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15/05/2011 - 10h00

Decidida a não decidir

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BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA REVISTA sãopaulo

Odeio a Harrods com todas as forças, mas infelizmente não pelos motivos certos. Não ligo que o grande magazine londrino tenha sido comprado por um malandro que transformou o saguão em um sarcófago egípcio de beira de estrada. Nem é da minha conta se a Harrods cobra R$ 60 por uma taça de vinho da casa (sou o que os ingleses chamam de "teetotaler", ou seja, abstêmia) ou se a loja abriga, em seu subsolo, um santuário campeão mundial do kitsch e da embromação, que o dono, Mummu Fayed, mandou fazer em homenagem ao filho, Dodi, e à princesa Diana, mortos em Paris.

Conheci Dodi Al Fayed e posso afirmar que, caso Diana e ele tivessem sobrevivido ao acidente causado por um motorista que não sabia o significado de "teetotaler", o namorico teria terminado muito rapidamente em nada.

A cafajestice é o de menos. Minha insatisfação com a loja que conheci menina (para a criançada, a atração continua sendo o pet shop com os filhotes mais lindos do mundo) nasce em outra encruzilhada.

Eu poderia ter ido à Macy's ou às Galeries Lafayette que daria no mesmo. Mas estava em Londres a trabalho e, no tempo livre, resolvi ir comprar uns creminhos para ver se consigo deter o processo que está transformando esta Sophia Loren que vos fala num maracujá de gaveta.

Minha cabeça roda e meu estômago treme quando relembro a sensação de entrar pela porta da Harrods. O andar térreo, onde estão perfumes e cosméticos, é tão amplo, as escolhas são tantas e você fica tão perdido que eu simplesmente não consegui enfrentar. Saí sem comprar nada, passei pelas vitrines que comemoravam William e Kate e segui sem rumo por Knightsbridge como quem tivesse tomado um caldo na piscina.

No supermercado, quando confrontada com uma gôndola sobre a qual repousam 12 tipos de molho de tomate, costumo buscar abrigo nas geladeiras da Häagen-Dazs.

Sinto que minha carreira de consumidora tem seus dias contados, não consigo mais enfrentar maratonas. Trocaria as compras de mês no Extra por um mês em Guantánamo.

Dá para perceber que o problema não é só da Harrods, mas do tipo de escolha que somos intimados a fazer todo o tempo. No livro "O Paradoxo da Escolha", o psicólogo americano Barry Schwartz oferece explição para meu comportamento: "Uma vasta gama de opções pode desencorajar o consumidor, que é obrigado a se empenhar mais na hora de escolher. Assim, consumidores decidem não decidir e vão para casa sem produto". Devo ter trombado no sr. Schwartz antes de minha fase "teetotaler". Como pode me conhecer tão bem, sem que eu me lembre dele?

Outro que está ficando meu íntimo é o economista Fred Hirsch, que usa a expressão "tirania das pequenas decisões" para descrever o comportamento que nos faz andar de loja em loja comparando preços. Outro dia tentei comprar um capacete. Acabei descobrindo tantos que deu nó na cuca. Fiquei sem. "Nossa cultura santifica a liberdade de escolha", diz Schwartz. "Mas alternativas demais podem causar problemas."

Na próxima vez, sou capaz de perder duas horinhas na Harrods escolhendo hidratantes. Mas só quando o mercado estiver disponível para consumo um dia com 72 horas. Enquanto isso, mais fácil a gente marcar para se encontrar na Tate Gallery ou em algum café da King's Road, pode ser?

 

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