada em 1988. Ele elenca os três presidentes que visitaram o distrito desde 1979: o militar João Batista Figueiredo e os civis Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

Anny Darly Martins
Anny conhece os moradoes pelo apelido de infância
É fácil encontrar a filha mais nova do seo Leandro na quadra da Leandro de Itaquera. Nos dias de desfile, entretanto, Anny, 34, é a última a chegar à avenida. "Todo mundo vai antes e eu fico na quadra entregando as fantasias para os moradores", descreve a moça, que não consegue esconder, nos gestos, o talento para articular e organizar a comunidade. É a responsável pelos projetos sociais que chamam os itaquerenses à quadra ao longo do ano.

Carlos Mariano
Ele ganhou ouro em 2008 no Sul-Americano de taekwondo
"Nasci, cresci e sempre morei
em Itaquera", afirma o educador Carlos Mariano, 39, que virou mestre depois de graduar-se no taekwondo (arte marcial coreana). Formado em Educação Física e "faixa preta 6º Dan", ele treina garotos itaquerenses interessados em artes marciais. E participa de competições. "Sou campeão brasileiro de duplas, mas já estou meio velho para competir. Gosto
é de formar atletas e passar para eles a filosofia das artes marciais."

lazer e consumo

2 shoppings, entre eles o shopping Aricanduva, o maior da América Latina
1 museu
41 feiras livres

Fonte: Prefeitura e shop. Aricanduva

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6. SHOPPING

Todos às compras

O maior centro de compras da América Latina é formado pelo Shopping Leste Aricanduva, o Interlar e o Auto Shopping. A área total, de mais de 1 milhão de m2., segue o que parece ser tradição em Itaquera: tudo tem dimensões gigantescas. São 500 lojas, 13 concessionárias, 14 salas de cinema, três hipermercados e três praças de alimentação, ocupados por 4,5 milhões de pessoas por mês.

2,3 milhões de consumidores passaram pelo Mc Donald's do shopping Metrô Itaquera em 2009, o maior movimento na América Latina e o 22º no mundo

Fonte: Mc Donald's

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7. ESCOLA DE SAMBA

Pés no bairro e na passarela
Após um pedido da filha, Leandro Alves Martins, 60, criou a escola de samba que é símbolo do bairro. Em 3 de março de 1982, ele e um grupo de amigos fundaram, à beira da estação de trem, a Leandro de Itaquera, uma das tradicionais do Carnaval paulista.

Seo Leandro, como é conhecido, chegou em Itaquera ainda bebê. Nascido em Duartina (SP), tornou-se um apaixonado pelo bairro, onde criou os filhos Karin, Anny e Rafael. Todos vivem ali. "A Leandro é uma escola de família que ama o bairro onde vive", diz o patrono.

Assim como ele, os três filhos e a mulher, Marilene, mergulharam no samba. Karin, 38, é mãe de três filhas. Todo ano ela repete o gesto que ilustra a capa da sãopaulo: carregar o pavilhão (bandeira) vermelho e branco da escola, que tem como símbolo um leão.

Além de ao Carnaval, a Leandro se dedica a projetos sociais, como oficinas de música e uma biblioteca comunitária. A escola também leva o nome do bairro em eventos pelo país. Hoje no grupo de acesso, briga para voltar à elite do samba.

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8. O QUE SERÁ FEITO

promessas

- Prefeitura e Governo do Estado preveem uma série de ações de transporte, moradia e geração de empregos para Itaquera
- Renovação urbana da região por meio da criação do eixo da av. Jacu-Pêssego, que ligará o ABC e o Porto de Santos pelo Rodoanel e Guarulhos pela rodovia Ayrton Senna
- Construção de uma rodoviária com saída de ônibus para o litoral paulista, Rio de Janeiro e Nordeste do país
- Construção de companhias da Policia Militar e dos Bombeiros
- Incentivo à geração de empregos, com a criação de um polo educacional para formação profissional em parceria com entidades filantrópicas, aproveitando a proximidade com pólo Industrial de Itaquera
- Instalação de uma Fatec (Faculdade de Tecnologia), de uma Etec (Escola Técnica do Centro Paula Souza) e de uma unidade do Senai para formar mão de obra para serviços e indústria
- Criação de um núcleo voltado ao desenvolvimento de pesquisas na área de tecnologia de informação (TI) no futuro parque tecnológico da zona leste
- Ampliação da capacidade de atendimento do Fórum de Itaquera
- Criação de um centro de convenções que abrigará feiras, exposições e eventos
- Implementação do Parque Linear Rio Verde, área interligada ao Parque do Carmo, com equipamentos de lazer

Fonte: Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano

*

9. TRADIÇÃO DE VÁRZEA

Dos campinhos saem craques
Dos muitos campos de terra batida de Itaquera já saíram talentos da bola. Entre eles, o lateral Cleber, do Internacional de Porto Alegre, e Gerson Caçapa, volante que atuou no Palmeiras.

O agitador cultural Francisco Carlos da Silva, o Fran, 39, passou a infância nos campinhos, como o do Leão do Morro (foto). Fundou uma associação que treina e forma maratonistas. "Dois itaquerenses que eu treinei são atletas de clubes grandes."

O clube Elite Itaquerense, criado em 1922, é conhecido como celeiro de talentos. Outra tradição lá é o jogo "pretos contra brancos", evento que neste ano chega à 28ª edição. Segundo Isaías Amorim, um dos organizadores, os negros costumam levar a melhor.

satisfação com o bairro

5,4 é a nota (de zero a dez) dada ao bairro pelos itaquerenses

Fonte: Datafolha/2008

"As melhores coisas de Itaquera não foram feitas por políticos. Se a gente faz coisas que dependem deles, a gente vira refém"
ISAÍAS AMORIM, morador do bairro

*

10. COHABS

Por toda parte
José Bonifácio é um dos distritos de Itaquera. Mas, para os moradores, o nome é "Cohab José Bonifácio", por ser quase todo ocupado por conjuntos habitacionais populares. Comuns na zona leste desde 1968, os predinhos são uma constante na região.

A Secretaria Municipal de Habitação prevê 103 novas torres até 2012, o que vai totalizar 2.178 apartamentos. Num dos condomínios, que terá 47 edifícios, haverá uma ciclovia até as estações de trem de Guaianases e José Bonifácio.

população

1950
5.070

1960
15.245

1970
63.070

1980
126.727

1990
175.201

2000
201.512

2010
220.292

113.831 MULHERES
106.461 HOMENS

  • Apenas o distrito de Itaquera; não inclui José Bonifácio, Parque do Carmo nem Cidade Líder

Fontes: Prefeitura e consultor Tadeu Masano

time do coração

41% dos moradores se declaram corintianos

Fonte: Datafolha/2008

 

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