PAULA PACHECO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em 23 de outubro de 2017, uma segunda-feira, São Paulo registrou um dos piores engarrafamentos de sua história. O índice de lentidão ultrapassou o triplo da média. Às 14 horas, havia 78,1 km de vias congestionadas, segundo a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). A média para o horário é 23,4 km.

As filas de carros além do normal teriam sido consequência de uma falha no aplicativo Waze, que teimava em direcionar seus usuários para a avenida 23 de Maio.

Um mês antes, CET e Waze haviam assinado uma parceria para que o órgão tivesse acesso às informações do aplicativo e desenvolvesse ações de gerenciamento de tráfego mais rapidamente, a partir de notificações feitas pelos usuários da plataforma.

Se a parceria estivesse em prática há mais tempo, é provável que a comunicação entre Waze e CET tivesse minimizado os efeitos da falha.

Esse é um exemplo de como o poder público e as novas plataformas podem trocar informações para melhorar problemas de curto prazo e o planejamento de políticas.

Ciro Biderman, coordenador do Centro de Política Econômica do Setor Público da FGV (Fundação Getulio Vargas), explica que a integração entre a análise tradicional de dados históricos e o grande volume de informações em tempo real (ou big data) ainda está em estágio embrionário. "São áreas que ainda não têm conversado muito", diz.

Ônibus urbanos, por exemplo, começam a transmitir dados coletados via GPS sobre seu trajeto para uma central, que, por sua vez, tem condições de processar informações obtidas por aplicativos sobre melhores rotas e, assim, aliviar o número de carros em vias sobrecarregadas.

Segundo Biderman, algumas operadoras de telefonia passaram a investir para que aplicativos do tipo "acelerômetro" captem informações sobre a velocidade dos trajetos de usuários. Esses dados podem ser fornecidos ao poder público para melhorar as matrizes de transporte.

As experiências por enquanto são pontuais. Na época dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, a Tim fez uma parceria com a prefeitura da cidade e desenvolveu o Mapa de Deslocamento de Massas, com o objetivo de monitorar os deslocamentos, gerenciar o tráfego e a distribuição dos agentes de trânsito.

"Tudo isso ainda é rudimentar", diz Biderman. No futuro, ele espera que aplicativos como o Waze tenham como processar as variáveis do seu banco de dados e da concessionária de uma rodovia, por exemplo, e levar em consideração não só o fluxo de carros, mas informações como se é um feriado e se há previsão de chuva. "Isso dará mais precisão", completa.

A combinação de informações tem sido objeto de pesquisa de start-ups em diferentes lugares do mundo.

Nos EUA, há estudos para criar aplicativos que aumentem a eficiência até do uso de ambulâncias. Com base em análise de dados e informações em tempo real, a ambulância não só saberia qual é o trajeto mais curto, como também aquele que vai ter maior probabilidade de encontrar pessoas que precisam de socorro, o que resultaria em ganho de produtividade.

A mesma lógica valeria para empresas de transporte. Start-ups têm investido em soluções que minimizam as chances de um caminhão trafegar sem carga. Com menos viagens, além de desafogar o trânsito, há redução da emissão de gases poluentes.

INVESTIMENTOS

Para Mark Essle, sócio da consultoria A.T.Kearney, soluções inteligentes para melhorar o trânsito deveriam receber mais subsídio por parte do poder público. Por outro lado, o transporte coletivo poderia sofrer uma desaceleração nos investimentos.

"Por enquanto, são as empresas de tecnologia que estão tomando a frente nesse processo de mudança. Mas sem a troca de informações com o poder público, a integração de dados e a legislação pode haver um atraso nessa evolução. A qualidade do trânsito melhora conforme a tecnologia é compartilhada", afirma o consultor.

Essle defende aportes cada vez maiores em soluções que privilegiem o compartilhamento de veículos. "Uma pessoa que vai ao trabalho de carro o usa durante uma hora e meia, mas o veículo fica à disposição por 24 horas.
A média mundial é de 8% de uso de um veículo ao longo da sua vida", diz. Com o compartilhamento, vai a 40%.

Para isso, "será preciso criar o hábito no Brasil", diz Essle. Para o consultor, a principal mudança virá do avanço do carro autônomo, que também poderá ser usado de forma compartilhada.

Mas esse modelo de veículo só terá os ganhos se, segundo o especialista, as cidades investirem em "de fato serem inteligentes e irem além da gestão do fluxo de tráfego".

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.